terça-feira, 31 de março de 2009

Errado.

Se você acordou no teto, você acordou errado.
Se você não se sente bem, mas aprentemente tudo está bem, você acordou errado.
Se você se sente pesado, e no entanto nao ganhou nem um grama, você acordou errado.
Se você quer coisas que não tem e se lamenta por isso, você acordou errado.

Se você tem raiva de todos ao redor, você está errado.
Se você quer descarregar tudo que sente em todos ao redor, você está errado.
Se você está lendo agressividade em tudo ao redor, você está errado.

Se você anda mal, mesmo andand0 bem, você sempre foi errado.
Se você acha que estão todos certos, você está errado.
Se você acha que estão todos certos, você está errado.
Se você achou que você iria fazer a diferença este ano, você estava errado.

Se você esteve aqui, estando ali, você estava errado.
Se você quis mas não conseguiu, provavelmente estava errado.
Se você achou que era certo porque estava errado, você não podia estar mais errado.
Se você, você, você, achou que era tudo certo, estava tudo errado.

Se você achou que podia deixar as coisas para trás, você estava errado.
Se você achou que uma decisão o salvaria, você esteve errado.

Estava errado. Esteve errado. Estará errado.

Se você achou que poderia resolver tudo de uma vez, vocÊ estava errado.
Se você sente que não te dão valor, você está errado.
Se você pensa que te dão valor, você está sempre errado.

Se você escreve sobre achar tudo errado, você não poderia estar mais errado.

Se você. Ler tudo isto e achar errado.

Você está errado.

Se você quis ser e não é, você esteve errado.
Se você não é, você está errado.
Se você é, você é errado.

Se você achou mas se perdeu, você está ferrado.
Se você quis mas não "soube" fazer, você está ferrado.
Se você existe, você está ferrado.

Se você. Ler tudo isto e achar errado.

Você está errado.



segunda-feira, 30 de março de 2009

Monday morning report.

Chove pra caralho, há névoa(neve, segundo os contemplados no bolsa-família 2009, tambem conhecido como Pro-Álcool 2009)por todos os lados e cá estou, a ver o que escrevo na data d'hoje. Novamente, o semana-fim não foi dos mais produtivos, mas os motivos foram bem mais interessantes que meros ocasos criativos.

Primeiramente, conheci deste lado do Atlântico minha porção além-Brasil, conhecendo meus parentes de sei lá que grau que residem na terra de meus avós e que aqui estiveram - e ainda estão - nestes dias. Depois que minha mãe e minhas tias os visitaram algumas vezes na terrinha, eles resolveram que era hora de virem verificar a quantas andam os tchecos transplantados para as terras tupiniquins. Estamos bem, conforme eles verificaram, e apesar do tempo não estar ajudando muito estes dias, com suas incessantes precipitações de água, água e mais água, eles estão se divertindo por aqui.

O pessoal é bastante gente boa, conforme verifiquei com escassas conversas em inglês com Vlad, o único deles que fala mais ativamente outra língua que não o tcheco, este desconhecido. Fiquei bem interessado em visitá-los algum dia, se possível em companhia de minha mula preferida, que também conversou muito com ele. Lugar para ficarmos lá já estaria garantido, pelo que nos foi afirmado.

Outro fato inútil do fim de semana foi a tradicional feijoada comemorativa que minha tia Olga sempre costuma fazer nestas ocasiões. A iguria é lendária, eis que me recuso a comer tal coisa em outro lugar que não seja ali. Fiquei imaginado, entretanto, se os estômagos estrangeiros nada acostumados com nossa tradicional comida gordurosa - e ponha gordurosa nisso - iriam suportar tal coisa de maneira adequada. Parece-me que eles resistiram bem mais que este que vos escreve; também, este aqui resolveu se aventurar nas misturas de limão, açúcar e cachaça, apenas para ficar com a cara rosa, ficar falando altas merdas enquanto sentia o mundo girar ao redor, ficar com sono excessivo, comer além da conta e passar mal em seguida. Tive mesmo que abandonar o barco mais cedo e fazer uso da única frase que sei na língua natal de meus parentes, que não vou escrever na grafia certa(meu teclado não possui aqueles acentos bizarros todos) mas que é a seguinte: "agora eu vou dormir". Hu-há.

E, não satisfeito em passar vexame diante de todos, meu corpo resolveu continuar a reclamar comigo no domingo, dia este que visitei o vaso sanitário inúmeras vezes, seja para coisas naturais tanto para outras nem tanto, como o expurgo de meu café da manhã no orelhão de louça. O Buriol dantes não é mais o mesmo. "É a idade," como diria meu adevogado. Tal coisa me impediu de ir ter com a parentada em outro evento mais natureba, em algum lugar perto de Rio Acima, onde eles finalmente puderam ver a face do sol brasileiro, até então desconhecido para eles.

Enfim, fui melhorar os ânimos muito tarde no domingo, após passar o dia a soro fisiológico e torradas. Mais uma vez repito, o álcool não compensa. Lado outro, como fui forçado a praticar atividades físicas extremamente limitadas, andei ouvindo algumas coisas diferentes e acabei fazendo descobertas sônicas que me deixaram muito impressionado. Nada muito recente, é verdade - me parece que após o ano 2000, as bandas ditas "novas" se resumem a coisas ruins, horrendas, hediondas ou simplesmente reciclagens descaradas dos anos 80 - que foram anos terríveis, em vários sentidos, incluindo os aspectos musicais. Enfim, mesmo assim fiquei impressionado positivamente com os ingleses do Boo Radleys, e recomendo muitíssimo a audição de seu terceiro disco, Giant Steps.

Enfim, veremos o que mais haverá de acontecer por estes dias tão úmidos.

sexta-feira, 27 de março de 2009

5 pontas.

...tentou se desligar, por um instante que fosse, daquilo tudo. Inútil. Ainda ouvia os gritos lancinantes, ouvia os barulhos de coisas se partindo, coisas...que estavam encerradas dentro de um corpo, por debaixo de pele, músculos e sangue. Sangue. Muito sangue.

Lamentou-se mais uma vez por ter sido tão idiota. O que ele estava fazendo ali? Vencendo uma aposta ridícula entre amigos? Para que? Porque havia sido tão idiota?

O coral diabólico continuava a entoar sua parede de vozes grossas em uníssono em sua mente. Quanto tempo havia se passado, ele não saberia dizer. Sabia, no entanto, que estava coberto de vômito seco e ainda estava dentro da caixa.

Mas também, como iria ele adivinhar que todas as histórias sobre aquele lugar eram verdadeiras. O que havia presenciado era ainda pior que todas as histórias, para dizer a verdade. O que ele havia visto nunca poderia ser apagado de sua mente.

Ele tentou se lembrar de como tudo aquilo havia começado. A floresta perto do matadouro da cidade. A torre, se elevando por cima da floresta. As histórias contadas duas noites atrás. A aposta.

A aposta. Para que havia sido tão imbecil. Muito destemido, ele. Muito esperto. Feito se nunca tivesse lido algum livro de terror, visto milhares de filmes em que os protagonistas agem de maneira semelhante à dele. Havia, de fato entrado na torre, por um buraco lateral na construção que conseguiu se esgueirar. Tinha explorado o interior da construção, que lhe pareceu completamente inofensivo.

Até achar uma passagem devidamente escondida. Até achar o altar. Até ver aonde estava, a ponto de ouvir passos se aproximando...Ao seu redor, apenas caixas e mais caixas, muito grandes, todas meio amarronzadas de algum líquido que havia escorrido pelas juntas. Sem pensar, se adentrou numa que estava próximo dele, quase sufocando com o mau cheiro que emanava de dentro dela.

Segundos após, estava tonto com o fedor que havia ali dentro. Ouviu mais passos ao seu redor, e teve que fazer um esforço sobre-humano para não tossir. O múmurio devozes estranhas ao seu redor...Deslocou um pouco a tampa da caixa para tentar respira um ar menos hediondo e para ver.

Alguém havia acendido tochas ao redor. Viu muitas pessoas ao redor...todas vestidas de trajes pretos, com capuzes.

Em que havia se metido?

Ouviu um deles começar a entoar um cântico estranho, sendo seguido pelos outros. Uma figura muito bizarra entrou no recinto, alguém muito mais alto que os outros, com um traje diferente também. Logo em seguida, berros horrorizados, alguém implorando, "NÃO! ME DEIXEM IR EMBORA!!!" Ele estava semi-nu, apenas com um trapo na cintura, amarrado em uma espécie de pelourinho móvel.

Trouxeram alguém amarrado logo atrás da figura gigantesca. Um de seus amigos. Estava coberto de cortes, sangrando por todos os lados.

Seu cérebro comandou seu corpo a fechar os olhos, mas eles não obedeceram.

Viu tudo.

Viu como a figura gigantesca levantou os braços deformados e o cântico parou. Ouviu a voz gutural da figura, dizendo coisas em algum linguajar desconhecido. E seu amigo continuava gritando. Viu como trouxeram um estranho cajado para o chefe, que ele apanhou, continuando a discursar naquela língua bizarra.

E seu amigo continuava gritando.

Viu como se aproximaram dele com baldes, jogando algum líquido por cima de seu corpo. A julgar pelos berros que se sucederam, NÃO era água. Viu como a figura gigantesca levantou seu capuz, revelando uma deformidade nada humana por debaixo daquele capuz. Se aproximou de seu amigo e levantou o cajado, que possuía uma ponta metálica afiada.

"Feche os olhos seu IDIOTA", mais uma vez seu lado racional comandou. Não conseguia nem respirar, muito menos fechar os olhos.

E seu amigo continuava berrando.

Primeiramente a coisa fez cinco furos no tórax de seu amigo, que continuava urrando. O demônio riscou a carne dele com a ponta da coisa, ligando os cinco pontos, ignorando completamente as súplicas de sua vítima. Em seguida, traçou um círculo ao redor de tudo com precisão cirúrgica.

Um pentagrama. Invertido.

Sim, ele havia visto filmes de terror o suficiente para saber o que aquilo significava.

Entornaram mais algum líquido por cima do corpo mutilado de seu amigo. Novos berros vieram da garganta dele, seguidos de urros de júbilo ao seu redor.

As figuras encapuzadas estavam exultantes, de fato. O chefe deles levantou seus braços novamente, e o rumor cessou, só restando o lamento de seu amigo atado àquele poste, sofrendo um suplício icomensurável. A figura deformada se virou para ele e disse mais alguma coisa. Logo em seguida, viu que a coisa arreganhou a boca, exibindo uma fileira de dentes altamente pontiagudos.

E seu amigo berrou como nunca.

A coisa se lançou sobre ele, mordendo, rosnando, arrancando pedaços. Quando a figura se ergueu novamente, a cabeça de seu amigo não pendeu para trás apenas porque seu corpo estava atado no tronco. O sangue jorrava de alguma artéria no pescoço dilacerado.

Nessa hora, sentiu algo a brotar de dentro dele, e novamente teve que fazer um esforço hercúleo para que não vomitasse muito ruidosamente.

Ainda assim, não conseguiu desviar o olhar.

A coisa novamente se lançou sobre o corpo agora silente de seu amigo, retomando o festim diabólico. "FECHE OS OLHOS, CARALHO!!!" De nada adiantava. Viu tudo. Ouviu tudo. O sangue, a carne, o rumr dos ossos sendo mascados por mandíbulas desumanas.

Sentiu que de uma forma ou de outra, sua porção racional o forçaria a fechar os olhos, ainda que fosse por mal. Desativou tudo, e ele não viu mais nada.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Texto.

Invenção. Há que se inventar coisas a escrever, neste instante. Falam de futebol ao meu lado, mas não necessariamente a mim, pois eis que concordo pacificamente sem captar toda a mensagem reinante ali, se é que ela existe.

Pensar, pensar. Mesas de escritório não são nada inspiradoras. Não são nada musas. Gerusas, Vanusas, Ferro-gusa, merluza. Tive uma profesora de bioquímica que se chamava Santuza. Ela não manifestava emoções, mas era menos andróide que a professora de embriologia, que mais parecia um robô japonês. E eis que vão bater o cartão alguns andares abaixo. Onde andarão? As pessoas que comigo cursaram aquele concurso, que se tornou um curso, com poucos recursos, em nada incursos, porém deveras abstratos.

Abstrato foi a outra desventura, desprovida de ventura, nada parecida com uma aventura, que se passou em uma comédia ou tragédia romana em outro prédio, outra unidade, mesma faculdade, anos após o fiasco, que me deixou cheio de asco. Outro lugar, outro andar, outras pessoas, outras intenções, novas ilusões. Bobinho. Ano após ano, mês após mês, dia após dia, uma coisa atrás da outra, assim como um mar de morros, escasso de cumes e servido de vales, estes ou de depressão ou de lágrimas, rios e rios a escorrer por entre a escuridão reinante nos vales desta natureza. Outra vez, ali não se encontrava nada, porém reinava o tudo.

Vida, essa desconhecida. Esta alucinação em que vivo, em que vivem, todos compartilham do mesmo coma coletivo, apesar de não estarmos conectados a um ambiente virtual e fictício. É real, muito real, mais do que frequentemente gostaríamos que o fosse. Apegamo-nos ao real, mas abraçamos o virtual, quer seja ele lícito ou não. Criamos realidades paralelas, outros universos, novas fugas. Drogas. Computadores. Mundos que não existem mas que nos dominam. Álcool, alcalóides, esteróides. Yoga, meditação, relaxamento, para além do firmamento. Mundos e fundos. Bem fundo mesmo. Religiões e pós vida. O sentido escrito em um lvro, traduzido e retraduzido, nada fiel a seu texto original, assim o suponho.

Bom dia, café. Bom dia, água filtrada, esterilizada, acidulada, tratada. Nada do que foi será de novo como o é neste instante, neste instante que invento tudo isto, tudo que escrevo, tudo que não planejo mas que aparece diante de mim. Invento esta realidade para tentar escapar da minha. Não sei se sou assim, se sou assado, mas sei que não é assim que a vida funciona. Capturo frases alheias, escrevo e escrevo. Tento e tento. Não sei de nada, mas desconfio de muita coisa. Tanto que estou aqui, a me tornar mais e mais preso dentro da minha solitária, o lugar mais sozinho do mundo e o mais seguro também. Daqui, algo me diz, que não devo entregar-me a isto, que devo tentar achar a chave, esta outra desconhecida. Escrevo e escrevo, não estando isento de machucar aos outros mas ao mesmo tempo que sei que me machuco muito mais que aos outros.

Escrevo, tentando encontrar a tradução de mim mesmo. Para que os outros entendam ou tentem entender, de alguma forma ou de outra. Dizem-me que estou assim porque quero, porque desejo, porque não saio daqui, não saio dali, não saio de lugar algum. Estou aqui mas estou em outros lugares, tentando achar a saída desta coisa, deste lugar. Acusam-me e acusam-me. Sei que não estou isento de culpa, que não possuo a razão por completo. Ninguém possui esta coisa. Escrevo e escrevo. Se não entendem, entendo muito menos. Assim e assado, assado e assim.

Perdão é o que deveria pedir, eu suponho. Fazem gols, fazem filhos, falta luz, falta dinheiro, falta esperança. Falta sentido, faltam sentidos, nada do que escrevo é nada mais além de mim mesmo, de mim mesmo, daqui mesmo, de onde estou. Entendam ou não, assim o sou, assim o é, assim será, assim estarei. Escrevo e escrevo, mas frequentemente encontro em outros lugares semelhantes traduções, semelhantes retratos, aparentemente não estou sozinho, encontro-me musicado, narrado por outrem:

i am a scientist - i seek to understand me
all of my impurities and evils yet unknown
i am a journalist - i write to you to show you
i am an incurable
and nothing else behaves like me

and i know what's right
but i'm losing sight
of the clues for which i search and choose
to abuse
to just unlock my mind
yeah, and just unlock my mind

i am a pharmacist
prescriptions i will fill you
potions, pills and medicines
to ease your painful lives
i am a lost soul
i shoot myself with rock & roll
the hole i dig is bottomless
but nothing else can set me free

and i know what's right
but i'm losing sight
of the clues for which i search and choose
to abuse
to just unlock my mind
yeah, and just unlock my mind

i am a scientist - i seek to understand me
i am an incurable and nothing else behaves like me

everything is right
everything works out right
everything fades from sight
because that's alright with me

---Guided By Voices, I am a scientist.

Enfim, assim o sou, assim tento me comunicar. Vivam os repentes de Robert Pollard e sua voz, sua encarnação, seu reflexo de si próprio que é também meu, esta banda chamada Guided By Voices. Esta, afirmo eu, é uma das mais completas interpretações de mim mesmo já escrita por outra pessoa.

E tenho que parar. Há que se ganhar o pão nosso de cada dia. Paro, mas hei de continuar, até onde der, até onde convir, até onde for. Até que não haja mais nada para se escrever. Dia este que estarei morto.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Bom...SOC!

"Bom dia!", disse a ululante caixa do supermercado. Um soco, alguns dentes quebrados. Em frente. Na banca de jornais, "Bom dia", mais um soco, mais alguns dentes quebrados. E burburinho ao redor, claro. Adiante. Na entrada do prédio, "Bom dia", várias pessoas perderam alguns de seus dentes ao mesmo tempo agora. A cena se repetiu no elevador. Na cozinha do prédio. Nos corredores. E enfim, em sua sala. Neste momento, os bem humorados resolveram organizar um levante popular ribeirinho escalafobético e defenestrar o mau-humorado cidadão, que se esborrachou cheio de felicidade no pavimento da rua.

Sim. Seria este o resumo de alguns dias, estes em que o sol parce ter-se levantado apenas para nos humilhar. São momentos de crise reinante, dias em que tudo dá errado e que você desejaria apenas que a terra lhe fosse leve ao te engolir. Dias, em suma, que a bruxa está a solta; que os demônios estão atrás de você; dias que você virou a diversão pessoal de uma entidade qualquer.

Sim, bem sabemos que, supostamente, estes dias não acontecem todos os dias, por mais pleonástica que possa ser tal afirmação. E que temos que aturá-los com a melhor de nossa paciência, para que continuemos vivos. Assim o é. Mas, por vezes, embarcamos em uma sequência de dias ruins, dias ingratos, dias opressivos e cruéis, em que as horas se arrastam de tal forma que de fato, parece até brincadeira de mal gosto. E por vezes, logo ao levantar, você tem a nítida certeza que o dia de ontem ainda não acabou, sendo que este foi a extensão terrível de outra sequência de outros dias terríveis.

Aí, estranham quando você reage mal ao cumprimento mais trivial de todos: BOM DIA.

Bom dia de cu é rola, dá vontade de dizer por vezes. Ou dar um soco na boca do dizente. Mas, para não ser defenestrado pelas pessoas de bem ou ser tachado de incorrigível mau-humorado, pessoa esta que merece ser atirada às masmorras levantadas por nossos bem-humorados regentes, temos que sorrir hipocritamente e rebater: Bom dia.

Nada impede que em nossa mente matemos tal pessoa, ou brinquemos de dentista amador com tal cobaia. Algo do gênero, por assim dizer.

Havia um ex-colega meu na remota época que os sonhos de ser um eminente biólogo ainda existiam, que não hesitava em responder, "MAU dia" a todos os "Bom dias" que lhe apareciam, se lhe apetecesse. Evidentemente, tal pessoa teve que abandonar seu curioso hábito para que não fosse queimado em praça pública. No final das contas, parece-me que todos têm de se resignar perante à nossa EXTREMAMENTE autêntica ZOOciedade, e fingir, fazer de conta que tudo está bem, que tudo vai melhorar, que temos que ter fé.

Fé é o caralho.

Sim. A bruxa anda à solta por meus lados, e por mais que me acusem de ser isto e aquilo, que eu deveria erguer os braços para o céu e promover ação de graças, afirmo que isto é uma autêntica perca de tempo. Deixem-me ir para o diabo sozinho, como disse anteriormente. Ou apenas aguardem que a vida me jogue um osso, como já o disseram:

"When I'm a good dog
they sometimes throw me a bone in."

--Pink Floyd, Nobody home.

Sim, celebremos os maus dias, já que têm de ser parte da vida. Que venham os ditos populares de vão remédio para tais aflições, "Há que se conhecer a escuridão para se discernir a luz", "Dias melhores virão", "Tudo vai melhorar", "Depois da tempestade vem a bonança", etc etc e tal.

Acho que tais eufemismos poderiam constar na famosa listagem, "Top 10 maiores mentiras já contadas". Não tenho em mãos a listagem definitiva, por assim dizer, e lamento. Mas algumas delas incluem, "Dinheiro não traz felicidade", "Só vou pôr a cabecinha", "Brasil, um país de todos" e por aí vai.


Sim, o dia está mal, começou mal e irá terminar mal.


Bom dia.

"I've got wild staring eyes.
And I've got a strong urge to fly.
But I got nowhere to fly to.
Ooooh, Babe when I pick up the phone
There's still nobody home."

--Idem, ibidem.

terça-feira, 24 de março de 2009

III.

Bzzzzzzz.

Enquanto sua cabeça ainda zumbia, o mundo se refez ao seu redor, ainda que de maneira muito desagradável, como iria constatar em breve. Sentiu dor, muita dor, ao tentar mexer sua cabeça. Sentiu em seguida um empurrão, seguido do ruído metálico.

Clic.

Abriu os olhos. Diante de seu nariz, apenas uma sombra circular. Após alguns momentos de profunda estupefação, sua vista focou direito o cano dotado de uma alça de mira à sua frente.

"Nem tente fazer alguma gracinha," uma voz disse. Sua visão estava um tanto embaralhada ainda, seus ouvidos ainda estavam inundados do insistente zumbido, seu estômago roncou. Que fome, pensou ele. Logo após esta sequência de pensamentos e constatações, sacudiu um pouco a cabeça, aumentando mais ainda a dor latejante em suas têmporas, em sua testa, em sua nuca.

Fixando as pupilas no cano à sua frente, tentou reorganizar seus pensamentos. Tentou se lembrar do que havia acontecido até então.

Um imenso ponto de interrogação dançou em sua mente. Nada a declarar. Não sei de nada. Não vi nada. Circulando.

Sentiu o metal frio encostando em seu nariz. Não gostou nada daquilo. "O que há? O gato pegou sua língua? Comece a falar!"

Saco. Com todo aquele torpor em sua cabeça, ainda tinha que lidar com um provável agressor, alguém que não tinha idéia de quem seria, mas que estava com a evidente vantagem de estar portando alguma arma de fogo, apontada para o meio de sua fuça. Qualquer coisa significaria, Bang. Adeus cabeça. Olhou para a cara de seu "dono", aquele que o tinha na coleira. Não gostou do que viu. Tinha cara de rato.

Sem ao menos saber como, um flash de luz cegou sua visão por alguns segundos - ou pelo menos assim o pareceu. Quando se deu por si novamente, estava de pé. Sua visão estava um tanto desfocada, o zumbido em sua cabeça parecia ter aumentado. Soltou uma das mãos de sua carga e com ela esfregou sua cabeça. Ai. O que havia acontecido?

O que tinha em suas mãos?

Abriu os olhos e olhou para o rifle calibre 12 que segurava com a mão direita. Enquanto tentava em vão elaborar alguma explicação em sua cabeça, notou que haviam respingos de sangue em suas mãos. Em seu peito. Algo molhado, espesso, escorria de sua testa. Passou a mão direita ali e viu a mancha vermelha em seus dedos.

No chão, um corpo. Alguém com cara de rato.

Ouviu passos, alguém dizendo, "Zalinski! O que aconteceu? Ouvi um tiro!"

Um tiro foi o que ele ouviu, de fato. A última coisa que ele ouviu. Acertou em cheio na cabeça do infeliz, que se transformou em uma explosão duma massa vermelha, sangue, miolos, ossos.

Que belo fim para alguém que não tinha nem idéia de quem fosse.

Não estava entendendo nada, mas pelo visto não estava seguro ali. Uma rápida checagem em sua mais recente vítima revelou que ele também tinha uma predileção por escopetas calibre doze, bem como o falecido Zalinski, que tinha cara de rato. Apanhou toda a munição extra do outro falecido e procurou por mais algo em seu corpo. Um molho de chaves. Poderia ser útil depois.

Agora, tinha que sair dali. Olhou ao redor, aquilo parecia uma fábrica qualquer. Havia um tonel gigante aberto perto dele; com algum esforço, jogou os dois infelizes ali, sem se preocupar com que diabos poderia estar sendo processado naquilo. Sentiu dores na perna. Havia um curativo improvisado numa delas, parecia que havia sofrido algum acidente recente.

Não se lembrava de nada. Mas sentia que não tinha tempo a perder com este tipo de pensamento. Não agora. Sentia perigo no ar.

Olhou mais uma vez ao seu redor, mas não viu ninguém. Mas, ao longe, ouviu vozes.

Esgueirando-se cuidadosamente, para não fazer barulho, atingiu o segundo andar daquela fábrica e procurou por algum esconderijo. Entando em um escritório destrancado, viu em um canto uma canaleta de ventilação. Achou que poderia ser um local ideal para uma tocaia, e procurou por algo ao seu redor que pudesse ajudá-lo a retirar a grade dali.

As vozes pareciam estar se aproximando. Ouviu um grito de espanto. Rápido, rápido.

Sem pensar muito, tentou arrancar a grade sem usar ferramenta alguma. Ela saiu fácil, como se fosse de manteiga. Contiunuava sem entender nada, mas procurou não pensar muito a respeito. Se esgueirou ali, encostando a grade de volta ao fazê-lo.

Se arrastou pelo estreito espaço, até ficar suficientemente escondido nas sombras dali. A perna latejava, sua cabeça também.

As vozes estavam se aproximando. Disso tinha certeza.

Lentamente, puxou o carregador da escopeta e esperou. "Onde estão eles? Zalinski! Neumann!"

Cada vez mais perto agora. Passos.

A porta do escritório se abriu. Segurando a respiração, apontou a arma para a entrada da canaleta.

Mas não pôde vencer o negrume que se apoderou de seus olhos. Sua mente desligou.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Uáuaááuáuááaaa....Improductibilidadis est.



Sim, o tempo voa enquanto estamos nos divertindo. Ou não. Por mais que tentasse ser produtivo neste fim de semana, não obtive muito sucesso, pelo menos não na praia desenhística em si. Tem dias que são muito estranhos, parece que você simplesmente se esqueceu como é que faz. E ontem foi terrível; nao consegui nem esboçar um ovo.

Enfim, felizmente nem tudo foram sombras na folga semanal remunerada. Felizmente, do outro lado, o musical, realizei mais uma pancada de semi-músicas no improviso do decorrer das horas ingratas em que não fui socorrido pela agente inspiradora de realizações grafitistícas e/ou nanquinzistícas em que somos tentados a executar enquanto estamos vendo os navios inexistentes passando repletos de ninguéns ao nosso redor, de sorte esta que ainda temos outras coisas com o que nos entreter e/ou torturar vizinhos, familiares e quejandos; há que se contribuir para o mal-estar a nós propagado em estas horas, temos que, enfim, causar mais infortúnio do que nos afligem, temos que tentar executar, ainda que de maneira semi-satisfatória a execução de obras nada acústicas em instrumentos nada acústicos e....

Céus, que verborragia é esta. E olha que nem comprei a lata cafeinada de refresco de guaraná gaseificado que é nos ofertada em todos os supermercados existentes por aí nesta manhã matinal d'hoje. Que seria de mim se o tivesse feito, não saberia dizer. Sei que de qualquer maneira estou aqui a digitar um milhão de palavras com a grafia incorrecta enquanto escrevo isto tudo, e estou fazendo-o muito rapidamente, tal qual tivesse ingerido muito e muitos Red Bulls. Estranho, muito estranho. Deveria estar em uma marcha bem mais lenta, tendo em vista a data em ocasião. Mas, como já diz o paradoxo de Murphy, "Se a lei de Murphy pode dar errado, dará."

Enfim, como ia dizendo, embora nada consegui fazer sobre os papéis, muito consegui fazer sobre as seis cordas de Cremilda, esta menina que insiste em machucar as pontas de meus dedos. Alie-se a isto um Loop Station e uma ME-50 e você sentirá o tanto que meus dedos estão reclamando em esta manhã em particular. Não, não cheguei ao ponto de imitar Paul, o McCartney, após a faixa "Helter Skelter"; não obtive bolhas em meus dedos, mas consegui uma cãibra no "músculo pestaneiro" da mão esquerda, e várias dores no ombro esquerdo, que já estava lenhado desde a quinta feira à noite. Consegui lenhá-lo mais ainda com o peso de Cremilda. Ai ai, como se diz, "Sofra pela arte, fedaputa."

Enfim, eu estaria deveras carrancudo se não tivesse pelo menos conseguido divertir-me com minhas viagens sônicas. Acho que devo ter irritado deveras o alemão de araque que reside na casa ao lado, mas não poderia me importar menos. Sinto-me com remorso de não ter obtido sucesso quanto à tarefa de fazer uma tira por semana, mas enfim, ontem tudo deu muito errado quanto à isso. Às vezes, é necessário saber quando desistir. Após rasgar umas 2 folhas, eu soube que era a hora. O que não me impede de sentir que falta algo hoje.

Outras coisas que foram assaz desapontadoras se resumiram à tentativa frustrada de assistir dois clássicos da filmografia de Stanley Kubrick, sendo obrigado a não o fazê-lo devido à economia porca da revista Veja, que incluiu seu acrevo de filmes em promoção em embalagens mui econômicas, porém nada seguras para o não-arranhamento dos discos. A economia é realmente a base da porcaria, de fato. Deveras. Enfim.

Continuemos então. O que será que a semana nos reserva?

sexta-feira, 20 de março de 2009

Desconectado.

Céus. Vinha eu para cá, ouvindo minhas musiquinhas, pensando calmamente no assunto que trataria na coluna de hoje, tudo muito bom, tudo muito bem. Chegando aqui, dou de cara com o burburinho de milhões de vozes femininas ao mesmo tempo na área da cozinha deste lugar. É incrível como várias mulheres juntas falando são capazes de amplificar qualquer assunto. Estavam todas indignadíssimas falando de um assunto que, pelo que pude deduzir, foi televisionado recentemente - algo como uma autêntica atrocidade, uma mulher de sei lá onde que torturava o filho de outra, uma era prostituta, catava tal infante pelo pé e soltava ao chão, blah blah blah.

Atrocidade? Sim, deveras. Uma barbaridade.

Uma das indignadas do recinto falou, "não sei porque assisto isso, é um sensacionalismo, uma barbaridade televisionarem isso, etc." De fato. Bem sei que os meios que comunicação estão repletos destas atrocidades, e quanto mais avançamos no tempo, mais sangrentas as notícias se tornam, mais indecentes são as notícias exibidas, etc etc.

Não sei se estarei sendo cínico, indiferente, insensível, sei lá - se afirmar que tenho a solução prática para tal coisa: Não assistir. Já fazem anos que desisti de tentar ver jornais, assistir à televisão normal. No máximo, vejo um ou outro seriado ou algum filme. De preferência em algum canal que NÃO tenha propagandas, e que NÃO seja dublado.

Me fartei disto tudo. Já sou Noiado o suficiente para ficar me indignando com os atos idiotas e vis de outras pessoas. O cerumano(homenagem aos brilhantes estudantes que prestaram o ENEM) é imbecil por natureza, é ruim por natureza, comete os atos mais condenáveis de todos os seres vivos que existem neste glóbulo que flutua no espaço sideral. Não me excluo deste rol, basta ser humano para ser uma atrocidade caminhante. Mas sei que existem milhares, milhões, bilhões de seres mais condenáveis por aí. Se quiser ter exemplos claros disto, assista ao jornal. Veja o BBB. Compre um destes "folhetins de el pueblito" que estão à venda em todos os lugares agora, pela módica quantia de 0,50 R$.

Eu, pelo meu lado, resolvi me desconectar disso tudo. De nada me adiantará ficar indignado com estas notícias, com estas imbecilidades que por aí reinam absolutas. De nada adiantará para o mundo, para a zoociedade em que vivo, que eu me estresse com estas notícias. Chega. Sei que muitos dos falsos-moralistas por aí fora, se lessem isto aqui, me acusariam de ser um cínico, um insensível, etcoetera. Fodam-se. O que estão eles fazendo para mudar a situação em si?

Sim, pode soar bem descrente isto tudo, bem indiferente, bem cínico. Mas estou ultimamente cada vez mais farto de tentar agradar a todos(tarefa inexequível), e nunca me agradar. Como diria Fernando, o Pessoa, em sua encarnação de Álvaro de Campos:

"Queriam-me casado, fútil quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que haveremos de ir juntos?
"

Enfim, eu adoro quando meus autores preferidos falam por mim.

Eita, eis que soou super-tensa esta nota do dia. Alguns devem estar pensando que estou em um de meus piores dias. Na verdade, não. O plano do dia era escrever sobre solos de guitarra, para vocês terem idéia. Mas, ao chegar aqui e ouvir o bafafá sobre a indecência televisionada, me senti obrigado a escrever sobre isto, deixando o outro tema para outro dia.

Sim, escrevo tudo isto de improviso, assim que chego aqui, portanto às vezes passo da conta e escrevo demais. Fui informado que a maioria das pessoas têm preguiça de ler tudo isto. Talvez seja por isso que se mantêm tão indiferentes....ou não né, quem sabe.

Enfim, bão fim de semana a todos que tiveram a paciência nesta tarefa hercúlea que é ler esta encyclopaedia de loucuras...

quinta-feira, 19 de março de 2009

Bloqueio.

Frio, frio.

Neve por todos os lados.

Ele caminhou até a janela. Evidentemente, não havia muito o que ser visto. Quase não era possível distinguir as formas dos pinheiros que circundavam a casa. A cabine. Frio, muito frio. Esfregou as mãos numa tentativa de restabelecer a circulação sanguínea ali. Por mais que tentasse, não conseguia afastar a dormência das pontas dos dedos. E tal dormência piorava ainda mais seu já abalado ânimo em escrever.

Olhou ao redor. Nada muito animador. Andou até a cozinha, pensando em fazer algo para comer, embora não tivesse o mínimo de fome. Apenas queria adiar mais um pouco a visão. Abriu a geladeira, latas, latas. Sopa. Atum. Sardinha. Ficou olhando e olhando, procurando alguma coisa que não estava ali. Apareceu-lhe na mente a pontinha de um pensamento. Afastou-o, fechou-o a ferros em algum outro canto de sua cabeça.

Fechou a geladeira com estrondo e impaciência. Doze passos. O quarto. Olhou ao redor, evitando passar a vista no canto esquerdo, perto da janela.

Nada ali também.

Dezesseis passos. A sala. Sabia que deveria economizar madeira, mas se agachou diante da lareira e fez uma pequena fogueira ali. Uma, duas, três, quatro achas e alguns gravetos, alguma serragem. Fogo. Procurou em seu bolso a cigarreira. Sabia que não o deveria fazê-lo, mas sentia vontade de se acabar um pouco mais.

Desde o derradeiro momento, havia se empenhado em ser estúpido. Acendeu o prego de caixão na chama que se formava e aspirou a fumaça. Sentou-se na poltrona solitária e olhou para o teto, resistindo bravamente à tentação de contar as tábuas do forro. Sim, ele já as havia contado algum outro dia, mas não se lembrava do resultado. Levantou-se, dez passos, bar, garrafa de gin. Tônica. Copo. Glug, glug, repita.

Lá fora o vento uivava. O que estava fazendo ali? O que estava tentando provar?

Levou a garrafa para a poltrona, mesmo sabendo que detestava o gosto daquela bebida pura. Não precisaria de gelo, já estava frio o suficiente.

Glug, glug.

Repita.

Jogou o toco do cigarro no fogo. Começou a sentir outra espécie de dormência pelo corpo. Ah, o álcool. Quem teria sido o primeiro ser humano a resolver beber? Quem teria sido o primeiro cara que percebeu o tanto que aquilo poderia ser tão divertido por vezes...e tão terrível depois? Enterrou a cabeça nas mãos. Todos haviam dito a ele, não faça isso. Não fique sozinho. Não numa hora dessas, ao menos. Não vá para as montanhas. Vá para o Caribe. Havaí.

Mas não. Canadá. Em algum lugar esquecido. Acesso impossível por carro. Alugue um snowmobile.

Glug, glug.

Repita.

Ele havia dito a seu editor, preciso de idéias novas. Preciso de mais tempo. Não estou em condições de pensar direito por aqui. Porque. Tenho vontade de matar alguém.

Não, não havia dito aquilo, mas o pensamento lhe ocorria sempre que pensava...nela, nele, no maravilhoso triângulo nada equilátero. Eu e ela, ela e ele.

Ela e ele.

Glug, glug.

Repita.

A onda já era inegável. O álcool corria descontrolado por todo seu corpo. Hi hi hi. Achava tudo engraçado, muito engraçado. Levantou-se, dez passos...mais um, dois. Tome mais um golinho, mais dois. Ha ha ha. Que engraçado ver que tudo gira. Tudo gira! Não preciso de ninguém, disse pra si mesmo com toda a convicção. Ninguém, ouviu sua vaca puta. Seu filho da puta. Seus miseráveis malditos. Nin-guémmmmm.

Doze passos, treze passos, quatorze, dezesseis. Não! Cadê o quinze? O quinze, como havia se esquecido logo dele, porra. Números eram tão legais. Menos quando impressos em um extrato bancário. Menos quando impressos em um relatório de divórcio. Ah, mas que diabo. Volte aqui, Bombay-Sapphire. Meu amigo, meu irmão!

Glug, glug, glug, glug, glug, glug.

Acho melhor não repetir.

Não agora.

Cambaleando pela cabine, foi impulsionado até o monstro. Até o mecanismo.





Tec, tec tec. Agora sim, estava pronto para escrever sua obra-prima. O livro que salvaria sua vida, salvaria sua carreira. O manuscrito que iria lhe render milhões. O livro que esfregaria na cara daquela vaca. Daquela puta, glug glug. Tec tec tec tec.

Plin!

Olhou para a folha de papel.

"Aquella vaca. Aqwuelas putya. vaik se fudre."

Ótimo. Já tenho o primeiro paragráfo, de minha obra prima. De minha salvação.

Glug.

Arremessou a garrafa na parede, obtendo mais um punhado de cacos ao redor do canto da máquina de escrever. Bateu a cabeça no teclado, incrementando ainda mais o texto ali existente.

Plin!

Não se importava com o tão ridículo estava. Chorou e chorou, se engasgando cada vez mais com aquilo tudo. Por um descuido, escorregou para o chão e caiu em cima da poça de álcool e cacos de vidro.

Ai!

Os cortes amenizaram um pouco da bebedeira. Pra quê. Levantou-se e observou sua mão, acompanhando o sangue que dali escorria. Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete passos. Porta. Banheiro. Álcool, desta vez iodado.

Aaaaaaaiiiiiiiiiii!!!!!!!

Olhou para o reflexo no espelho já trincado. Mais um soco o estilhaçou mais ainda.

Dez, doze, sei lá, passos. O quarto. Desabou sobre a cama, sentindo o quarto girar ao redor. Gira gira gira. Tudo gira.

Amanhã, disse ele. Amanhã será melhor. Amanhã, mentiu ele para ele. Amanhã.

quarta-feira, 18 de março de 2009

PXE.


-Boa noite, senhoras e senhores. Bem-vindos à Rádio PXE. Nesta noite teremos aqui no estúdio uma entrevista com um personagem muito peculiar, que atende pelo nome de Sr. Porca-russa. Ele vai nos dar diretrizes, visões sobre o assunto controverso sobre a presença de alienígenas em nossas escolas, ônibus e ambiente de trabalho. Boa noite, senhor Porca-russa.
-Bom dia.
-Er...O senhor escreveu um livreto sobre o assunto em questão, não é mesmo?
-Na verdade, eu apenas copiei tudo que os alienígenas em minha cabeça disseram que eu deveria escrever.
-Em sua cabeça? Quer dizer que o senhor crê que eles estejam em sua cabeça?
-Não creio, eu sei. E sei que eles estão em sua cabeça tambem, senhor Mitchell.
-Sei, sei. Então quer dizer que o senhor crê que eles estão entre nós de fato?
-Eles estão dentro de nós.
-Vejo aqui também que o senhor é um major reformado.
-Sim, passei por um processo intensivo de reformas internas para acomodar meus hóspedes interiores.
-Então o senhor também se interessa por design de interiores.
-Sim. Mas prefiro fazer design de protótipos mais avançados, como este modelo aqui de câmbio para automóveis, que pretendo vender no câmbio negro.
-Interessante. E os alienígenas que indicaram a você esta sua missão, de escrever este livro sobre as flores campestres interiores e a confecção de alavancas de câmbio, entitulado O Papa?
-Sim. Algum dia pretendo escrever sobre o sumo pontífice também. Já tenho até o título de tal obra, algo como Apocalypse Agora.
-
Entendo. O senhor também afirma em seu livro já ter visto um ornitorrinco.
-Sim. Ele era deveras carinhoso. Sinto a falta dele...
-Er, mudemos de assunto. Falemos de camelos.
-Sim, tenho ainda uns doze aqui no bolso.
-Em seu bolso?
-Sim, veja. Diz aqui na caixa que é um autêntico Camel. Se bem que isto aqui estaria mais correctamente denominado Dromedary.
-
Sim. Entendo seu ponto de vista.
-
Não, só vendo a prestações o livro.
-Isto tudo foram os alienígenas que mandaram o senhor dizer?
-Não, eles me mandaram escrever a respeito. Principalmente a respeito do senhor.
-De mim?
-Sim.
-Não.
-Sim.
-Sim.
-Não.
-Talvez.
-É. Enfim. Sei que o senhor diz que sua mãe abusou do senhor quando o senhor tinha a tenra idade de 120 anos.
-Não! Como sabe disso? É meu maior segredo!
-Não há segredo. Basta ler na sua testa, está escrito, "Minha mãe abusou de mim quando tinha 120 anos"
-Eu sabia que deveria ter comprado um diário de gente.
-E eu sabia disto. Sei tudo a seu respeito!
-Não sabes nada!
-Sim, eu sei. Sei que nada sabes.
-Isto todos o sabem.
-Não, pois se não sabem nada, como irão saber que nada sabem?
-Sabendo, oras.
-Mas se não sabem que sabem, como irão saber que não sabem?
-Pare de se repetir, seu energúmeno.
-O senhor me tenha o devido respeito, rapá! Ou vai querer cair pra dentro?
-Não, prefiro cair pra fora, lá o clima está mais ameno.
-Lá fora?
-Sim.
-Deveríamos ir para lá então.
-Não. Não desejo ir para lugar algum com alguém que tem alienígenas na cabeça e esta frase escrita com caneta retroprojetor na testa.
-Atesto o contrário.
-Atestas?
-Ateu.
-Sim. Isto afirmo que sou.
-Eu sabia.
-Se sabia, porque perguntou?
-Porque não tinha certeza.
-Enfim. Voltemos aos alienígenas.
-Sim, sim.
-O senhor afirma em seu livro que a alvanca de câmbio foi projetada pelo senhor quando o senhor se projetava pela janela a 200 milhas por hora, não é mesmo?
-Sim.
-Então, qual é a capital da Abissínia?
-Estou abismado com esta pergunta.
-Não se reprima. Fale-me tudo. Estamos no ar.
-No ar? Mas porque logo no ar? Está tão poluído este ar!
-Sim. Mas isto pode ser resolvido com uma descarga de bom-ar.
(sssssssssssssssss)
-Meus olhos! Seu cretino!
-Não me grite!
-Que gente má!
-Isto. Façamos uma autêntica Quinoterapia. É muito mais salutar que algo parecido com esta sonoridade, porém dotado de elementos nada saudáveis ao corpo humano, este desconhecido.
-Mas eu o conheço tão bem!
-Nunca imaginei isto.
-Já imaginava.
-Pare de fingir que me conhece! O senhor não sabe de nada.
-Já falamos sobre isto.
-É verdade. E agora, para algo completamente diferente, café.
-Cafééééééééééééééééééééééééééé!
-Sim, tome.
(splash!)
-
Meus olhos! Pare com isto!
-Sim, temo que nosso tempo se esgotou.
-Eu sabia o tempo todo!
-Sabia nada.
-Nada?
-Sei nadar, o senhor não.
-Droga.
-Só tenho anfetaminas.
-Percebo, pelo seu estado irrequieto.
-
Sim, eis aqui algumas bolinhas.
-De gude?
-Não, de grude.
-Desgruda.
-Sua peste. Enfim, volte ao assunto chave!
-Sim. Estão me fechando a sete chaves aqui, e estão gentilmente me embalando com esta camisa tão na moda nestes estabelecimentos, a camisa-de-força.
-Força aí irmão.
-Apoiado! Não, não quero esta injeção intravenosa!
-É tarde. Nossos ouvintes anseiam dormir.

(SOC! POU! CRASH!)

-ZZZZZZzzzZZZZzzzzzZZZZZZZZZzzzzzz......

(O carcereiro se levanta, carregando o corpo inanimado do senhor Porca-russa, murmurando entre dentes:
-Odeio trabalhar em um hospício.
Deposita o corpo em uma maca, amarra-o bem apertado e sai arrastando a carga pelos corredores infectos da instituição. As cortinas se abaixam. Fim.)

terça-feira, 17 de março de 2009

I'm singin' in the rain!...

Por vezes, gostaria realmente de que alguém estivesse me filmando. Certos momentos de minha vida serviriam de comédia muito mais engraçada que qualquer seriado enlatado existente por aí...Presumo que assim o seja com a maioria das pessoas também; certos momentos são tão rídiculos que se fossem apresentados em rede televisiva, geraria boa audiência. Ou não(maldita seja esta frase), uma vez que parece-me que a audiência dos canais abertos está se tornando cada vez mais e mais acéfala, por assim dizer. Enfim, foda-se, não é sobre isto que estou a discorrer hoje.

Bem, ontem a chuva ameaçou, ameaçou e ameaçou durante todo o decorrer lento do dia, típico de segundas feiras em geral. Mas ela não caiu durante a manhã...nem durante a tarde...então, fui-me embora do serviço munido de meu infalível guarda chuva tamanho gigante, pois minha jornada de trabalho ainda não havia terminado; tinha que ainda visitar meu sobrinho tordo, anteriormente conhecido com a curiosa denominação de "partidário da juventude nazi-fascista mineira mirim".

Ao chegar lá, entrando no prédio, senti um par de pingos de chuva em meu braço. É, ela tardou mas não falhou. Então fiquei a observar o lado de fora da janela do imponente apartamento em que residem os avós de meu sobrinho; mesmo assim a dita chuva parecia que não iria dar as caras e ir-se embora. Conversa vem, conversa vai, quitutes foram devorados, sucos foram ingeridos - aquilo é qualquer coisa "menas" aula de desenho - e eis que faltando 15 minutos para as 9, hora esta que realmente se efetua a alforria de meus grilhões trabalhistas, a borrasca resolveu assolar a cidade.

Clássico. Ao chegar na portaria do prédio, o porteiro me olhou com aquela cara de "você está certo disso?" ao abrir a porta electrônica. Fui efusivamente saudado por uma rajada de vento e água, e olhei estupefacto para o espetáculo Dantesco diante de mim: nem mesmo os tradicionais transsexuais daquelas paragens(não estamos falando dos agentes da BHTRANStorno) estavam à vista. Os ventos e a água realmente eram assustadores.

Bem. Eu tinha a opção de ficar ali aguardando a chuva amainar, perder meu busão e ter que esperar mais de hora para chegar em casa, ou...

Respirei fundo, abri o fiel guarda chuva, mesmo tendo a certeza que ele não me seria de grande valia, e me adentrei na tempestade.

Logo que pus os pés pra fora, fui devidamente encharcado pela água gelada. Ao chegar na rua, fiquei horrorizado com o volume de água que descia a avenida Afonso Pena. Aquilo estava mais para rio que avenida. Creio que em dias de fúria mais intensa, típicos de minha pessoa por estes dias, eu teria berrado de ódio, esperneado feito menino birrento, quebrado algum carro, etcoetera. Mas...por algum mistério de minha índole, esta ilustre desconhecida, olhei aquela água toda descendo, e verificando que por mais que esperneasse eu NÃO conseguiria me manter seco, resolvi tornar à infância. Quando muleque, uma enxurrada como aquele seria diversão garantida, e uma próvavel gripe subsequente. Enfim.

Fui pulando as partes mais torrenciais da enxurrada, nem me importanto em atolar meus pés noutras partes nem tão abissais, e comecei até a entoar cânticos de louvor à tempestade, como este crássico que entitula este blahblahblah crônico(ou crônica, se assim o quiserem). Fiquei rindo horrores de mim mesmo. Eu era a única alma viva que se encontrava naquela avenida àquela hora. Nem mesmo os passeios - a calçada para os chatos - estavam isentos do ribeirão intermitente que tomou conta daquela parte da cidade; como é de praxe nesta cidade assolada pela sua população de frangos que jogam todo e qualquer lixinho sem (aparente)importância no chão e nao nas lixeiras, todos os bueiros estavam devidamente entupidos e a água jorrava na altura de minha cintura quando encontrava um obstáculo.

Cheguei afinal ao ponto de ônibus, mais encharcado que nunca, mas nem me importando. Continuei cantando desafinadamente, maravilhado pela possibildade de fazê-lo sem olhares jocosos de ninguém, eis que o único louco a enfrentar aquela tempestade àquela hora fui eu. Depois de cantar e cantar, olhei para trás e vi a figura solitária de um porteiro a me olhar com curiosidade. Imagino que ele deve ter se divertido horrores com meu espetáculo.

Momentos mais tarde, quando a coisa já havia perdido muito de sua força primitiva, eis que chegou meu autocarro, e subi a bordo, sendo acompanhado unicamente do motorista, do trocador e de um outro sujeito que se encontrava encolhido em um canto, encharcado até os ossos, aparentemente. Tinha desolador aspecto; presumo que não havia levado a coisa na brincadeira como eu...Enfim, sentei-me e verifiquei que minha mochila havia protegido devidamente meu aparato sonoro, o que me gerou satisfação. Pus o som na caixa e deslizei tranquilamente para casa, onde me sequei devidamente - até minha roupa de baixo se encharcou na desventura - e tomei um banho, indo dormir tranquilamente mais tarde.

Creio que se assistisse ao vídeo deste episódio, eu iria rir-me deveras; como não posso fazê-lo, ao menos posso me contentar com a memória do episódio, que no mínimo gerou um bom causo para se contar em eventuais visitas aos bares, e aproveitando a deixa, deixo registrado aqui por escrito o relato da coisa, para quem que se interesse pelos devaneios deste Noiado possa se divertir.

Enfim, assim o é, assim será. Queria que a vida estivesse mais plena de eventos como este...

segunda-feira, 16 de março de 2009

Filosofia barata, por zero reais.

Nussa. Às vezes, parece que o tempo está voando mesmo; é segunda novamente, e parece que escrevi o texto da outra segunda ontem. Isto não fez muito sentido por escrito. Enfim, o tempo passa. E esta segunda começou agressiva, alts paus na rede fudida daqui me atrasaram bastante. Coisas de segundas-feiras, creio eu...

Em este semana-fim cheguei a algumas conclusões que considerei válidas, ao menos para amenizar um pouco as agruras desta vida muderna e chata que tem me presenteado com vários contratempos. Um ex-amigo meu - desaparecido desde 2002, creio eu que tombado devido aos deveres do matrimônio e quejandos - sempre se ria de mim quando eu chegava nas segundas feiras aqui neste escrotório com estas palavras: "Neste fim de semana cheguei à seguinte conclusão..." Sou de facto um filósofo falido. Tudo bem que naquela época a minha conclusão mais frequente era do naipe de "Beber demais faz muito, MUITO mal mesmo." e coisas do gênero. Enfim.

Algumas das conclusões que cheguei neste finds se remetem às minhas ditas afinidades "malditas", este apreço por coisas que não têm valor comercial e/ou financeiro. Na música, por exemplo, conforme narrei algum tempo atrás, havia tido a fissura mor de adquirir um pedarrrrr da Boss, este denominado Loop Station, RC-2. Após gastar o que não devia com esta coisa, achei que tinha comprado um belo dum elefante branco, pois não consegui usá-lo direito, por culpa de meu ridículo conhecimento de divisões de compassos e ritmo destreinado. Isto havia me deixado deveras contrariado, pois este treco é REALMENTE caro. Tanto é que nem ao menos terminei de pagar ainda....

Porém, no sábado à noite, tirei-o da caixa e resolvi tentar mais uma vez. Após alguns minutos, fiquei satisfeitíssimo, pois consegui fazer algumas bobagens funcionar com meu escasso conhecimento téorico de ritmo e afins. O treco realmente te abre caminho para fazer coisas bem legais, uma vez que você praticamente consegue fazer um som muito mais rico. É como se você nao estivesse tocando sozinho, mas sim acompanhado de uma porção de outros guitarristas. Juntamente com minha ME-50, o pedalzinho carissimo foi uma excelente aquisição afinal de contas.

A outra conclusão veio da parte desenhística. Embarquei ontem na minha tarefa dominical de desenhar alguma tira. Após aquelas duas tentativas passadas de fazer o treco no lápis, vi que não daria certo continuar. Enfim, de volta à tinta. Tive medo de tornar a isto, não sei bem porque. E após ter resistido à encheção de saco alheia por parte de alguém, refiz mais esta tira.








Sim, estou refazendo as antigas pela simples razão que quero fazê-lo, uma vez que quero melhorar as velhas e acrescentar elementos novos. E existe uma sequência natural, uma ordem na dita "história" da tira. Material novo virá, mas em seu devido tempo. Estou apenas me desenferrujando...E por mais que me zoem, vou respeitar meu ritmo. Afinal de contas estou fazendo isto apenas para mim mesmo.


Enfim, outra conclusão que cheguei é que de fato a cafetina sabe me agradar quando cumpro a minha dita obrigação. Apesar de não ter ficado 100% satisfeito com o resultado da dita(it's the Buriol way of life), não obstante me senti bem, com o sentimento de cumprimento do dever, por aí. Algo do gênero. Tipo.

Creio que minha loucura está a criar asas estes dias também, mas tá valendo. Falo sozinho mas não o deixarei de fazer, pelo menos não por hora.

"Build it right up,
knock it right down.
When the light finds me,
I'm nowhere to be found.
Catch my, drift away instead,
Let's see what the road holds up ahead."

--Swervedriver, Pile Up.

sexta-feira, 13 de março de 2009

4002.


"Transmission 4001.
Are you still there, Sam?
It's been five years since contact."

--Adam Franklin, Walking on Heaven's Foothills.


Por mais que tentasse lembrar, não conseguia.

Após tanto tempo à deriva naquela imensidão de vazio, tudo que ele sabia é que nada aparentava ser o que era. Tanto tempo tinha se passado...dias, meses, anos...não poderia dizer. Não haviam mais parâmetros para se mensurar o tempo. Não ali.

Desde que havia sido vítima daquele acidente, tudo que ele sabia é que muito tempo havia se passado. Isso ele sabia. Mas...o que mais?

"Eu deveria estar morto", ele pensava. A lógica indicava que sim. Mas o que era a lógica em um lugar como aquele? Não significava nada. Se fosse pensar em termos físicos, ele estava em um ambiente onde não diminuiria sua velocidade, a não ser que encontrasse um obstáculo no caminho. "Que caminho?", pensou novamente.

Estaria indo em linha reta....velocidade constante...nenhum atrito. O vácuo. Nenhum oxigênio. O que tinha em seu traje já deveria ter acabado há muito tempo. "Estou morto", ele pensou novamente. Mesmo assim, não se sentia morto.

Estava mais vivo que nunca, a seu ver.

Mais uma vez tentou se lembrar do acidente...A estação. Orientações. A saída da escotilha...alguém gritando seu nome no rádio...Mais nada.

Nada. Por mais que tentasse, não saberia dizer como tinha se perdido daquela forma. "Devo estar morto," sua mente prosseguiu, "isto deve ser a morte." Ao seu redor, a paisagem parecia ser sempre a mesma. Estrelas. Milhares, incontáveis estrelas. Uma memória passada o atingiu...costumava subir ao telhado de sua casa quando era criança para ver o céu. Contar estrelas cadentes. Achava que era sua missão na vida, perseguir aquele sonho, viajar para aquela imensidão acima da Terra, acima do céu.

Ali estava ele.

Por mais ilógico que pudesse ser, parecia que estava ainda no encalço daquilo tudo. Olhou ao redor novamente, procurando sua estrela-guia, aquela que chamara sua atenção desde que estivera em marcha para o desconhecido...Ali estava ela. Não falhava nunca. Era a única que parecia estar se aproximando. Era seu destino.

Seria isto certo mesmo? Por vezes, seu lado racional ainda tentava prevalescer. Inútil.

Nada faria sentido, nada poderia ser racionalizado naquela jornada.

"Mesmo assim," sua voz interna prosseguiu, "devo estar realmente morto. Não comi nada desde que aconteceu a coisa. Não bebi nenhuma gota de qualquer líquido."

Sim. Mas não sentira fome. Não sentia sede. Memórias o assolaram novamente. Sua casa...seus estudos...a academia...seus filhos.

Onde estariam seus filhos? Sua esposa? Seus pais?

Não poderia responder a nada disso. Nem saberia. Olhou novamente para a estrela. Sua única certeza...era que estava indo em sua direção. Estaria mesmo? O que poderia garantir isto a ele? Como poderia afirmar com certeza isto?

Calou-se mentalmente. De nada adiantava aquilo. Tinha que continuar seu caminho. Não havia nada a ser feito. Nenhum racionalismo poderia mudar nada em sua situação. Lembrou-se de situações anteriores àquela....achou plausível que deveria estar revoltado, cheio de raiva.

Mas não sentia nada. Não adiantaria nada.

Fixou a vista em sua estrela.

"Um dia, chegarei ali."

quinta-feira, 12 de março de 2009

II.


" 'You look like you've been losing sleep',
said a stranger on a train,
I fixed him with an ice cold stare
and said, 'I've been having those dreams again' "

---Swervedriver, Last train to Satansville.



Sangue.

Gosto de sangue. Na boca...nos dentes. E o cheiro...no ar, tudo recendia àquilo. Abri os olhos...um céu, azul. Fumaça.

O que havia acontecido? Tentei lembrar de algo, mas a dor de cabeça era mais forte. E o gosto de sangue na boca mesclado ao cheiro da fumaça confundia-me. Nesta hora senti as dores espalhadas pelo corpo também. Lentamente, ergui a cabeça e olhei ao redor.

Uma paisagem árida...cactos e coisas do gênero. A dor pipocou em minha cabeça e ao longo de todo meu surrado corpo como um milhão de alfinetes. Fechei os olhos e segurei minha cabeça com as mãos. Aaaahhhhhhh, era tudo que eu podia pensar.

Após alguns minutos de lamentação merecida, a dor diminuiu de intensidade o suficiente para que eu pudesse novamente tentar abrir os olhos e descobrir mais alguma coisa a respeito do que estava acontecendo.

Algumas dezenas de metros à minha frente, estavam os escombros fumegantes de....coisas que pareciam algum dia ter sido veículos automotores. As labaredas lambiam os ares, levantando fagulhas e carregando fuligem. O acidente parecia ter sido daqueles horrorosos, cinematográficos. No estado em que as carcaças se encontravam, não era possível identificar modelos, marcas.

Sei que a coisa parecia ter sido feia. Muito. Tentei pôr-me de pé; após alguns dolorosos momentos, consegui. Olhei ao meu redor novamente. Estava num local completamente deserto, literal e figurativamente. A estrada em que os carros estavam se estendia até perder de vista.

Onde diabos eu estava? Porque ali eu estava?

Arrastei-me na direção dos escombros, apenas para estacar após alguns passos. Um dos tanques de combustível das ferragens resolveu explodir bem naquele momento, com tal violência que a onda da explosão derrubou-me. Ai, ai, ai ai aiiiiii. Maldição.

Após o susto ter passado, senti uma nova dor...em minha perna direita. Ergui a cabeça para surpreender-me com um pedaço fumegante de ferragem cravado ali. Puta que o pariu, foi tudo que eu consegui pensar. Senti tamanha indignação com o que estava acontecendo, que sem pensar, arranquei a coisa dali, não sem me arrepender instantaneamente. O sangue brotou profusamente.

Arranquei rapidamente uma manga de minha esfrangalhada camisa e tentei estacar a hemorragia. A confusão mental ainda era reinante, mas por mais que tentasse, não conseguia me lembrar o que estava fazendo ali. Como havia chegado ali. Rangendo meus dentes, olhei para a frente e vi...um outro corpo mais adiante, estendido no chão.

Gritei por ajuda. Nada. Berrei novamente, mas o corpo continuou estático. Com a maré de azar que estava experimentando, não duvidei que fosse apenas um banquete para os urubus que já sobrevoavam o local, a muitos e muitos metros de altura. Olhei para minha perna, mas fechei os olhos quase que de imediato. O trapo esva empapado de sangue e a coisa parecia não querer parar de sair.

Fechei os olhos forçadamente, até doer. Que bela maneira de se morrer. Tentei mais uma vez me lembrar de alguma coisa, mas nada me veio à cabeça, a não ser uma vaga memória de estar dirigindo um carro....pegar em uma arma vazia....coisas difusas e confusas.

Abri os olhos e olhei para o corpo, que não estava mais lá.

Arregalei os olhos, mas tudo que pude sentir foi um impacto em minha nuca.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Lost highway.

"Lately I've been so alone, wired out
but I'm not stoned.
I just need the music playing, the music
playing on."

--Urge Overkill, Digital Black Epilogue.


Years and years have passed. Since then, I knew that it was going nowhere fast, steadily shifting my direction homeward. Even though I knew for sure there was nowhere I could actually call home, per se. How long have I been wandering around, I could not say.

One day, many years ago, I've realized I was actually a prisoner of my ways, of my lack of objective. I'd wasted many endless nights trying to figure a way out. It took me about forty years to realize that I could not escape it. I could not get away from...myself.

So I hit the road. Packed a few things and took off. No good-byes were needed. No citations to quote. I've told no one about it, I had nothing to worry about. Nothing to leave behind. No strings attached.

That was about ten years ago. And I'm yet to see what I came to see out here.

What is it? I don't know.

I actually thought I knew. I'd come across this thing and I would say, "That's it!" However, I'm yet to see such a thing. At least I've stopped trying to figure out what it would be, a person, a job, a place, whatever.

I just don't know. At all. But I no longer care. It can't be helped. Not that way.

All I know is that I'm on a search of this thing, this whatever. The thing that would turn my life around. But a man can pretend as hard as he'd like, he can deceive everyone else, but he knows he can't lie to himself. He can pretend not to know.

But I always knew. Even though I tried to mask it, to bury it, to hide it away or something, I knew it.

I'd have to see it for myself.

So I'm on this road. Where does it lead, I cannot say for sure.

All I know is that I need to keep going. I can't get away from it. Can't swerve out of it. And as the day fades, I know that this is what I need to do.

I used to get mad at it sometimes. I've always felt lost, and I'd get so frustrated I'd become this big, sad old asshole which no one would tolerate. People would get sick of me, and I'd become mad at them for their blindness, so to speak.

All that rage, that angst, would lead me nowhere. So I took off. It was for the best, in the end. In the long run, it made some sense.

I just know that I'm yet to see it.

What is it? Dunno.

All I know is that this is what I must do.

I need to keep going.

terça-feira, 10 de março de 2009

Mau, mal.

É complicado por vezes ter que lidar com você mesmo. O dia de ontem foi-me extremamente miserável, e sua miséria se extendeu até o presente mokmento. Dias assim, nada funciona muito bem. E é sabido que a raiva pode impulsionar certas coisas, mas acredito que, normalmente, a raiva so é combustível para atitudes erradas, decisões tortas e comentários que poderiam ter sido dispensados. Geralmente acontece assim com o clã dos Burian; a raiva é o único sentimento que estes indivíduos sabem expressar com plena ênfase, e como era de se esperar, só sai merda disso tudo. São os piores dias para se tentar fazer qualquer coisa criativa.

Não sei bem o que nos acontece, mas sei que a coisa quando acomete-nos, é séria. E agravada se tratada com desdém. Como tem-me acontecido muito por estes últimos dias.

Não queria eu tornar isto aqui um verdadeiro poço de amargura, um "diário emo", como foi me dito previamente em momentos anteriores, mas como porraqui só passa vento em estes derradeiros dias, talvez a torrente de lamentações possa ser escrita indiscriminadamente, uma vez que aqui nada se há, nada se encontra. O que conta é tornar-se sublimado, tornar-se etérea esta coisa frustrante que é o sentimento de ficar puto e estar sempre, SEMPRE errado.

Porque assim o é.

Tinha uma teoria, evidentemente errada, que alguns dos psicopatas que por aí existem seriam criaturas como este que escreve ao vento: bonzinhos eternos, mas que no fundo eram seres rancorosos, que juntavam suas raivas por dentro, incapazes de reagir. Até que um belo dia, esta panela de pressão resolve explodir e tal pessoa resolve aniquilar a encheção de saco bípede dotada de polegares opositores à sua frente. E como acontece com várias práticas sempre adiadas, o gosto pela coisa começa a se manifestar. E como muitos já disseram, a coisa vai se tornando cada vez mais e mais fácil.

Sim. um devaneio rídiculo. Fictício. Enfim. Admito que por vezes eu gostaria de deixar acontecer pra ver no que daria, especialmente em dias como estes.

"I woke the same
As every other day
Except a voice was
in my head,

It said seize the day,
Pull the trigger,
Drop the blade,
And watch the rolling heads."

--Soundgarden, The day I tried to live.

Ah, eu adoro quando outras formas de entretenimento traduzem perfeitamente o que estou sentindo. Se algum dia alguém me ver ouvindo esta música, pode saber: ela é reservada para dias de mais intensa fúria. Melhor deixar a raivinha se esvair.

Sim, eu tenho noção do rídiculo. É mais ou menos como me porto 97% do tempo.

Enfim, hoje não sai nada de produtivo mesmo. A raiva só serve para ser combustível de coisas erradas, como volto a afirmar.

Cri cri cri cri cri.


segunda-feira, 9 de março de 2009

Fundos olhos, profundo insone. Difuso.

Ah(ou aaaaarrrgghhhh), mais uma segunda-feira. Dia incrível este, pois creio que 90% das pessoas pensam a mesma coisa ao escutar a sinfonia de seus despertadores: "Nãããããããooooo!!!". Muitos de nós simplesmente apertam o mágico botão, "soneca", e ficam mais 10, 15, 20, 30 ou mais minutos a pestanejar e...O QUÊ? Já é tarde assim?? E saem às carreiras em busca do tempo perdido.

Eu, como não sou nada além de um reles ser humano como qualquer outro, geralmente penso algo do gênero quando escuto o tom monócordio do aparelho interruptor de sonhos. Mas geralmente, não caio na tentação de apertar o botão extensor do período de sonolência matinal, mesmo porque meu despertador não passa de uma régua com o ego inflado, cheia de calculadoras, tempo do mundo e quejandos, mas que para seu desespero enquanto "glorified ruler", somente uso a função despertador. Não me importo com o ego de cousas inanimadas, por assim dizer. Tal botão de fato existe na dita, mas não tenho paciência de procurá-lo nunca, pois perderia tanto tempo tentando caçar tal coisa naquele típico estado grogue em que geralmente me encontro a tal hora, que quando conseguisse localizá-lo já estaria mais que acordado e/ou já teriam passado mais de vinte minutos. Enfim.

Hoje, ou melhor, ontem, foi um dia, ou será melhor dizer, noite, especial. Após ter passado as noites de sexta e sábado indo ter aos braços de Orfeu lá pelas 9 da noite, devido ao tédio e estado de humor não dos mais agradáveis, eis que ontem, devido à atividades desenhísitcas ou para-desenhistícas, fui obrigado a atrasar e muito, meu horário de dormida. Lá pelas 11 e meia da noite, momento este em que decidi deixar para escanear a custosa tira dominical na data d'hoje pela manhã, e dirigi-me para meu leito com a plena certeza que, devido ao meu esteado de cansaço mortal que me encontrava, que iria encostar e dormir profundamente.

Ou não.

Malditas sejam estas palavras. Como é de praxe da lei que a tudo rege no universo - a de Murphy - não obstante meu estado deplóravel de exaustão, o sono não veio, de forma alguma. Várias vezes na vida me pergunto se não perdemos tempo demais dormindo, se não poderíamos usar tal tempo de forma mais construtiva mas...Em noites como ontem, tais aspirações passavam longe de minha exausta cabeça. Eu só queria dormir, e muito.

Enfim, rola pra cá, rola pra lá, ajeita travesseiros, ajeita cobertor e...nada. Horas insones costumam ser as mais nefastas para pessoas que ficam horas e horas pensando(noiando) sobre assuntos inúteis diversos, e meu caso não é exceção. As coisas mais fudidas da semana, do mês, do ano, do etcoetera passam muitas e muitas vezes por minha cabeça. Geralmente, quando tenho surtos de insônia, no dia seguinte fico me recriminando por não ter me levantado e feito algo produtivo com este tempo, assim com postulado naquelas reflexões sobre a perda de tempo ao dormir. Rolei, rolei e rolei...E enfim, liguei o foda-se e levantei-me.

Escaneei a tal tira, dei uma tratadinha e letrei-a no fotochoppe. Ao término de tais tarefas, ainda não me sentia com sono algum, então desci para fazer algum lanchinho qualquer, subi novamente, escovei os 'dentas' e deitei-me novamente. Desta vez, nem vi a hora que apaguei. Já era perto de 2 da manhã. Hoje, encontro-me com olheira mais profundas que o usual, e estou a entornar litros e litros de cafééééééééé goela abaixo, mas sinto que foi melhor ter-me alforriado da escravatura da insônia improdutiva. Ao menos não tive que fazer a indigna tarefa de processar a tira aqui no escrotório, pois sempre que o faço, os olhares perscrutadores de meus chafes, por assim dizer, condenam-me mentalmente, e mais tarde verbalmente na rede de intrigas comum a todas as aglomerações do cerumano.

Enfim, não obstante isto, devo parar por aqui, pois estou a divagar nisto tempo demais, e não é somente as 'artes' manuais que são proscritas porraqui, mas também as escritas. Posto a segui a tal coisa que me tomou tanto tempo no domingo, que lamento estar um bocado "suja", devido a minha insistência com a finalização a lápis. Tentativa errada, por assim o dizer. Hay que tornar a la tinta, caramba!

Faz-se homenagem a nossa temperatura reinante nesta roça grande e semi-asfaltada.










sexta-feira, 6 de março de 2009

Carta abrida a um devogado.

Prezado Dr. Tie,

Lamento informar que ontem não foi possível comparecer a nosso encontro previamente marcado, para discutirmos o andamento do processo. De fato, como de praxe, fui obrigado a ficar acordado até tarde ante-ontem escutando a maravilhosa sinfonia que meu primo, Mortimer, obriga-me a "apreciar" todas as noites, quando retorna do bar ainda mais bêbado que de costume, e embarca no estudo da sinfonia nada sinfônica de sua gaita de foles. Maldito sejam esses escoceses malucos. Para piorar, junte a isto o fato que meu vizinho, Herr Kraut ficou o tempo todo xingando Mortimer em alemão, aos berros. Horas depois, quando Mortimer finalmente tombou inconsciente por terra, achei que poderia dormir sossegado ao menos por umas horinhas, mas os dobermanns de Herr Kraut houveram por bem realizarem sua própria sinfonia de uivos e latidos incessantes. Por incrível que pareça, nestas horas o pulha permanece em silêncio e deixa que seus cães dos infernos atormentem a todos; agora, se voce fizer um ruído, por menor que seja, o dito levanta-se e posta-se à janela em sua melhor pose de Hitler e recomeça a querer ensinar o ABC dos palavrões em alemão.

V. Sa. bem sabe de tudo isto, eis que a audiência adiada d'ontem era acerca do processo que tenciono mover contra tal criatura abominável. O hediondo senhor ainda insiste em deixar suas plantas odiosas a crescer por cima de minha propriedade, como se fosse um ato espontâneo de sabotagem insensata contra minha pessoa. Sim, bem sei que tal indivíduo começou a esbravejar injúrias em sua língua natal quando tentei manter atividades musicais um pouquinho mais ordenadas que a sinfonia de notas estranhas em tons indefinidos emitidas pela gaita de foles de meu primo, forçando-me a encerrar tais atividades, mas ainda assim sua insistência em deixar tais plantas a redeas soltas cobrindo meu telhado e danificando muito a estrutura do mesmo, continuou por meses a fio, bem antes da chegada do imigrante escocês que aqui habita no momento.

Enfim, após uma noite em que dormi por aproximadamente 15 segundos, fui fazer um café extra-extra-extra-super-ultra-plus forte em um tentativa vã de me despertar, mas verifiquei para meu horror que café em minha residência não mais havia. Esqueci-me de trancar o depósito de café da despensa, e acho que alguém que aqui reside resolveu dar cabo de minhas preciosas reservas deste magnífico pó. Praguejando horrores, como é de hábito, dirigi-me para a garagem, a fim de apanhar meu veículo automotor para tentar localizar algum estabelecimento infecto que vendesse tal infusão, absolutamente vital para o meu pleno funcionamento, logo em seguida dirigindo-me para vosso escritório, para que fizéssemos a tal reunião.

O carro que possuo, bem sabe V. Sa., está mais para uma charrete que um automóvel propriamente dito; maldita renda insuficiente de desenhista que não me permite adquirir uma coisa melhor que um Fiat 147 amarelo-abóbora. Após inúmeras tentativas de por o quase falecido motor em funcionamento, consegui finalmente obter êxito após empurrar tal ferro-velho por algumas dezenas de metros. Subi na carroceria enferrujada e prossegui adiante, conseguindo obter a velocidade lúdrica de 40 km/h de minha carroça automotiva. Isto na segunda marcha; caso tente passar para a terceira, o carro imediatamente começa a enfraquecer. A quarta marcha estampada na alavanca de câmbio é uma piada de mau gosto, creio eu, pois o dia em que necessitar ativá-la será o momento concomitante do apocalipse.

Meu júbilo de dirigir tal possante máquina foi interrompido momentos adiante, quando apareceu diante de mim um veículo ainda mais digno de pena que o meu: um Corcel I branco, que ocupava com hegemonia a via em que circulava, atingindo a velocidade espantosa de 150...metros por dia. Após muito praguejar(minha buzina não funciona), esgoelei o motor de minha abobrinha, contrariando o último mecânico que o examinou, que me recomendou que nunca o fizesse. A máquina reclamou tanto que experimentei passar para a terceira marcha, fato este que causou a morte instantânea do motor.

O dono do Corcel se riu muito de meu infortúnio e seguiu adiante, enquanto eu dei uma dúzia de pontapés no meu extinto veículo, evidentemente machucando-me muito mais que a lataria de sólido ferro. Mancando, resignei-me a empurrar meu fardo de volta para minha residência, sendo definitivamente impedido de comparecer à nossa planejada reunião, uma vez que o transporte público ainda estava paralisado devido à greve de seus operantes, que exigem 150% de aumento mas que sabem que seus patrões, se muito, irão conceder um aumento de 0,0000000000000000000000zero porcento.

Como v. Exa. pode constatar, não foi por simples lapso de memória que não pude comparecer a tal reunião. Estou aqui escrevendo no meu mais caprichado português, típico de agentes da lei como o senhor, para tentar entender por que diabos o senhor teve a cara de pau de mandar-me uma nota de cobrança pela reunião que NÃO aconteceu ontem. Foda-se o português críptico; bem sei que cretinos como o senhor só usam essas merdas para enganar suas pobres vítimas, confundindo-as irremediavelmente com estes termos rebuscados dos infernos. Escrevi e remeti esta pequena nota no momento em que recebi sua porca cobrança, momento este que me determinei a comparecer em seu escritório, munido do meu fiel taco de baseball, para redecorar suas instalações e a sua cara. Como sei que demorarei uns 2 dias para chegar aí, uma vez que estarei indo a pé, espero que esta carta NÃO chegue às suas imundas mãos antes que consiga aí chegar. Para isto tenho plena confiança que meus queridos agentes dos correios certamente irão me ajudar.

Então, passe bem, querido Doutor. Doutor?? Por acaso o senhor tem ao menos título de doutorado?? Só se chamam de "doutores" àqueles que obtiveram este título, não a uma reles sanguessuga feito o senhor, formado em uma universidade ribeirinha e que se diz doutor, mas que nem ao menos fez um mero mestrado!

Passar bem mal, seu filho da puta dos infernos.

Assinado,

Sr. Bode.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Panegírico.

Assis Ramos de Faria.

Após o informe datado do final da tarde de ontem, sobre seu falecimento, sinto-me compelido a prestar uma homenagem, por mais anônima que seja, uma vez que poucos que me conhecem também o conheciam.

Não sei tanto sobre a vida de "seu" Assis, como todos o conheciam. Não sei de onde era natural, se tinha cursado alguma escola assim ou assado, não sei. Sei que ele era motorista da família do Antônio; acho que ele exerceu essa função por toda sua vida.

Sei que era uma boa pessoa. Sei que dirigia carros insanamente, por vezes quando fui passageiro dele, vi minha própria vida passar diante de meus olhos quando ele acelerava para me levar ao meu suposto destino: "Você tá atrasado. Mas deixa comigo!". Eu e o Hugo passamos por aperto semelhante em 1997, quando ele nos deu uma carona para a UFMG. Nunca tinha visto ninguém correr tanto naquela avenida movimentadíssima até então. Saímos do carro quase beijando o chão. Estou vivo! Estou vivo!

Mas, por incrível que pareça, ele nunca, NUNCA bateu. Nunca sofreu acidente automobílistico. Parecia que tinha um anjo da guarda forte, por assim dizer.

Sei também que ele era uma pessoa que execrava gente desonesta...especialmente ladrões e afins. É famoso também o caso de quando ele foi assaltado à saída do banco, quando um pivete roubou o envelope que continha seu ordenado. Creio que nesta época, seu Assis tinha perto de 60 anos ou mais; isto não o impediu de perseguir o pulha, alcançá-lo uns dez quarteirões adiante e encher o couro do sujeito de porrada. Agentes da polícia houveram por bem separá-lo do meliante; acho que se não o fizessem, ele teria levado a cabo a ameaça de matá-lo.

Outra vez, quando informado que eu e Antônio havíamos sido assaltados à mão armada enquanto tentavámos escalar a montanha perto de nossas residências, estava com ele no carro quando ele virou pra mim e me disse que estava indignado com o que tinha acontecido, e que lamentava não estar conosco na ocasião, "para passar fogo nos desgraçados". Ao dizer isso, puxou de um compartimento secreto no carro seu trabuco de cano curto, fato que me causou sensação. Imagino que se de fato ele estiveve conosco, tais filhos da puta estariam bem mortos. Sem remorso. Sem transtorno.

Ele era como um autêntico cão de guarda perto das pessoas a quem reservava apreço, sempre pronto a te defender. Coisa que admiro muito em pessoas; coisa que acho que está em declínio nas pessoas hoje em dia. Cada vez mais e mais é cada um por si e foda-se.

Sim, para uns pode parecer que ele era muito doido também(sinceramente, gostaria muito que houvessem mais "doidos" feito ele), mas o pouco que eu conhecia dele era o suficiente para saber que ele era uma pessoa com quem você poderia contar. Alguém realmente digno de confiança. Ele tinha palavra, honra. Coisas que andam em extinção também nos dias de hoje.

Coisas que valorizo muito. Coisas que sinto que sentirei falta.

Não sei bem a idade que ele nos deixou, mas sei que girava em torno de 70 ou mais anos. E ele sempre apresentou menos. Seu humor era inquebrantável; estava sempre com um sorriso no rosto quando conversava com você. Seu ânimo era exemplar.

Sei que ele estava lutando com o mau eterno do ser humano, aquela bomba relógio que o próprio corpo resolve pôr em funcionamento quando se menos espera, e por motivos que, por mais que se estudem, ninguém sabe dizer por que ela é ativada. O câncer. Coisa maldita esta, é deveras ingrato lutar contra seu próprio organismo. Sei que ele esteve internado algumas vezes nos últimos meses, e aparentemente tinha debelado a coisa. Pelo menos assim me pareceu. Eu o vi dirigindo seu carro, como de costume, há umas duas semanas atrás, passando por mim enquanto vinha ao trabalho. Sorridente como sempre, me acenando amigavelmente como de costume.

Mas uma coisa que não sabia até ontem era que sua esposa havia falecido há aproximadamente um mês. E bem sei eu como essas uniões de outrora costumavam ser mais significativas que os casamentos descartáveis que acontecem nos dias de hoje. Parece que, em uniões deste tipo, quando um deles se vai, o outro simplesmente desiste de continuar vivo e procura, inadvertidamente seguir o destino do cônjuge. Vi isto acontecer com meus avós maternos: quando meu avô faleceu, minha avó parece ter desistido de viver, e em menos de um mês depois, ela também foi-se embora.

Não sei se foi este o caso. Mas sei o que aconteceu.

Que seu Assis nos deixou.

E sei que ele irá fazer falta. Sei que é uma pessoa que realmente representava uma estirpe em extinção hoje em dia.

Que a terra lhe seja leve, seu Assis. Que o senhor volte a se encontrar com todos que do outro lado estão e que sabiam que o senhor era uma pessoa digna de menção. Que aguardavam ansiosamente a bênção de sua presença. Porque assim o era para nós que aqui ficamos.

Adeus...e muito obrigado por tudo.


quarta-feira, 4 de março de 2009

It´s involution, baby!


Ahhhh que calor. Esta cidade está sendo assolada por uma onda calorífica devastadora, e nós aqui trabalhando. Minha irmã se mandou para alguma paragem baiana, para curtir merecido recesso, após anos e anos de abstinência de água salgada, em viagem auxiliada financeiramente por este que vos escreve. Recomendei a ela a simples contemplação daquela massa d'água para suas aflições em geral. É estranho, parece que há um instinto primordial esquecido que nos impele a ir ter ao mar de tempos em tempos, como se nossos fugidios ancestrais nos chamassem para que admiremos o lugar onde a vida começou propriamente.

Ou não, segundo alguns.

Voltando a pisar em alguns calos, tive vontade de escrever sobre um absurdo que está tomando de assalto não só nosso país de ilustres iletrados, mas mesmo alguns lugares do mundo supostamente mais desenvolvidos que nosso paraíso tropical.

O que leva alguém a querer ensinar algo como criacionismo em escolas?

Sinceramente. Por mais que possa parecer tendencioso isto, uma vez que inegavelmente tive formação superior em biologia, o que leva as pessoas a agirem de forma tão retrógrada? É realmente impossível para estes "entusiastas" de tal teoria aceitar que o mundo mudou - e muito - desde que esta teoria foi concebida? Em tempos como estes, acredito eu que a ciência é inegável, está presente por todos os lados em nossa sociedade globalizada. Sim, ela existe em todos os cantos do planeta, por mais carentes de recursos que este ou aquele lugar possam ser.

Para mim, querer imbutir tal teoria na formação de mentes em formação é um absurdo. Um passo para trás. Ou vários. Sinceramente, tal teoria de nada acrescenta a pupilos em salas de aula. Infelizmente, volto a dizer, assuntos religiosos só resultam em inúteis discussões. E consequências nefastas para todos que se engajam a cabo em tais embates.

Como sei que não tenho um público muito grande a ler esta coluna, e sei bem que tais pessoas não são entusiastas religiosas fanáticas(pelo menos penso que não são), vou soltar o verbo aqui.

Para mim, parece que os mentores deste "passo para trás" estão realmente interessados que as ovelhas de seus rebanhos continuem sempre...sendo ovelhas. A lógica não me diz outra coisa; pois eis que me parece que de fato, se tais ovelhas pensassem por si próprias ao invés de seguir cegamente dogmas e quejandos, muitas delas abandonariam os templos às traças. Ao menos assim me parece. Eu mesmo já o fiz. E não sou ateu; sou agnóstico. Acredito que realmente exista alguma sorte de "poder superior", ou que quer que seja realmente por detrás de tudo. Mas não aceito dogmas das religiões. Como disse Nietzsche, "não acredito em um deus que exija de mim a adoração initerrupta."

Creio que de fato ciência e digamos, uma certa espiritualidade possam coexistir. Mas não desta maneira. Não com pessoas ditas "representantes do poder eterno" dizendo incessantemente que é errado agir assim ou assado. E não estou me referindo a apenas uma religião em particular, mas todas. Sempre haverá alguma espécie de mecanismo de controle por trás dos dogmas. Por exemplo, porque diabos até hoje condenam o uso de preservativos? Para aumentar o rebanho de pobres diabos servis, em minha opinião. E quanto mais ignorantes estas ovelhas forem, melhor para eles.

E isto vale não apenas para entidades religiosas. Nosso querido governo é extremamente beneficiado por tal política. Até inventaram o "vale-esmola", o "vale-cachaça", o "vale-pagode", o "auxílio-família", que incentiva as pessoas menos abastadas a terem filhos como coelhos para se encostarem e receberem os benefícios governamentais. Uma verdadeira indústria da miséria e do povo folgado e encostado. Basta fazer filhos para se ter renda agora, sem pagar impostos nem nada! Maravilha. Milhares e milhares de eleitores à vista, uma vez que isto é um círculo vicioso, pois vivemos em um país onde o "jeitinho brasileiro" impera, e esta fcilidade é uma digna mão na roda para muitos desocupados porraí. Pra que trabalhar então? Quer ter um milhão de reais? Tenha um milhão de filhos que o governo(e os pobres contribuintes) bancará seu dourado sonho milionário!! Hu-há.

Sei que isto não se aplica a toda a dita população carente, mas conheço de perto casos de pessoas que de fato preferem ter mais e mais filhos para abocanhar este benefício.

O tribunal do santo ofício certamente exerceria tal controle sobre minha pessoa se ainda tivesse todo aquele poder que tinha outrora. Se tais snatos homens lessem isso aqui alguns séculos para trás, eu seria esfolado vivo, queimado a fogo lento e minha pele seria crucificada. Ou algo do gênero.

Nussa. Acho melhor parar por aqui, uma vez que talvez exista algum agente especial que rastreie o conteúdo de brogues porraí e secretamente elaborem uma lista negra...

Enfim, espero não ter mexido demais com os brios de ninguém que a isto aqui leia.

terça-feira, 3 de março de 2009

A primavera.

Acordar. Esfregar os olhos. Abrir a janela. Cinza, cinza, cinza. Apesar de amar aquela cidade, aquela época do ano era demasiado opressiva para pessoas como ele. O inverno ali era depressivo...Olhou o relógio e constatou que estava um pouco atrasado.

Não que realmente se importasse com seu emprego. Não. Mas todo cuidado era pouco.

Enquanto vestia-se, sua cabeça teimava em vagar pelo passado. Tudo aquilo parecia ter sido um absurdo, um pesadelo. Sua famíla, por possuir um estabelecimento comercial simples - uma tipografia - havia sido tachada de burguesa pelo partido e sofrido diversas sanções absurdas. Ele, que sempre almejara uma carreira como pesquisador, havia sido obrigado a trabalhar como auxiliar de mecânico desde 1962.

Havia sempre rumores de olhos à espreita por todos os lados. Sua mãe, que falecera no ano anterior, sempre recomendava cautela. As histórias sobre como o governo tratava os transgressores eram assustadoras, e ele não poderia deixá-la sozinha. Resignou-se em abandonar suas crenças, seus sonhos e esperanças em uma carreira universitária.

Nunca poderia ir muito adiante com tantos olhos à espreita e tandos ouvidos zombeteiros. O partido tinha informantes vis por todos os lados. Um de seus companhiros de faculdade, Ludvik, devido a uma brincadeira, havia sido banido de todas suas atividades e havia desaparecido. A última notícia que teve dele era algo assustador para alguém como eles...ele estava trabalhando como operário em alguma mina de carvão regida pelo vil exército.

Malditos russos, ele pensou.

Nenhum deles havia aprendido a ler mentes, então ele deixava ela livre de rédeas nessas horas.

Filhos de vacas mal paridas. Putos safados, malditos, malditos.

Após alguns momentos de raiva interna, olhou novamente para o relógio. Céus, tinha que correr para não perder o bonde. Engoliu alguns pedaços de pão seco e saiu apressadamente pelas ruas de Praga. Não poderia deixar que tivessem motivos para censurá-lo. Seu superior já havia dado uma dura nele outro dia enquanto matava mentalmente todos aqueles cretinos condizentes com aqueles russos de merda que ali haviam. Puxa-sacos do caralho.

Sempre sonhava com alguma vã esperança de algum dia aquilo tudo acabar. Haviam rumores naquele ano de 1968. Ele acompanhava tudo de perto, o mais discretamente possível, claro. Diziam que havia um tal de Dubcek que tinha boas idéias.

Quem sabe ainda haveria esperança?

De qualquer maneira, pelo menos ainda havia boa cerveja disponível mesmo aos pobres-diabos como ele...

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Er, este inusitado tema de hoje apareceu em minha cabeça não sei bem a que horas, e como bom semi-tcheco que sou(50% ao menos - minha branquelagem não me deixa mentir!) resolvi escrever algo a respeito daquela terrinha que um dia ainda hei de conhecer. Sim, admito que não tenho conhecimentos efusivos sobre o país de meus avós, além da leitura de vários livros de Milan Kundera(a referência a Ludvik veio de seu personagem de seu livro A Brincadeira) e conversas com uma amiga de minha mãe, exilada daquele país na época mais sinistra do comunismo de Stalin.

Mas, com somente estes relatos, sei que meus avós fizeram bem de não voltar para lá após o término da II Guerra. O comunismo ali foi terrível, era uma espécie de ditadura militar constante. Você era sempre espionado, escrutinizavam todos seus movimentos...E de fato, se o partido havia por mal lhe tachar de "burguês", você estava fudido. Acabavam com sua vida. A história da tipografia é adaptada da vida desta amiga de minha mãe e meus avós, Anniča(sei lá se é assim mesmo que se escreve isto, mal ae, mas meu tcheco se resume a 2 frases). A família dela realmente possuía uma tipografia. Resultado: após ter sido cenominada burguesa, ela não pode estudar adequadamente e teve que ser "voluntária do campo", eufemismo para fazer trabalhos forçados nas colheitas. Anos mais tarde, ela fugiu para a nossa terra tupiniquim. Não é de se estranhar.

Estou em processo de obter minha cidadania par poder algum dia visitar ali. Quem sabe alguma coisa melhor há de me esperar naquela terra...não sei bem a certo, enfim. Veremos. Ao menos ali, sei que não olham para desenhadores e entusiastas da música com olhos jocosos. E sei que a cerveja de lá é realmente boa, ao contrário dese mijo engarrafado que vendem aqui...

Mas enfim, são apenas suposições. E eu tenho que trabalhar. Notas fiscais. Tomates. Tomates. Pra mim plantam ali apenas pepinos e abacaxis. Ah, enfim.

Até amanhã...