quinta-feira, 31 de março de 2011

Leis.

(Voz de narrador de série enlatada estadunidense[americana é o caralho, seus pulhas estadunidenses]):


Previously on Noiado no Sótão:


Mas...por que...números, números...salários...binários...cobras e lagartos...falta disto...

Despertador. Logo agora! Logo no momento que comecei a entrar na terra dos sonhos!

Suspirar, resignar. Levantar. Quatro noites, é um novo recorde. Continue, continue.

(...)

Desci a escada e tropecei na lógica. Cambaleei, mas não pude agarrar-me ao corrimão da razão; logo, tomei aquele susto e levantei-me de supetão, novamente na cama. Mais um sonho! Mais uma hora perdida, mais uma noite sem dormir. Ora bolas.

Apanhei a capa, a espada, o bacamarte, os explosivos, a pia da cozinha, a nove milímetros e os remédios para fazer dormir, que achei mas não tinha. E avancei noite adentro, na calada das ruas, iluminadas por todas aquelas fantasmagóricas luzes amarelas dos postes, quantos postes, quantos insetos rondando. Algo de produtivo havia de ser feito naquelas insones e impropérias horas.

Inquisitivamente, indaguei sobre meu alvo. Algo precisava ser feito, de fato. Tarde era a hora que resolvi agir contra semelhante monstro, aquele que havia enunciado a lei do universo, a lei que governava não somente a minha, mas as vidas de todos os homens. Cruel preceito, de fato.

Tudo dava errado, entretanto. A fortaleza onde o tirano residia não era bem guardada, mas tudo que eu fazia para tentar ali adentrar-me sem sem detectado falhava, gatos vadios miando na rua, ratos por todas as partes, mulheres doidas a gritar, "flores para los muertos!" noite adentro, madrugada afora. No final, liguei o foda-se. Chutei a porta, mas ela não cedeu; como era que nos filmes aquilo sempre dava certo? De isopor, deviam ser as portas de Hollywood.

Logo apareceu na porta um senhor: era o próprio, meu alvo, aquele ser que devia ser eliminado. Engatilhei o revólver que trouxera na algibeira e apertei o cano contra sua têmpora esquerda. "Para dentro, cachorro. Acabarei com seu império nesta noite." Ele sorriu sarcasticamente, "Não, não acabarás." Mas aquiesceu, calmamente se dirigindo para dentro de sua modesta casa, sentando-se numa cadeira calmamente. "Sente-se," me disse.

"Prefiro ficar de pé." - "Ah, ficar de pé é bom mas pode causar varizes e até mesmo trombose." Lembrando-me repentinamente com quem estava lidando, me sentei. Ele sorriu. "Mas se a cadeira não for ergonômicamente correta, você pode ter sérios problemas na coluna." - "Maldito," repliquei. "você e sua maldita lei acabaram com minha vida! Com a vida de todos!"

Ele era puro sorriso. "Não, não acabei. Minha lei sempre existiu, desde que o mundo é mundo, desde que o universo começou, sabe-se lá como. O que fizeram foi simplesmente me atribuir a responsabilidade por algo que não é de minha alçada, nem da sua, nem de ninguém. Claro, algo tinha que dar errado e me fuder mais ainda a vida. É a lei."

Eu estava ficando impaciente. Tanto sono, tantas noites sem dormir, as noites, as palavras por ele proferidas, tudo, apenas uma cópia de uma cópia de uma cópia, xerox infinito e borrado do mundo real, se é que ele deveras existia àquela hora. "Não quero saber. Enunciastes tal lei, deves morrer. Morrerás, agora!" Apontei a espingarda para a cabeça de Edward, que nem sequer piscou.

"Não, não morrerei."

Clic. Merda! A arma falhou. Desembainhei o facão. "Não queria que chegasse a isso, mas se tiver de ser, será." Ele riu. "Não, não será." Raivosamente, brandi a machete com o intuito de decapitar meu oponente. A lâmina bateu no pescoço dele, mas fora ogrito de dor causado pelo impacto, nada mais aconteceu. "Merda, está cega!" Ele esfregou a mão na parte injuriada de seu pescoço, dizendo "Claro. Perdes seu tempo tentando me matar. Já disse, vai dar errado."

"SEU FILHO DA PUTA! Como é capaz que dê tudo errado??" - "Dando. Esta é a beleza da lei, da 'minha' lei, conforme dizem por aí. Se tentares jogar ácido em mim, garanto que de alguma fora o ácido que compraste, tão baratinho na loja de artefactos malignos de segunda mão, estará com a validade vencida e só tornara louras minhas já desbotadas madeixas. Vai. Dar. Errado."

Desanimado, e diante de tal irrefutável argumento, me dirigi cabisbaixo à porta. Entretanto, ao chegar na soleira, o rosto dele se transtornou e ele emitiu estranho grunhido, oriundo de alguma indefinida porémlancinante dor interna. "Argh. É o paradoxo da lei: se ela puder dar errado, dará."

Tombou morto ao chão. Fiquei alguns instantes ali, fitando seu inerte corpo. Eu havia vencido! Havia mesmo? É necessário experimentar. Mirei minha arma contra minha própria cabeça. Ela não estava funcionando, então nada daria errado, não é mesmo?

B-a-n-g.

Merda. Morri. Deu tudo errado.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Noite, morta.

Acordei sobressaltado, num repente repentino, com o perdão da cretina expressão. O sonho ainda não bem se desvanecera em minha mente, mas já não conseguia me lembrar de quase nada do que se passara. Algo relacionado a uma casa...uma pia, um estranho reflexo no espelho...nada que fizesse muito sentido, nem que tivesse algum significado especial, alguma sorte de mensagem do subconsciente inconsciente para a consciência consciente. Nada.

Quanto tempo havia se passado desde que tentara dormir pela enésima vez naquela noite? Busquei o despertador disfarçado de celular debaixo do travesseiro e olhei: vinte minutos desde a última checagem? Estava certo? Sim, estava. Não adiantava. O sono não viria, por mais uma noite.

Fiquei deitado ali, olhos bem abertos, fixos no ponto central do vórtice do cortinado. Escoar lento dos segundos, tempo que não voltaria mais. Para onde iam, todos os segundos? Talvez, atrás dos primeiros? Ah ha ha, que engraçadinho é o estado de semiconsciência. Deveras. Criatividade para se falar bobagem, isto minha mente tinha...tem, de montão. Agora, saber resolver as coisas que me deixam acordado...

O mundo tem peso, e é por vezes pesado demais para aqueles que tentam carregá-lo nas costas...para aqueles que tanto se mutilam mentalmente, todos os dias, sem nem saber por quê o fazem mais. De que adiantava? De que adianta?

Quantas perguntas cabem numa noite de vígilia?

Lá fora, o nada e o tudo se encontravam, em estados latentes de minha análise aprofundada porém inútil sobre els, tudo e nada, nada e tudo. Tudo ou nada? Verdade? Tabelas da verdade...computações...iterações...binários números, estranhos afazeres, estranhas lógicas que em minha mente não encontravam calço, não firmavam estruturas. CALE-SE, CALE-SE! ó maldita corrente de pensamentos.

Quantas telhas haviam naquele telhado? Quem sabe, se eu as contasse, o sono não viria? Uma, duas...aquela ali tem manchas de mofo...fungos...ous seriam líquens? Líquens? Ancient lichen? Poções, alquimia...profissões, outras vidas, não reais. surreais...será que eu ficaria mais feliz se tivesse alguém ali comigo, compartilhando toda aquelas inacabadas reflexões insones?

Quem? Quem seria obrigado a tolerar semelhante criatura? Ah ha, ha, lá vem ele de novo, o troll do pensamento. Ah, cretino. Como seria não ter semelhante residente em minha cabeça? Será que eu seria menos esquisito, menos estranho, menos idiota?

E agora, depois destas flagelações, quanto tempo havia se passado? Relógio, onde estás.

Cinco minutos. Hu-há. Ah, tempo. Porquê, passas tão devagar nestes momentos tão chatos?

Fechar olhos, rolar de cá para lá. Sentir, por vezes, a queda rumo ao vazio tão esperado da inconsciência...mas logo em seguida retornar ao silente e insone quarto. Quarto de hora, meia hora, hora e meia.

Mas...por que...números, números...salários...binários...cobras e lagartos...falta disto...

Despertador. Logo agora! Logo no momento que comecei a entrar na terra dos sonhos!

Suspirar, resignar. Levantar. Quatro noites, é um novo recorde. Continue, continue.

terça-feira, 29 de março de 2011

Morta noite.

Inútil. Continuar ali seria.

Os segundos, que tanto costumavam passar rapidamente em apertadas horas do dia, em momentos em que prazos venciam e tudo parecia estourar, agora eram contados em produtos de centenas de milhares. Sentou-se à beirada da cama, esfregou os olhos. Que horas seriam?

Meneeou a cabeça. Faria alguma diferença? Não muita.

Naquela cidadezinha, a vida era tão devagar quanto os minutos na calada insone da madrugada. Desde que aceitara o oneroso, pesadíssimo peso de herdar uma grande casa somada de grande quantia, bem sabia deste fato inegável. Quanto menor a cidade, maior é o tempo. Maiores são as fofocas. Oh, como são maiores as fofocas.

Pensara que faria bem em se mudar para o solitário sobrado herdado, e lá estava ele. Tal herança chegara em oportuníssima hora, momento em que mais uma vez cogitara encurtar abruptamente seu prazo de validade terrestre, uma vez que mais uma vez falhara em trilhar com sucesso nova oportunidade ofertada por alguns amigos, os poucos que nele ainda depositavam alguma confiança. Sentira-se tão imbecilizado e tão envergonhado, chegou mesmo a comprar, com seus últimos trocados, duas caixas de potentes barbitúricos e uma garrafa de potente porém vagabunda beberagem alcóolica. Organizara seus afazeres, queimara seus segredos que não esperava encontrarem após sua extinção, e esperara a coragem chegar.

Não chegou. A tempo, entretanto. Logo, logo, veio a notícia do falecimento de distante parente, dono de toda aquela imensa casa vazia, daquele imenso numerário, parente este que visitara muito tempo atrás, e com ele confraternizara, compartilhavam de muitas opiniões atravessadas, alienadas pela maioria dos homens, idéias sobre vida e morte, sociedade e saciedade, modernismos incongruentes e fascismos ditados pela moda, pela igreja, pelo estado.

Passara ele na sua frente, o parente. Descarregara uma velha espingarda calibre doze nas fuças, semanas atrás. Deixara quase tudo para seu torto sobrinho, com a condição que a casa habitasse. Nem chegou a pestanejar muito. Acertou as dívidas que ainda existiam, enviou toda sua tralha para a solitária casa e para lá se mudou. Adiara momentaneamente a excursão para alhures locais, além desta terra, deste planeta, destas pessoas tão insolentes e de toda esta merda. Por hora. Agora que não necessariamente devia nada a ninguém, quem sabe? Talvez encontrasse alguma motivação real.

Ouviu as fofocas das tias velhas, lamúrias pelas vidas reumáticas e ausência de dinheiros, aceitou visitas incômodas de estranhos desconhecidos que afirmavam ser credores de seu tio, tolerou duas semanas, até comprar um par de imensos canzarrões que agora reinavam no terreno circundante à casa. Estragou de propósito a campainha e gozou de merecido silêncio. As pessoas, sempre lhe perseguiam. Não desta vez. Elas que se danassem. O espaço que separava a porta da frente do portão de sua propriedade era suficientemente grande para isolar acusticamente seus ouvidos dos clamores dos reclamantes.

Após ter feito tal revisão interna dos acontecimentos passados nos últimos tempos, olhou para o imenso e antiquado relógio à cabeceira da cama. Cinco minutos haviam se passado. Suspirou fundo e se levantou. A casa era grande, andaria de quarto para quarto, de cômodo para cômodo, até o sono chegar ou o dia raiar. Estava farto de insônias; se acostumara com quase tudo na vida, mas não com a ausência daquele escape perfeitamente legalizado da realidade, da vida, que apesar dos novos números e da nova casa, continuava insossa e ausente de vida propriamente dita.

Caminhou no escuro, esbarrando em móveis. Nem se incomodou em acender luzes. Onde quer que o sono batesse, ele encostaria e dormiria. Passo a passo, rondava como um fantasma pelos silentes cômodos. Silêncio, silêncio. Negrume quase completo nas vistas, e por vezes o detector de móveis no escuro - suas canelas - se chocavam com objetos não identificados, que eram devidamente chutados e xingados.

Idiota, acenda a luz. Não queria. Não sabia por quê, mas não queria. Lá fora, tudo era silêncio, a não ser pelos insetos da noite, pelas corujas que por vezes piavam, e pelos qui-qui-quis dos morcegos que por ali passavam, engolindo insetos. O latido ocasional de seus cachorros. Fora isto, nada. Bem diferente da biboca tosca que residira naquela cidade grande, agora tão distante. Como eram barulhentas as noites ali. Talvez fosse isso, seus ouvidos ainda sentiam falta de ouvir todos aqueles urbanos rumores.

Entrou num banheiro, tateou até encontrar a pia, lavou o rosto, sorveu um tanto do líquido, bochechou. Frigidíssima água aquela, e um tanto ferruginosa também. Gosto de sangue, óxido de ferro, hemoglobina. Ha! Como seria hilário acender a luz e---

Clic.

Luzes que lhe cegaram momentaneamente as vistas. Porra! Só faltava esta. Sistemas elétricos malucos naquela casa, que acendiam do nada. Esfregou os olhos agredidos pela luz repentina, e quando os abriu, olhou para o espelho.

Água na face...água...vermelha?

Cambaleou para trás, olhou para a pia, onde a água ainda corria. Água? Ou...

Sangue?

Os esbugalhados olhos se voltaram para o espelho. Viu novamente sua cara aterrorizada, e por detrás de sua cabeça, alguns passos atrás...uma coisa, um vulto, algo que não sabia o que era. Sentiu a pressão sanguínea subir até o limite do suportável, parou de respirar. Não vislumbrou a vida toda passar, pois estava muito assustado para pensar.

Não viu nem sentiu mais nada além de estranho sussuro em seus ouvidos. E a escuridão se fez novamente reinante.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Maeshtro! Cue da mushic!

Ah sim, me esqueci. Música do dia?



-Mental Note-

Lie awake in fear of mathematics
And easy in the knowledge that you're no longer running the show
Shutting eyes and stabbing maps and trying to find some exciting place to go
But it took you 400 years just to get as far as here
And now you say you're out of your depth
Is this snapping out of equations any way to treat a friend?
Any way to treat a friend

They swear to me they know every flashing light in this city
They understand them like the advice of a friend
Black and white, straight up and down
They know them all, they love them all, they love them all, they love them all
They say that these will guide you on your way
Will blind you if you try too hard to measure them
Keep my feet fixed down to the floor when I want to share the view with someone else
Fingers in their ears, don't wanna talk

Ooh I have tonight
I have this light
And you will see me for miles
I have tonight
And I have this light
And you will see me for miles
In two days, in two days
In two days, in two days

If the table between us isn't the centre of the universe
What's your guess?
If the table between us isn't the centre of the universe
What's your guess?

(Something for Kate)



Fear of mathematics. We gots 'em. Indeed.

Não sei.

Mais uma semana, sete dias. Sete vezes tantos, sete vezes nada? Zero, divido por zero. O que resulta?

Não sei.

Dias e dias, uma vida inteira, sem saber o que fazer, como ser, como proceder. Como viver?

Não sei.

Inaceitável? para si e para os outros? Outros? que eles têm a ver? Por que ages assim?

Não sei.

Estar sozinho, no meio da multidão, por toda uma vida. Se flagrar imaginando besteiras auto-destrutivas, em meio à turba barulhenta de festas e reuniões. Ver gente, e querer sair correndo. Sair de casa, quase não consegues mais. Por quê?

Não sei.

Tentar ser o que não sou, tentar fazer o que não consigo fazer, teimar, teimar. Tentar novamente, cair novamente, falhar, falhar. E se em mim depositam alguma confiança, eventualmente ela falha, assim como eu. É assim?

Não sei. Acho que é.

Mas, por quê?

Não sei.

Insisto, já nem sei mais por quê. Todo raio débil de esperança que me aparece não dura mais que um segundo, uma enganação, lamentável brincadeira de mau gosto do universo contra mim, ou de mim para mim, se me acham arrogante de considerar tal possibilidade. Viver sem esperança, sem deus ou algo que me iluda que tudo irá terminar bem, que serei perdoado por tanta merda que faço ou deixo de fazer, já não sei de mais nada. Não espero nada e espero tudo, para no final ver que mais trinta anos se passaram e não restaram nada, além destes murais de lamentações, apregoados dia após dia.

Já não sei mais para quê.

Não sei. Tenho medo de tudo, de todos, e abandono tudo e todos antes que eles me abandonem, excelente raciocínio, pois não. Xingo frangos, mas sou o pior deles. Aquele que desiste antes mesmo de tentar. Para quê estou aqui? Apenas para servir de mau exemplo? Triste referência, esta.

Não sei mais por quê continuo.



sexta-feira, 25 de março de 2011

Vida?

Vida?.......que diabos?

Ontem, estive hoje em algum outro lugar. Em sonhos, em sonhos. Em locais por mim há muito esquecidos. Em ambientes fechados, lacrados, dentro de mim, em alguma parte de meu ser. Tranquei-os lá, com medo que viessem a se tornar realidade....ainda que isto soe bizarro, é o medo que mais me acompanha, o medo destas coisas, que ainda nem sequer chegaram a existir, que talvez mesmo nunca acontecerão. Um momento, um lugar, uma pessoa. Aparecestes de novo, roubaste meu afeto. Por um átimo de segundo, se é que a ortografia me permite dizer.

Dizem, dizem muita coisa, penso, penso em muitas coisas, em geral nem sempre, quase nunca agradáveis, casmurro ser que inexiste perante todos, perante si mesmo, imagem deformada diante do espelho, por trás do bi-gode de arame, da barba loura de Lincoln. Por trás das íris tingidas de um degradê de verde misturado a um marrom sujo, que acho não ser tão grandes coisas, mas que por vezes apanho outrem a contemplar, como se fosse a coisa mais legal do mundo. Ora! Olhos temos todos, menos alguns desafortunados infelizes. O que enxergam diante de vocês, pessoas? Garanto que não é a mesma imagem que me reflete o espelho, que me devolve o pensamento, análise torta que me formula o pinçamento.

Não importa. Julgueis estar morta, enterrada, esquecida, retrato desbotado, quase apagado, emoldurado em tom de sépia secular. Mas lá estavas, lá aparecestes, quase nada falastes mas as ações valeram mais que milhares de vãs palavras. Bem sei que não passastes de um fragmento de meu inconsciente, uma migalha de sonho. Uma imagem, não muito nítida, mera representação daquilo que já foi outrora um raio de luz nas trevas de minha desorientação perante este albirinto que é viver.

Mas fazia tempo que não aparecias, e eu já havia contabilizado tal desaparecimento como um número a mais no cemitério de minhas ilusões, um sonho a menos em minha vida, acrescente "mais um" no necromante estudo do tempo e do vento, que tudo leva, tudo apaga, tudo desbota, corroendo nossa memória, levando todas minhas emoções, deixando apenas este poço cada vez mais profundo de amargura que tanto escreve e escreve e prefere dos outros se abster, para que dele também se abstenham, espinho nas palmas de vossas mãos, pedra pontiaguda em seus sapatos.

Hoje, véspera de final de semana, dia que tantos e tantos escravos das lides capitalistas têm como o dia mais sagrado da semana, acordei mais uma vez acompanhado apenas do ar e de meus cobertores, dos cabelos perdidos pela ação do tempo e da morte que impregna pouco a pouco a alma de um homem, mas acordei com uma indefinível satisfação, uma ponta de alegria. Indefinível? De forma alguma. Bem sei qual foi o motivo de tal escasso sentimento habitar minha mente, meu ser, no lusco-fusco da sonolenta hora da cama se levantar. Sozinho, mas de certa forma acompanhado. De um fragmento de meu subconsciente. Algo que julguei estar morto, mas que soprou certo hálito de vida por entre o breve contato realizado em onírico momento, em indefinida paisagem. Apenas isto.

Apenas.

Dentro deste carrancudo ser que a todos amaldiçoa, ainda existe a vontade de vos encontrar. Achei que não, mas hoje sei que ainda tenho em mim a capacidade de almejar tal encontro. E, mesmo que as mazelas da vida tenham me tornado cada vez mais indiferente, apático, vejo nesta manhã que não é bem assim. Por mais débil que seja, a presença ainda existe. A vontade de viver, de achar, de acontecer. Bem sei que tais sentimentos em mim oscilam como rápido pêndulo de Foucault, que o estado de graça hoje reinante bem pode se converter em acessos inexplicáveis de raiva e de ódio insensato, indefinido para a maioria dos seres que nesta terra habitam...mas o que conta, no momento, é deixar tal sensação de mim tomar conta, e me reabastecer de certas forças, que julguei há muito estarem extintas.

Prossigamos então, saboreando tal efêmera alegria, esperando que algum dia este ser deixe de ser o que se tornou e se torne o que pode ser, o que deveria ser, se é que tal coisa seja possível.

Esperemos que sim. Espero que sim. Não sei.

O que sei é que me fez bem.

quinta-feira, 24 de março de 2011

501.

-Ei! Vamos sair, comemorar!
-O que há para comemorar?
-Ora! Você passou dos 500! Quinhentos textos escritos! Isto não é nada mau!
-Nada bom também. Analise estes quinhentos e veja se 10% salvam. Nem isto, aposto.
-Não é bem assim.
-Ô se é! Ontem mesmo verifiquei isto de perto. O Max e o Daniel que me corrijam se estiver errado! Sentei-me com eles na mesa e tive vergonha de estar ali, de ainda ser considerado amigo deles!
-Mas por quê??
-Ora! Pelo mesmo motivo de sempre! Sou eu aquele que desistiu, que nem quer mais saber. Que mesmo sente inveja deles, lá no fundo.
-Inveja? De quê?
-De poder ser, de não desistir. Eu desisti. Matei tudo.
-Tudo? Você fala de...
-..de tudo. De toda uma vida. Agora, fico tentando ser o que não sou, tentando alcançar algo que não conseguirei alcançar, apenas para desapontar outra pessoa, das últimas que ainda me tolera.
-Não diga isso.
-Digo. Digo, pois sei que até os laços de sangue, as pessoas ditas cosanguíneas que de mim gostavam já não mais nem querem se aproximar. E fazem bem.
-Porquê?
-Porque as rechaço. Não quero que ninguém mais se desaponte comigo. Não quero. Não vou deixar.
-Então porque não mudas? Não tenta algo diferente?
-Pelo simples motivo de ser eu apenas mais um louco nesta genética de loucos. Assim que meu pai se for, sei que seu lugar no trono dos loucos estará assegurado por esta merda ambulante que sou.
-...
-É. Não existe resposta. Bem sei eu. Não digo mais nada, pois mesmo para mim tudo já sabe a insanidade. A ovelha negra na vida de todos. Mas não se preocupes. Assim que a insanidade tomar conta, bem sei que certos receios não mais existirão...e que a solução final será concretizada.
-...
-Afaste-se mesmo, Razão! Não há espaço para você neste antro de loucura! Quanto antes melhor, quanto mais rápido se fores, mais rápido deixarei de ser apenas aquele que todos olham e meneiam negativamente a cabeça.
-Ah, isto não. De mim não se livras assim tão fácil.
-Eu sei. Mesmo nas horas mais insones, mais embaladas pelos narcóticos legalizados alheios, ainda apareces. Mas sabes, bem sabes, que és um dos principais motivos de minhas loucuras, de meu declínio mental.
-Por quê?
-Vá pra merda! Todos os momentos, você aparece e me fica empatando. "Pense bem, achas que pode mesmo encarar tal coisa? Você jpa falhou antes...pense bem, não se empolgue, o tombo é maior."
-Ehehehehehe.
-Filha da puta! Vá pro caralho!
-Vou, e te levarei junto, já que fazes tanta questão....

quarta-feira, 23 de março de 2011

Todo mundo morre.

Começou na noite anterior.

Mais uma vez, barulhos externos de infímos vertebrados de estimação o mantiveram acordado por boa parte da noite. Até o momento que se fartou e resolveu agir, ainda que de forma impensada. Sorrateiramente, foi até o armário de remédios e fez uma seleção de artificiais agentes de "fazer dormir" - como a casa era composta de muitos membros problemáticos em suas mentes, não foi muito difícil fazer a seleção, tarjas pretas ali abundavam. Oito gotas disto, três comprimidos daquilo, glug, glug, glug, repita, agora lavando tudo com a mais pura aguinha russa ou simplesmente vodka, ainda que de russa não tivesse nada, miserável Orloff falsificada.

Mas...por acasos do tempo e da índole das pessoas que na casa existiam, alguns dos ditos rmédios estavam com mais tempo de existência que muitos aborrescentes escutantes de Justin Bieber ou de Rebecca Black por aí. O que não causou o efeito esperado no Noiado. O sono não veio, de forma alguma. O gato chiou novamente lá embaixo, e desta vez houve perseguição, xingamentos e borrifos d'água desferidos contra o felino. E os impropérios pelo Noiado desferidos contra o infame felino foram de tal magnitude acústica, que o Alemão de Araque, seu arqui-inimigo da vizinhança, também berrou estranhos xingamentos em sua "língua nativa".

O Noiado, que já estava ainda mais noiado que de costume, diante de tanta caceteação da vida, apenas desejou a morte horrenda de tal vizinho; imaginou centenas de facas trespassando seu corpo. A esta altura, o gato já tinha desaparecido dos arredores, e ele voltou cabisbaixo para sua cama. Conseguiu pregar os olhos por um par de horas, para ser despertado por sirenes e choro, gritos desesperados oriundos da casa do Alemão. Levantou-se tontamente e olhou pela janela. Carregavam o corpo desprovido de vida de sua Nêmesis local para o necrotério. Estava cravado de facas.

O Noiado franziu a testa. Como era possível que tal coisa tivesse acontecido? Depois de alguns segundos, entretanto, ele soube. E resolveu fazer o teste. Apesar de ser cedo, muito cedo, se vestiu, comeu alguma coisa e caminhou para o mirante que ali perto exisitia, onde - mais uma vez - os malditos favelados(estes orgulhosos de serem apenas isto, nao sentido mais depreciativo da palavra, e não pessoas desfavorecidas residentes naquelas comunidades toscas) tocavam aquilo que denominavam "música" - o maldito fanque carioca, esta abominação da natureza.

Lá chegando, se horrorizou com o volume de tal sessão de estranhos barulhos que era emitida de carros caindo aos pedaços, mas providos de aparelhos de som que valiam bem mais que as carroças que os transportavam. Se esgueirou pelos matos e escolheu seu alvo, um imbecil que cada vez mais aumentava o som de sua "caranga." Pensou em como seria legal se ele simplesmente explodisse em uma inexplicável massa de sangue.

Pop.

Gritos por todos os lados. O cara havia, de fato, estourado, do jeitinho que Noiado pensara. Um maléfico sorriso estampou seu rosto, e ele deixou sua imaginação correr livre e solta, liberta, descontroladamente liberta, depois de tantos anos e anos de frustrações, de ter de tolerar todos as injúrias pelos babacas proferidas. Segundos depois, o mirante havia se transformado em um cenário de inexplicavel massacre. O som ainda imperava, mas os donos dos carros e todas suas consortes e confrades não mais respiravam. Calmamente, ele caminhou até o pátiuo e desligou todos os aparatos sonoros. Ah. Silêncio. Como era raro, como era precioso.

Pensamentos contrários à sua raiva, clamantes pelo retorno de sua humanidade, vieram à tona em sua mente. Eram pessoas. Tinham famílias. Como poderia fazer ele tal coisa??

Fazendo.

Sentia a sanidade e o complexo de "Rei dos Bonzinhos", rei dos covardes, por assim dizer, se esvair diante de tanto poder em sua mente. O poder corrompe, de fato. E ele era a prova viva disto. Sentia doentia alegria ao descer calmamente a rua que o separava do ponto de ônibus que normalmente apanhava para ir ter ao seu horrendo emprego. Ao se aproximar, viu de longe um revoltante espetáculo: pivetes se divertiam esfrangalhando o abrigo do coletivo. O malévolo sorriso novamente estampou seu rosto, bem na hora que tais "pessoas" o avistaram. Ameaçadoramente, dele se aproximaram. "Tá olhando o quê, branquelo?"

"Eu? Nada. Apenas um bando de filhos da puta quebrando um abrigo de ônibus."

"Que foi que tu disse?!"

"Hmmm. Quer dizer que, além de filho da puta, é surdo, hein. Veremos isto ocorrer de fato."

O pivete correu em sua direção, mas estacou alguns passos antes de chegar perto de Noiado. Seu rosto se desfigurou em dor, o sangue jorrou de seus ouvidos e ele tombou ao chão, gritando, urrando. Seus comparsas arregalaram os olhos, mas foi somente isto que poderam fazer. Um deles teve a cabeça arrancada por invisível força. Outro, foi trespassado por milhares de cacos de vidro, aqueles que jaziam no chão diante ao destruído abrigo. O que restava, tentou correr, mas foi arremessado para o alto, voou até sumir de vista, para depois de muito tempo cair no meio da praça que ali perto havia.

Noiado se sentou no que restava do abrigo e esperou o próximo ônibus. Evidentemente, passou um famoso "Garagem." Pop. Uma massa sanguinolenta estava agora ao volante, não muito habilidosa na tarefa de conduzir um ônibus que ia para garagem alguma. O autocarro capotou metros adiante. Garagem, pois sim. Agora sim, há um motivo para transportar tal carcaça para a garagem...ou melhor dizendo, para um ferro velho.

Como os gritos dos meliantes e o estrondo do acidente houvesse chamado a atenção de sonolentos moradores do bairro, ele decidiu se dirigir calmamente e a pé, para outro local onde houvesse maior abundância de transportes. Àquela hora da madrugada, era absolutamente normal que, algumas centenas de metros adiante, outro grupo de pretensiosos assaltantes mequetrefes tentassem lhe roubar algo.

Ao se afastar dos corpos, o Noiado pensou em como naquele dia os jornalecos vendidos a um quarto de Real iriam ter o que falar. Talvez tivessem de publicar uma edição dupla relatando todo aquele sangue que no chão por onde ele pisava havia. A caminhada era longa, mas foi deveras agradável para aquela deturpada mente, aquele agente do caos, estranho ser de louras barbas que havia se tornado um autêntico anjo da morte. Ou apenas um demônio desbotado. Seres humanos mau humorados lhe empurravam, "Acorda ô gringo inútil. Sai do caminho." Pop.

Pop, lá se foi o agente da BHTRANS, BHTRASH, que multava carros em uma rua deserta àquela hora da manhã. Pessoas gritando em seus ouvidos? Pop, pop, pop. Silêncio. Cansado de tanto andar, resolveu pegar um ônibus, tentando ignorar o olhar horrorizado que certos transeuntes lhe deitavam, devia ser todo aquele sangue que nele respingara. Olhe mais um bocado, por favor. Um débil grito, outro corpo estendido ao chão.

Segurou seu poder ao máximo quando embarcou no coletivo. Ignorou todos os olhares e se sentou ao fundo. A maioria daqueles "mortais," entretanto, agia conforme o figurino humano manda, conforme impera a lei da conservação de suas próprias vidas. Desviavam o olhar. Não é comigo. Vou ficar na minha. O Noiado nem sequer se importou. Estava acostumado. Quando transitava pelos coletivos, mesmo antes do malévolo poder nele existir, sentia tal coisa na pele. Jamais se sentavam a seu lado nos ônibus, ainda mais se estava em dias de extrema fúria e trajando camisetas sem mangas. Todos tinham receio ou asco daquele alemão nazista tatuado e mau encarado que ali estava. Todos o viam como um ser alienígena. Riu mentalmente de tal constatação.

Chegou em seu emprego, e foi direto para a sala de certo alguém, que havia meses antes, lhe puxado o tapete diante da possibilidade de que, porventura, o Noiado subisse de posição e viesse ameaçar os planos de tomar o poder naquela merda. Nem precisou entrar na sala. Uns vinte metros antes de chegar defronte à mesa da criatura, escutou o surdo barulho de entranhas estourando e sangue jorrando por todos os lados. Hmmm. Merda, pensou ele, queria ter visto.

Foi para sua sala. Sentiu apertar a vontade de ir ao banheiro, e lá entrou. Ao fechar e trancar a porta atrás de si, aconteceu algo que não esperava.

O espelho.

Ao contemplar casualmente sua imagem naquele artefato reflectivo, sentiu o chão lhe faltar. Espelhos não mentem. E a imagem ali existente dizia tudo. Ali estava o mais odioso dos seres, aquele que havia se libertado de todas suas amarras, deixado cair a máscara infame de "bonzinho", e que, tomado de assalto pelo nefasto poder que por algum motivo havia sido lhe ofertado, havia se tornado, de fato, o que sempre existira por debaixo de toda aquela falácia de bom moço. Um ser perverso, maldoso, o cão, por assim dizer. Tudo que nele havia de humano, ou melhor dizendo, que ele afirmava debilmente e mentirosamente ser seus "valores mais dignos", sua falsa natureza de "paladino da justiça, do moral e dos bons costumes", tudo isto...havia sido revelado como sendo a maior mentira que uma pessoa poderia contar.

Era um monstro como todos os outros, mesmo pior que todos os outros, matara sem sequer se importar com as consequências. Impunimente, injustamente, tamanha era a desproporção de seus atos e dos "crimes" que suas vítimas eram culpadas. Se é que eram culpadas.

Olhou em seus próprios olhos refletidos e pensou.

Pop.

Foi a última morte por aquele monstro causada.


terça-feira, 22 de março de 2011

Adendum omni est no sé latinus.

Adendo ao texto anterior:

Como é interessante ver letras -

"English Summer Rain"

Always stays the same, nothing ever changes,
English summer rain seems to last for ages.
Always stays the same, nothing ever changes,
English summer rain seems to last for ages.

I'm in the basement, you're in the sky,
I'm in the basement baby, drop on by.
I'm in the basement, you're in the sky,
I'm in the basement baby, drop on by.

Always stays the same, nothing ever changes,
English summer rain seems to last for ages.
Always stays the same, nothing ever changes,
English summer rain seems to last for ages.

I'm in the basement, you're in the sky,
I'm in the basement baby, drop on by.
I'm in the basement, you're in the sky,
I'm in the basement baby, drop on by.

Hold your breath and count to ten,
And fall apart and start again,
Hold your breath and count to ten,
Start again, start again...
Hold your breath and count your step,
And fall apart and start again,
Start again...

Always stays the same, nothing ever changes,
English summer rain seems to last for ages.
Always stays the same, nothing ever changes,
English summer rain seems to last for ages.

Hold your breath and count to ten,
And fall apart and start again,
hold your breath and count to ten,
Start again, start again...
Hold your breath and count to ten,
And fall apart and start again,
Old your breath and count to ten,
And start again, and start again,

Start again...


(Placebo)

----que traduzam exatamente o sentimento reinante do dia....

Cismas insones.

Não soube bem precisar que horas eram. Algo em torno de uma da matina, provavelmente. Algo assim. Acordou com o miado aborrecido do gato da casa, que ultimamente teimava em fazê-lo durante a madrugada, vingança alguma sorte de maldade, contra ele, o universo conspira. Que fiz de errado agora, para merecer tal castigo, ele se pergunta. Delírios. Sim, bem sabia ele. Mania de achar que tudo conspirava contra ele. Sempre assim. Xingou o gato com um chiado exportado da índole do pai, uma espécie de assobio calante, algo condicional e hereditário...mas que não surtiu nenhum efeito sobre o maldito felino.

Minutos que escoavam devagar, a noite e seu eterno vórtex por sobre a cama, naquele sótão, naquele local tão poeirento e por todos estranhado. O que fazes aqui, perguntava um de seus fantasmas. O que ainda procuras aqui. Nada? Tudo? Talvez um misto de ambos, uma vez que nada encontrava mas tudo procurava, dia após dia, noite após noite, hora a hora, assim seja. Levantou-se pesadamente para ir ao banheiro, talvez fosse aquela fina e insistente vontade de se aliviar que estivesse mantendo-o acordado. A esta altura, o gato calara-se. Sentiu na pele o incipiente inverno que já começava a chegar, outono é o caralho. Tudo de errado com o clima, com o planeta, com as pessoas, que tanto destroem tudo para se reproduzirem, deixarem fétidos descendentes, cadáveres adiados que procriam, como diria Campos, o de Carvalho. E para quê? Para quê insistiam sátiros e sádicos pais a trazerem filhos para este mundo? Para disseminar ainda mais o sofrimento, a aflição global?

As horas pesavam. Novamente debaixo das cobertas, sentia o cansaço tomando conta de sua mente, mas o sono não vinha. Rolar, para cá e para lá. Pensando, o que estou fazendo aqui, o que estão fazendo ali, o que fazem com as coisas, como irei pagar as contas, comprar coisas que não preciso, apenas para me dar falsa alegria consumista, apenas para se ter "objetivos" mais tangíveis que meus sonhos? Sonhos, que iam e vinham na vígilia eterna da noite, momentos entrecortados de lucidez e sonho. Números triangulares, fileiras de caracteres, aspectos condicionais, iterações. Identações e matemática, tudo que jamais imaginara ter de aprender, tudo aquilo que jamais achou ser possível entrar em sua cabeça, agora era cerne de irrequietos pensamentos e delírios na calada da madrugada, em sua mente, em sua cachola que teimava em não permitir que tais agentes invasores contaminassem e exterminassem ainda mais tudo que ele pensara ser um dia, todos os demais sonhos, todos mortos, todos tombados. E a certeza, a infalível certeza de que iria novamente falhar na mais nova tentativa que alguns amigos lhe ofereciam de sair da merda, imperava em sua mente. Não sabia pensar daquela forma, não sabia agir daquela maneira. Vais falhar, vais desapontar seu outro irmão, vais fracassar. É seu motivo de existência, fracassar.

Toda sua incompetência perante a vida, todas as vezes que poderia ter feito a diferença mas não fizera nada, por medo, por preguiça. Preguiça. Preguiça de viver, de crescer, de ser. Para quê? Para não ser pago? Para continuar vivendo no sótão, sabendo bem o que era - o contrário do que escrevera dias antes, em seus murais de lamentações virtuais. "Todos são como sombras," disse ele. Não.

A sombra, era ele.

Interrompeu-se para se lembrar do horário de despertar, o aparato celuloso que usava apenas como relógio e despertador. Ninguém ligava, em todos os sentidos. Mas, bem sabia ele que o recíproco era verdadeiro. Ninguém se aproximaria dele, ninguém gostaria dele como amante, ninguém apreciaria seus sonhos e ilusões, catástrofe estendida do que era seu pai. Morreria sozinho, sem cometer o erro cabal de passar adiante o legado de miséria e loucura de uma vida de empáfia, orgulho besta e idéias inexequíveis e idiotas. Ninguém afundaria com ele na canoa furada que era sua vida, sua imbecil existência. Tão capaz, tão talentoso. Sim, pouco adianta ser tudo e não ser nada. Nada. Nada.

Novamente, o miado chato do gato inflamou sua raiva contra si mesmo, contra o mundo, contra o universo. Precisava de descontar em algo toda sua frustração insone, toda sua inexistência. Levantou-se com ódio sincero e apanhou a garrafa d'água, a lanterna. Perseguirei e molharei o infame felino. Morrerás, ó odioso gato que...

...não tem culpa nenhuma sobre o estado mental de um ser como ele. Suspirou pesadamente, guardou os petrechos de punição contra o barulho noturno. Para isto, e para isolar seus ouvidos dos clamorosos e odiosos rumores dos favelados que por aquele bairro teimavam em fazer festas barulhentas, existiam os tampões de ouvido industriais que comprara semanas antes. Antes isto que se expor ao vento frio da madrugada, também. Ha! Para que se proteger, para que adiar a chegada da Indesejada das Gentes? Para quê adiar a morte, se não existe vida?

Teimoso dos infernos. Dia anterior, escrevera débil oração para tentar manter seu ânimo perante a empreitada nova, sua mais nova certeza antecipada de falha. Nestas horas, sabia por que se isolava no sótão. Nestas horas, sabia, que era melhor, de fato, enlouquecer sozinho que corromper o bom humor alheio. Os incomodados que se retirem, pois não. Covarde dos infernos, só escolhia métodos lentos de encurtamento da inútil existência, cigarros, alcóol.

Mais pesadelos, mais linhas e linhas de código incompreensível para sua retardada mente de sonhador. Ninguém se aproxime, não se aproximem, não cheguem perto, não estraguem sua vida com este câncer que habita o esquecido cômodo incômodo daquela casa, daquele local.

Horas e horas, agora absolutamente silentes dentro de sua cabeça, ainda que seu subconsciente estivesse gritando a plenos pulmões. Ninguém ouviria, ninguém poderia ouvir. Enterrem este ser, matem este emo, era o que gritava. Tuberculose de séculos passados, o que fizeram seus compatriotas cientistas (ha, ha, HA! cientista, pois sim), em exterminar a pouca seleção natural que existia para eliminar tais seres da face da terra?? Por que acabaram com a tuberculose??

Não soube precisar a que altura o cansaço finalmente calou sua mente, suas vozes internas, todos aqueles demônios ululantes que somente ele enxergava, somente ele ouvia. Mas ouviu quando seu relógio-despertador disfarçado de celular vibrou por debaixo do travesseiro. Soneca, mais dez minutos. Agora que o sono veio, queres me despertar?? Era o que pensara. Pensou também no que faria para encontrar forças para continuar tentando a fazer aquilo que se comprometera a tentar fazer, seu caminho na serpente píton da matemática e da ignorância. Enquanto teimasse em continuar vivo, iria continuar teimando em achar a saída do beco sem saída da existência escrotorial mal-remunerada. Teimaria em se render ao público, acéfalo, concurso, para se embrenhar na selva da matemática computacional. Dois passos adiante, quinze para trás, todos os dias. Até se fartar e desistir? Não sabia, mas existia uma vozinha que lhe afirmava com convicção que sim, que falharia, que desapontaria a todos, novamente.

Levante-se, erga-se, ó Noiado. A noite acabou, e ainda que não tenhas encontrado alívio na madrugada, é preciso continuar. Esperança, onde estás? A última que morre? Como matar algo que nunca existiu além do campo onírico de toda uma vida?

Enfim. É a vida, é minha vida, pensou. Cale-se, continue. Sim.

Até quando?

segunda-feira, 21 de março de 2011

Não se deve...

...e continuemos, prossigamos. É necessário manter as forças, não desanimar, não desistir, ainda que muitas vezes o corpo, a mente, nos traia e insista em permanecer no caminho errado.

...veja os bons exemplos, não siga os impulsos negativos. Tentar até morrer, até conseguir sair da merda, da bagunça que os caminhos errados nos levaram. Siga.

...mente, fique sã, fique calma. Esfrie, não esquenta. Sim, são muitas possibilidades, tantas que às vezes nos perdemos. Mas tente focar, aprenda a focar. Por Mitra, por uma vida melhor.

...não se deve, desanimar. Não se deve fazer de pequenas pedras montanhas intransponíveis. Aprenda a se manter calmo, não se desvie, não deixe ficar.

...que as forças não me falhem. Que saia deste lugar, desta cabeça...todas as coisas que desejo aniquilar.

...siga o bom exemplo. Seja você quem for, não se deve desanimar. E que todas as forças em contrário, se não puderem ser definitivamente caladas...podem sim, ser ignoradas.

...prossiga, siga. Faça o que deve ser feito. Conceda a si mesmo o que deve ser concedido. Continue. Não desanime.

Que assim seja, pois. A-meim.

sexta-feira, 18 de março de 2011

St. Patrick.

Em homenagem tardia ao dia de São Patrício:


"Far Away Boys"

Well I worked on the railroad
For t'pence a day
Drank down one penny
The other I'd save
I hammered and I hammered
For God knows how long
Well into madness, with each setting sun
I put my head down and I dreamt you were here
With me by the ol' tree, where no one could care

Far Away Boys, Far Away Boys
Away from ya now
I'm lyin' with my sweetheart
In her arms I'll be found

Then the sun belched upon me
You were no longer here
Lyin' in your place was my hammer and my gear
So I stamped out the fire that kept us both warm
The ashes were fallin'
Like the snow drops of old
We came to a mountain
Dynamite and she'll blow
A big hole in that rock
Like the one in my soul

Far Away Boys, Far Away Boys
Away from ya now
I'm lyin' with my sweetheart
In her arms I'll be found

We buried four workmen
They dug themselves well
From four empty coffins, to four early graves
They're only paddys, just paddys
Don't dig them too deep
You'll need all your strength boys
And they're replaced easily
With the heat I was melting
Into your sweet lips
Ah, your kiss takes me back
Takes me back from all this

Far Away Boys, Far Away Boys
Away from ya now
I'm lyin' with my sweetheart
In her arms I'll be found

Someone said it was Christmas
But not a tree was in sight
The only thing growin' was my will to die
Till the gaffer said 'men, your work here is done'
I said 'I'll see you in Hell, on that train we died for'
Never again, will I smell your sweet dream
But a pissed stained ol' gutter where:
You lips used to be

Far Away Boys, Far Away Boys
Away from ya now
I'm lyin' with my sweetheart
In her arms I'll be found

-----------Flogging Molly.

PS - Esta música fez imenso sentido no dia de hoje. Recomendo ouvir o disco inteiro, Swagger, regado a sua bebida alcóolica de prefêrencia....


Burizilla!

Então, lá estava o Noiado a transitar, novamente, no coletivo azul-desgraça que por aqui existe, em esta imunda e irrequieta cidade esquecida de tudo e por todos, em especial por este mesmo ser que ali existia, sem quere deveras ali estar. Entravam mais e mais sombras no ônibus, cada qual com seu fator antipático atrelado. Uma trajava óculos dignos de zangões que por aí voam. Outra falava pelos cotovelos, suplantando mesmo o aparato cancelador sonoro que Noiado usava em seus ouvidos.

Desnecessário dizer, isto aumentou em vários pontos o desafeto que tal misantropo ser já sentia por todos ao redor. E o universo somente afirmava, "os incomodados que se retirem, que se mudem," e muito dele se ria.

Ou ao menos era assim que tal entortada mente pensava.

Bem. Fazer o que. Apesar de toda sua desavença com o universo, bem sabia ele que era inútil reclamar, e dali se retirar era impossível, uma vez que o coletivo era pilotado por agente psicopata do trânsito, chegando a 120 km/h em uma descida. Não queria saber de suícidios, ao menos ainda não era chegado o derradeiro momento em que sua paciência e fé na vida se esvairia de vez, e tal ação extrema já não soaria tão absurda. Ainda não.

Entretanto, mais e mais sombras, barulhentos vultos continuavam a entrar no transporte, não tinham forma, apenas volume, tanto no sentido de ocuparem espaço e eventualmente bloquearem o caminho, mas também tinham alta amplitude sonora. E o aparato pregado aos ouvidos do Noiado era ineficaz para abafar toda aquela ruidosa existência.

De repente, uma das sombras, passando por ele, esbarrou no fio que transportava seu calmante musical do aparato musical aos problemáticos ouvidos do Noiado, arrancando o fone da cavidade auricular deste, e de quebra arrancando as "tripas" do fone para fora.

"Nó véi. Mal aí."

Não souberam dizer ao certo o que sucedeu nas doze horas depois deste incidente. As autoridades ficaram perplexas diante de tanta destruição. Tudo que sabiam dizer é que às sete e vinte e sete da manhã daquela sexta feira, dezoito de Março de 2011, uma hecatombe se abateu por toda a cidade. Um ônibus foi totalmente destruído, amassado, esmigalhado atá a última molécula, nos primeiros minutos do desenrolar da tragédia. Depois, uma estranha criatura, que urrava pelas ruas, tomou dimensões dantescas e saiu pela cidade, promovendo destruição gratuita em tudo que encontrava pelo caminho.

Estranho foi o fato que o primeiro alvo da aberração foi a "faculdade" FUMAC, digo, FUBEQUE, digo FUMEC, que foi completamente assolada, patricinhas e boys e emos e tudo mais. Depois, a criatura se dirigiu ao campus da UFMG, onde arrancou do solo o prédio das "belas artes" e arremessou-o ao espaço sideral, com todos os artistas flácidos e plácidos que lá existiam, e todas aquelas "obras" de arte de gosto discutível foram destruídas. Oh! Desgraça para todos os imbecilóides intelectualóides que das "artes conceituais" tanto gostavam.

Certo prédio que ficava quase na esquina do cruzamento com as Avenidas Álvares Cabral e Olegário Maciel foi também aniquilado da existência, obliterado atá a mais fundamentla partícula sub-atômica que o compunha. O "Templo Maior" da Igreja Universal dos ladrões...digo, do reino da picaretag...er, deus foi a próxima vítima. Não sobrou sequer uma daquelas colunas de caríssimo mármore daquele religioso motel que ali existia sem sequer pagar alguma sorte de imposto ao governo, apesar da extorsão diária dos lobos...er, pastores por sobre os burros...er, fiéis, que pagavam "religiosamente" o dízimo. Imposto sobre burrice, de fato, mas mesmo assim. A venda de indulgências era algo que a criatura não tolerava, nem da parte dos ditos protestantes nem da parte dos agentes da maior religião do planeta. Desnecessário dizer, que os demais templos das outras formas de escravidão espiritual também sofreram duras penas no trajeto destrutivo da criatura.

Os órgãos governamentais foram os próximos. O DETRAN, por exemplo, e todos seus ladrões, er, digo, agentes, foram estraçãlhados. Mesmo os policiais servis que transitavam pela cidade, com o intuito de verificar quem era o agente que mais multas distribuía para a população em geral. Estranha competição olímpica esta, mas que teve súbita e fatal interrupção, devido ao esmagamento repentino de tais agentes do KAOS que circulavam pela cidade.

E tantas outras coisa foram destruídas, esfareladas. Tantas e tantas vítimas da raiva mordaz que habitava naquele aparentemente pacato ser que apenas queria chegar a sua moderna senzala, que só queria cumprir as dez horas obrigatórias de fingimento, para depois a alforria virtual acontecer.

----------------------------------------

Horas mais tarde, foi encontrado um corpo desacordado e desprovido de vida nas imediações de Ravena. Ninguém soube dizer como tal gringo foi ali parar. Trajava imundas vestes, e de seu ouvido pendia um fone de ouvido destruído. Aparentemente, morreu de causas auto- inflingidas, apesar de não existirem marcas de balas ou quaisquer outros ferimentos, causados por mortiféros projetéis e/ou agentes afiados. A cidade sequer se deu conta do fato: foi uma nota de rodapé no jornaleco Super - e de similares - do dia seguinte. Aparentemente, o indivíduo teria surtado dentro de um coletivo e saído gritando pela cidade, impropérios dirigidos a seu emprego, às religiões reinantes, a certos órgãos governamentais, como aquele que "gerenciava" o trânsito, e uma certa empresa inexistente denominada Funchato Ltadíssima.

Enquanto isso, a cidade prosseguiu normalmente seu dia naquela sexta feira. Pastores pregararm, oraram e extorquiram, agentes do trânsito multaram e extorquiram, "estudantes" da FUMERD, digo FUMEC, ocuparam até o teto todos os ônibus errados para irem consumir certos agentes entorpecentes e azararem uns aos outros em ambiente "escolar superior" por ali, e tudo mais seguiu da forma que deveria ter seguido.

E num buraco qualquer, o Noiado foi posto para apodrecer. E assim foi.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Vingança!

Continuando os pinçamentos começados ontem, e me relembrando dos velhos tempos de colégio(horríveis tempos passados), sou obrigado a fazer homenagem a uma pessoa que me fez relembrar o Buriol de uns 20 anos atrás(estou ficando muito velho, deveras).

Em nome de todos os gordinhos(sou um ex-gordo) que já sofreram com folgados imbecis na escola, apenas pelo fato de serem gordos, eu lhes apresento o Gordinho Zangief.

Ao ver esta cena, que muitos acharão simplesmente hilária e que bem sei que outros(provavelmente falsos moralistas) dirão que é "muito violenta", ou bobagens do gênero, eu não pude deixar de sentir o gostinho da retribuição, da vingança. Senti mesmo maldosa satisfação, eu diria.

Como queria ter procedido assim com os idiotas que tive de tolerar em meus gordos e adolescentes anos. Pois acho que esse magrelo folgadinho, se tiver um mínimo de noção do perigo, vai pensar umas duas vezes antes de mexer com quem está quieto no seu canto.

Vingança. É um prato que se come frio, deveras. E pode até por vezes ter sabor de fel, mas é um gosto que é bem vindo para aqueles que sofreram a injustiça ou simplesmente foram vítimas de alguma espécie de agressão...

Não costumo pôr em prática tal coisa, muitas vezes em detrimento à minha própria pessoa. Mas sinto ferver o sangue por vezes...e sinto o clamor de agir desmedidamente, em machucar, agredir, ferir, matar, esfolar vivo, tantas e tantas formas de agressão possíveis. Entretanto, em minha mente - e algumas vezes em meus escritos, como podem já ter percebido - eu deixo a imaginação solta para machucar quem me irrita. Mas raramente levo a cabo tais devaneios.

Não sei como funciona o universo, apesar de tantas e tantas vezes "perder tempo" tentando decifrar o funcionamento desta coisa. Mas gosto de imaginar que existe certa forma de retribuição para cada ação indecorosa cometida aos outros. Bem sei que isto pode ser apenas uma vã esperança de obter a tal vingança sem sujar minhas mãos. Mas gosto de pensar na teoria do "aqui se fez, aqui se paga."

E mais uma vez, me surpreendo com a maldade latente existe em mim...e nos seres humanos em geral. Pois bem sei que tal sensação de maldoso deleite existe em todos nós.

Mas, no momento....

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quarta-feira, 16 de março de 2011

In memorian.

Não sei se acontece com todos.

Mas quantas vezes...contemplo a vida que vivi...os caminhos que trilhei, as coisas que fiz...e me espanto. Não com as burradas que já fiz, as coisas idiotas que disse, os lados negativos de minha pessoa que tanto ocupam meu foco. Mas me espanto em verificar...que já fui várias pessoas. Que durante todos estes anos, vivi mais de uma vida, por assim dizer. Relembro-me de fatos que ocorreram vinte anos atrás, mas não consigo me identificar com a pessoa que atuou como protagonista daquelas vivências.

Não preciso ir tão longe na linha temporal...mesmo acontecimentos de um ano atrás, não parecem ter sido vividos por Marcos, o Buriol, mas sim por uma outra pessoa. Outra personalidade. Dá pra entender?

Acho mesmo que não serei o único "cerumano" que já chegou a tal constatação. E suponho que a maioria das pessoas apenas considere isto como crescimento, desenvolvimento, passagem do tempo. Nossa mentalidade muda muito ao longo dos anos. Ou seja, tal devaneio de personalidades em minha vida não passa apenas de conversa meia-boca de mais um filósofo de boteco.

Bem...pode até ser, mas acho tal analogia válida em meu caso. Tenho tantos "Burióis" morando dentro desta cachola, que muitas vezes já me considerei levemente esquizofrênico. Mas como disse um amigo meu o qual comentei este delírio, é absolutamente normal ficar discutindo com estas "vozes" de nossa cabeça. Chama-se pensar. Simples assim, seu pulha. Não complique. Não procure sarna.

Ah, pensar muitas vezes faz mal. É uma das coisas que, quando contemplo meu eu passado de 1985, por exemplo, eu estranho muito. Como era despreocupado! Lado outro, se existir uma criança de oito anos com neuroses semelahantes às que tenho hoje, de fato, é um fato extraordinário e preocupante. Não aconteceu comigo, felizmente. Não me lembro exatamente quando foi que tudo começou - a torrente descontrolada de pensamentos e preocupações, muitas vezes completamente irrelevantes para minha pessoa - mas acho que foi naquela fase tão legal da vida em que os hormônios tomam conta do aborrescente e fazem certas doideiras aflorarem.

Mesmo assim, o Buriol de tantos anos atrás parece ser um desconhecido para o trigésimo quarto Buriol de hoje em dia. As coisas que tolerei no colégio...as picaretagens que vivenciei na faculdade de biologia...tudo tão estranho, extraterreno para este ser que tanto escreve hoje em dia.

É aquela velha questão: se pudéssemos voltar no tempo e vivenciar as coisas que nos aconteceram na época MAS com a mentalidade presente, teríamos procedido da mesma maneira?

O Funcionarismo Púbico dirá que não devo pensar nisso, ou, se estiver a falar comigo através da máscara de Guy Fawkes que costuma usar quando protegido pela internet, simplesmente me escrachará e me mandará parar de ver navios.

Hoje replico, "foda-se você." E novamente cito um de meus preferidos poemas de Pessoa, o que tinha tantos "Pessoas" em si.

Este sou eu. Problemático, sim. Mas ansioso de me ver diferente do indefeso Buriol que tanto tolerou chatices durante a vida e calou-se muitas vezes.

Que aquele morra para sempre. E que o atual se torne mais forte. Chatos somos todos; sim é verdade. Mas quem disse que sou obrigado a tolerar calado a chatice alheia?

Mudemos, sempre e para sempre. Para melhor.

"Ameim."

terça-feira, 15 de março de 2011

Cenas.

-Bom dia. Eu gostaria de levar dois quilos de granola e seis litros de iogurte natural, por favor.
-Senhora, isto é uma sex shop.
-Pois é, sou a favor do sexo natural.
-Naturalmente. Mas não temos estes artigos aqui.
-Então me embrulha aquele vermelho ali.
-Senhora, o extintor de incêndio não está à venda.

-------

-Bem vindos à mais uma reunião dos associados da Opus Dei. Temos aqui um novo membro querendo se apresentar.
-Em me chamo Aldair. Ontem eu matei dez coelhinhos.
-...
-E hoje estou aqui para ceifar da face da terra certos fanáticos religiosos! Morram!
-Céus! Ele tem uma arma!!
-Arma nada. É só um pepino.
-Não subestime o pepino, seu maldito hipócrita. Hoje, irei transformar isto aqui em uma sucursal da "Ooops Dei", se é que me entendem!
-Não!!!!

---------------------

-Quem canta esta música que estás a cantarolar?
-Celine Dion.
-Então vamos manter desta forma. Deixa só ela cantar.
-....fedaputa.
-Pensando bem, acho que este dilema não tem solução. A não ser ir para o Canadá trinta anos atrás e assassinar esta mulé que acha que sabe cantar....

--------------

-Eu quero um cigarro.
-Senhor, isto é uma reunião de apoia a tuberculosos! Como ousa?
-Oh, desculpe. Achei que fosse reunião dos mascadores de fumo, de tanto catarro junto.

--------------------

-E agora, misture o leite e bata três minutos na velocidade três.
-Certo.
-Depois, é só acrescentar essência de baunilha e levar ao forno médio por trinta minutos.
-De acordo. Mas achei que fazer uma vasectomia fosse bem diferente disto.

-----------------------------

-Menina, hoje fui ao shopping!
-Comprou sapatos?
-Não! Mas comprei sapatos!
-Ah, achei que tivesse oferta de sapatos!
-Tinha! Mas eu só comprei três pares de sandálias.
-Nenhum sapato! Como assim???
-É que pretendo mudar de sexo. Tenho que ir aos poucos senão não dá né.

---------------------

-Hoje de manhã eu comi muito iogurte.
-Que maravilha. Mas isto aqui é uma banca de jornal.
-Banca? Que apito toca nessa banca? Isso é uma banca??
-O senhor não está com toda esta banca!
-Ah bom, achei que fosse apenas uma banca.
-Senhores, me desculpem, mas será que eu poderia continuar a defender minha tese de doutorado, por favor?

-------------

-Chove lá fora. Céu abaixo.
-Eu sei.
-E não quero me molhar.
-Você é feito de açúcar por acaso??
-Sou, olha só.
-Putz. Como é possível existir semelhante criatura?
-Joãozinho, já falei pra parar de falar com sua rapadura!!! Agora, coma logo seu café.
-Mas café num é de beber?
-Este não. Abra a boca que lá vem o aviãozinho de pó de café...
-Odeio mães naturalistas e hippies.
-E eu odeio pirralhos remelentos e loucos.
-De novo está falando com o espelho da cristaleira, meu bem? Tomou seus remédios hoje?
-Quem é você? Aqui não tem ninguém com este nome!
-Puta merda, entrei na casa errada de novo. Perdão.

--------------------------

-Quero comprar uma resma de folhas A3 super-white, por favor.
-Você desenha?
-Sim.
-Coitado.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Estar.

Começe a semana. Aperte o play.

A primeira segunda feira depois de semanas de férias é algo memorável. Sim, lá vem mais uma torrente de resmungos, pensam os que por cá ainda se aventuram. Não irei negar, uma vez que é de minha natureza ser o reclamão, mas no dia de hoje, não sinto raiva, não sinto nada disso. Sinto...apatia, eu diria.

E ainda assim, sou obrigado a me juntar a grande parte da humanidade e dizer, "ainda bem que não moro no Japão."

Estranho. Eu analiso esta sentença, e não deixo de me sentir um babaca; esta sensação de alívio por não estar presente no epicentro daquele desastre, me deixa meio que enojado de mim mesmo. Bem sei que é uma sensação no mínimo estranha. Ora. Não foi por opção minha ter nascido aqui, mesmo que deste país pareça não ser natural, com minhas louras barbas e minha pele cor de cera de vela. Nasci aqui, não sou de lá, não tenho culpa.

E senti na pele o tal alívio. Foi dos piores desastres naturais que já vi, ainda que nem perto de lá tenha estado. E me pus a pensar nesta sensação...e me senti mal por eles. Sei lá se isso é empatia ou apenas algo em que pensar, merda no que pensar, como é de praxe desta mente irrequieta porém imbecil, por vezes. Para que pensar nisso, dirá o Funcionarismo Púbico. Para quê?

Não sei. Eu penso, é tudo que sei.

Pensei também que fosse hoje uma segunda feira 13, de tão estranha está a sensação reinante em minha cabeça. Doem-me as circunvoluções cerebrais, diante de mim mesmo, diante do mundo, diante das coisas que penso, do que devo fazer, do que devo deixar de fazer. Sim, um saco, eu sei. E ainda me perguntam por que não quero de meu irredutível reduto me afastar. Exigem minha companhia, mas mal sabem eles o que estão a pedir.

Querem mesmo vocês, meus clamantes, reclamantes amigos, azedar vossos dias com tais pensamentos oriundos de um ser desprezível como eu? Querem mesmo? São assim tão sádicos?

Enfim. Este sou eu. Quando me deparo com alguém com índole semelhante à minha - tenho auto crítica suficiente para saber identificar e admitir isto - sinto preguiça imensa de tal pessoa. Especialmente se não estou na mesma sintonia pessimista da pessoa em questão.

Ai ai. Juntemo-nos ao restante da humanidade. Pelo menos não estamos no Japão. Pelo menos não temos que nos virar com tsunamis, terremotos e Chernobyl II, a missão.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Cotonetes.

Estava eu, a ver o panorama mundial, pela net, pela rede de tantos e tantos computadores interligados, mantendo as pessoas juntas mantendo-as convenientemente longe, cada macaco no seu galho, cada coisa em seu lugar, por vezes mais distantes que os outros. Olho para a piadinha jocosa e energúmena do Púbico Funcionário. Existe o comando, que deve ser usado. Existe no mundo virtual, tem de haver no mundo real: "/ignore". Sim, sim, deveras. Ignorar faz bem, especialmente quando não se vale mais a pena preocupar com tais coisas. O importante é seguir em frente. Adiante. Progredir.

Ignorada a ameaça de mau humor induzido, vamos ao comércio. Comércio de escravas brancas, pretas, vermelhas, universais, oh que maravilha! Dizem tanta coisa sobre este mercado, tantas ofertas, tantas carnes. Ó belas e acessíveis carnes, pague o preço e se divirta. Eu não. Existem prioridades mais prioritárias que esta. Existem Telecasters, SGs, e a tão almejada Jazzmaster, objetos mui aprazíveis aos olhos e aos desejos consumistas deste Noiado, ser estranho que rejeita objetos de consumo carnal; não tentem entender: assim como ele não vos entende, o recíproco é deveras verdadeiro.

Afinal, para qual de nós existe a verdade absoluta? Qual de nós deseja exatamente as mesmas coisas que o restante da humanidade? Ninguém, absolutamente ninguém negará o fato de que é impossível contemplar todas as coisas que outrem deseja sem torcer o nariz para certos anseios de nossos compatriotas, frangos por nascença, unidos pela genética, pelo acidente mais catastrófico que a evolução produziu. Uns querem carros, outros querem guitarras. Alguns desejam o rabo de Emengarda temperado no açafrão e azeite de dendê(Oh, dê, dê!), outros apenas almejam um prato de macarrão, qualquer coisa para se mastigar nas amargosas noites sem-teto em uma metrópole qualquer espahada na superfície deste glóbulo celeste.

E como é errática a vontade das gentes humanas, sobre-humanas, sub-humanas. Ontem, queria eu comprar uma cadeira, e deveras a comprei, hoje quero eu mais uma menina dotada de seis cordas em seu corpo, apenas para a possuir em minhas mãos e dela arrancaralgum suspiro. Sim, a analogia carnal é sempre existente neste caso, e garanto que alguns de nós na hora pensaram em outras coisas, tão presentes na mente dos homens que por aí existem. Sim, desejos, anseios: uns ditados pelo consumismo puramente capitalista em essência, outros menos voltados ao poder aquisitivo.

Por quê então estranhar o que os outros querem? Porque mesmo rechaçar as prefêrencias duns e d'outros? Sim, existem desejos impublicáveis, mesmo execráveis, como aqueles presentes nas mentes de certos representantes de certos curandeirismos representados por doutos e abastados senhores residentes e/ou representantes de certo "paíseco" europeu, capital do obscurantismo mundial, começado com a letra V. Bizarros senhores estes, uns dignos de pena, outros dignos de pedras, muitas pedras por cima das "santas" cabeças. Ambas.

Eu, de meu lado, fico com minhas bizarrices, e tento com elas conviver. Tenho meus anseios consumistas como outro ser qualquer, integrante da realidade econômica do mundo. Tenho estranhos desejos e estranhos gostos como qualquer outro ser humano.

E me pergunto, o motivo da mente, minha própria mente, me trair por horas, me pôr a questionar meus anseios em detrimento aos desejos dos outros...

Ó incongruente mente. Se ao menos soubéssemos domá-la de forma a ser menos problemática. Suponho que sim, exista uma forma. Ainda assim, não a encontrei...

O que fazer? Enquanto estiver vivo, é preciso buscar tal objetivo. O difícil é sempre se recordar de tal meta...especialmente estando nós cercados de agentes do caos, que tanto insistem em nos baratinar as mentes.

Mas, no momento, o importante é segui a píton, tentar entendê-la. Tentar achar o rastro da cobra e dela tirar alguma esperança, para mim muito mais válida que os anseios da acefalia púbica. Nos dois sentidos da infeliz comparação.

Voltemos então, ao estudo à distância segura de meu aparato computadorístico.

Até a vista, confrades de minha vida, estranha vida.

quinta-feira, 10 de março de 2011

O Retorno do R...ecalcitrante.

Olhos. Pendentes de sono, olhos. Dormentes em todo meu costumeiro hábito adquirido de, durante trinta e três dias(e meio) ter conseguido acordar a hora que eu bem entendesse. E agora, tendo este meu saudável hábito interrompido pelas idióticas lides do capitalismo de proveta, cá estou a cabeçear de sono, diante deste aparato computadorístico.

É a vida. Nem só de férias vive o homem, infelizmente. Há que se voltar à senzala moderna das quatro paredes que nos encerram dez horas por dia, para que no final do mês possamos ter dinheiro para comprarmos o que não queremos, o que não precisamos de fato. Enquanto lá fora, tudo o que gostamos de fazer fica à nossa espera nas horas de folga. Ó céus, ó vida, que azar.

É o mundo. Assim está organizado, desde sei lá quando. E como não somos todos abençoados pelo nascimento em doirados berços da herança milionária de alguns pais de sortudos filhos por aí, como o dono desta empresa a qual sou escravo, temos que nos sujeitar a tal agressão, acordar em horas insones da madrugada para vir ter ao trabalho que tanto odiamos, esperar dez horas passarem. É a vida.

Enfim. Não é tão mal assim. Sei que poderia ser muito pior, pois cá existem alguns infelizes, residentes das famosas ZL(Zona Longe), que têm de acordar às quatro da matina para cá chegarem antes das oito.

Deixemos de divagar sobre as práticas horrendas que o vil metal nos obriga...estou de volta, estou inteiro, fiquei trinta e três dias de férias, aproveitei bastante, fiz quase tudo que desejava fazer: não viajei para nenhum lugar além de virtuais localidades em um universo alternativo e artificial, somente tendo me dirigido para a casa de meu irmão extra-oficial, que considero muito mais irmão que meu próprio irmão, se é que dá para entender semelhante e incongruente sentença. Proveitosa viagem esta foi; mesmo que viajantes propriamente ditos sequer considerem tal peregrinação como uma atividade digna de férias, foi por lá que tive o prazer de vislumbrar uma certa luz no final do escuro túnel que minha vida profissional tem sido nestes últimos anos.

Com cuidado considero tal possibilidade, e com afinco tenho tentado levar a cabo tal possibilidade. Nada é certo, mas ao menos considero tal evento como a mais concreta forma de obter alguma mudança séria em minha vida, quiçá uma saída desta merda que me encontro, em que fico basicamente vegetando por dez longas horas diárias.

Veremos o que se sucede. Entrementes, é hora de retornar ao mundo exterior que tanto abandonei por esta sequência mui palatável de dias que se passaram.



Fui mordido por uma píton. E agora aguardo que o veneno da mesma não seja assim tão venenoso, que eu consiga compreender os mecanismos por detrás de tal coisa.

Veremos o que se sucede. Enquanto isto, enquanto as dez horas de terrível ócio pago não passam, estudemos os efeitos de tal veneno.