Invenção. Há que se inventar coisas a escrever, neste instante. Falam de futebol ao meu lado, mas não necessariamente a mim, pois eis que concordo pacificamente sem captar toda a mensagem reinante ali, se é que ela existe.
Pensar, pensar. Mesas de escritório não são nada inspiradoras. Não são nada musas. Gerusas, Vanusas, Ferro-gusa, merluza. Tive uma profesora de bioquímica que se chamava Santuza. Ela não manifestava emoções, mas era menos andróide que a professora de embriologia, que mais parecia um robô japonês. E eis que vão bater o cartão alguns andares abaixo. Onde andarão? As pessoas que comigo cursaram aquele concurso, que se tornou um curso, com poucos recursos, em nada incursos, porém deveras abstratos.
Abstrato foi a outra desventura, desprovida de ventura, nada parecida com uma aventura, que se passou em uma comédia ou tragédia romana em outro prédio, outra unidade, mesma faculdade, anos após o fiasco, que me deixou cheio de asco. Outro lugar, outro andar, outras pessoas, outras intenções, novas ilusões. Bobinho. Ano após ano, mês após mês, dia após dia, uma coisa atrás da outra, assim como um mar de morros, escasso de cumes e servido de vales, estes ou de depressão ou de lágrimas, rios e rios a escorrer por entre a escuridão reinante nos vales desta natureza. Outra vez, ali não se encontrava nada, porém reinava o tudo.
Vida, essa desconhecida. Esta alucinação em que vivo, em que vivem, todos compartilham do mesmo coma coletivo, apesar de não estarmos conectados a um ambiente virtual e fictício. É real, muito real, mais do que frequentemente gostaríamos que o fosse. Apegamo-nos ao real, mas abraçamos o virtual, quer seja ele lícito ou não. Criamos realidades paralelas, outros universos, novas fugas. Drogas. Computadores. Mundos que não existem mas que nos dominam. Álcool, alcalóides, esteróides. Yoga, meditação, relaxamento, para além do firmamento. Mundos e fundos. Bem fundo mesmo. Religiões e pós vida. O sentido escrito em um lvro, traduzido e retraduzido, nada fiel a seu texto original, assim o suponho.
Bom dia, café. Bom dia, água filtrada, esterilizada, acidulada, tratada. Nada do que foi será de novo como o é neste instante, neste instante que invento tudo isto, tudo que escrevo, tudo que não planejo mas que aparece diante de mim. Invento esta realidade para tentar escapar da minha. Não sei se sou assim, se sou assado, mas sei que não é assim que a vida funciona. Capturo frases alheias, escrevo e escrevo. Tento e tento. Não sei de nada, mas desconfio de muita coisa. Tanto que estou aqui, a me tornar mais e mais preso dentro da minha solitária, o lugar mais sozinho do mundo e o mais seguro também. Daqui, algo me diz, que não devo entregar-me a isto, que devo tentar achar a chave, esta outra desconhecida. Escrevo e escrevo, não estando isento de machucar aos outros mas ao mesmo tempo que sei que me machuco muito mais que aos outros.
Escrevo, tentando encontrar a tradução de mim mesmo. Para que os outros entendam ou tentem entender, de alguma forma ou de outra. Dizem-me que estou assim porque quero, porque desejo, porque não saio daqui, não saio dali, não saio de lugar algum. Estou aqui mas estou em outros lugares, tentando achar a saída desta coisa, deste lugar. Acusam-me e acusam-me. Sei que não estou isento de culpa, que não possuo a razão por completo. Ninguém possui esta coisa. Escrevo e escrevo. Se não entendem, entendo muito menos. Assim e assado, assado e assim.
Perdão é o que deveria pedir, eu suponho. Fazem gols, fazem filhos, falta luz, falta dinheiro, falta esperança. Falta sentido, faltam sentidos, nada do que escrevo é nada mais além de mim mesmo, de mim mesmo, daqui mesmo, de onde estou. Entendam ou não, assim o sou, assim o é, assim será, assim estarei. Escrevo e escrevo, mas frequentemente encontro em outros lugares semelhantes traduções, semelhantes retratos, aparentemente não estou sozinho, encontro-me musicado, narrado por outrem:
i am a scientist - i seek to understand me
all of my impurities and evils yet unknown
i am a journalist - i write to you to show you
i am an incurable
and nothing else behaves like me
and i know what's right
but i'm losing sight
of the clues for which i search and choose
to abuse
to just unlock my mind
yeah, and just unlock my mind
i am a pharmacist
prescriptions i will fill you
potions, pills and medicines
to ease your painful lives
i am a lost soul
i shoot myself with rock & roll
the hole i dig is bottomless
but nothing else can set me free
and i know what's right
but i'm losing sight
of the clues for which i search and choose
to abuse
to just unlock my mind
yeah, and just unlock my mind
i am a scientist - i seek to understand me
i am an incurable and nothing else behaves like me
everything is right
everything works out right
everything fades from sight
because that's alright with me
---Guided By Voices, I am a scientist.
Enfim, assim o sou, assim tento me comunicar. Vivam os repentes de Robert Pollard e sua voz, sua encarnação, seu reflexo de si próprio que é também meu, esta banda chamada Guided By Voices. Esta, afirmo eu, é uma das mais completas interpretações de mim mesmo já escrita por outra pessoa.
E tenho que parar. Há que se ganhar o pão nosso de cada dia. Paro, mas hei de continuar, até onde der, até onde convir, até onde for. Até que não haja mais nada para se escrever. Dia este que estarei morto.
Pensar, pensar. Mesas de escritório não são nada inspiradoras. Não são nada musas. Gerusas, Vanusas, Ferro-gusa, merluza. Tive uma profesora de bioquímica que se chamava Santuza. Ela não manifestava emoções, mas era menos andróide que a professora de embriologia, que mais parecia um robô japonês. E eis que vão bater o cartão alguns andares abaixo. Onde andarão? As pessoas que comigo cursaram aquele concurso, que se tornou um curso, com poucos recursos, em nada incursos, porém deveras abstratos.
Abstrato foi a outra desventura, desprovida de ventura, nada parecida com uma aventura, que se passou em uma comédia ou tragédia romana em outro prédio, outra unidade, mesma faculdade, anos após o fiasco, que me deixou cheio de asco. Outro lugar, outro andar, outras pessoas, outras intenções, novas ilusões. Bobinho. Ano após ano, mês após mês, dia após dia, uma coisa atrás da outra, assim como um mar de morros, escasso de cumes e servido de vales, estes ou de depressão ou de lágrimas, rios e rios a escorrer por entre a escuridão reinante nos vales desta natureza. Outra vez, ali não se encontrava nada, porém reinava o tudo.
Vida, essa desconhecida. Esta alucinação em que vivo, em que vivem, todos compartilham do mesmo coma coletivo, apesar de não estarmos conectados a um ambiente virtual e fictício. É real, muito real, mais do que frequentemente gostaríamos que o fosse. Apegamo-nos ao real, mas abraçamos o virtual, quer seja ele lícito ou não. Criamos realidades paralelas, outros universos, novas fugas. Drogas. Computadores. Mundos que não existem mas que nos dominam. Álcool, alcalóides, esteróides. Yoga, meditação, relaxamento, para além do firmamento. Mundos e fundos. Bem fundo mesmo. Religiões e pós vida. O sentido escrito em um lvro, traduzido e retraduzido, nada fiel a seu texto original, assim o suponho.
Bom dia, café. Bom dia, água filtrada, esterilizada, acidulada, tratada. Nada do que foi será de novo como o é neste instante, neste instante que invento tudo isto, tudo que escrevo, tudo que não planejo mas que aparece diante de mim. Invento esta realidade para tentar escapar da minha. Não sei se sou assim, se sou assado, mas sei que não é assim que a vida funciona. Capturo frases alheias, escrevo e escrevo. Tento e tento. Não sei de nada, mas desconfio de muita coisa. Tanto que estou aqui, a me tornar mais e mais preso dentro da minha solitária, o lugar mais sozinho do mundo e o mais seguro também. Daqui, algo me diz, que não devo entregar-me a isto, que devo tentar achar a chave, esta outra desconhecida. Escrevo e escrevo, não estando isento de machucar aos outros mas ao mesmo tempo que sei que me machuco muito mais que aos outros.
Escrevo, tentando encontrar a tradução de mim mesmo. Para que os outros entendam ou tentem entender, de alguma forma ou de outra. Dizem-me que estou assim porque quero, porque desejo, porque não saio daqui, não saio dali, não saio de lugar algum. Estou aqui mas estou em outros lugares, tentando achar a saída desta coisa, deste lugar. Acusam-me e acusam-me. Sei que não estou isento de culpa, que não possuo a razão por completo. Ninguém possui esta coisa. Escrevo e escrevo. Se não entendem, entendo muito menos. Assim e assado, assado e assim.
Perdão é o que deveria pedir, eu suponho. Fazem gols, fazem filhos, falta luz, falta dinheiro, falta esperança. Falta sentido, faltam sentidos, nada do que escrevo é nada mais além de mim mesmo, de mim mesmo, daqui mesmo, de onde estou. Entendam ou não, assim o sou, assim o é, assim será, assim estarei. Escrevo e escrevo, mas frequentemente encontro em outros lugares semelhantes traduções, semelhantes retratos, aparentemente não estou sozinho, encontro-me musicado, narrado por outrem:
i am a scientist - i seek to understand me
all of my impurities and evils yet unknown
i am a journalist - i write to you to show you
i am an incurable
and nothing else behaves like me
and i know what's right
but i'm losing sight
of the clues for which i search and choose
to abuse
to just unlock my mind
yeah, and just unlock my mind
i am a pharmacist
prescriptions i will fill you
potions, pills and medicines
to ease your painful lives
i am a lost soul
i shoot myself with rock & roll
the hole i dig is bottomless
but nothing else can set me free
and i know what's right
but i'm losing sight
of the clues for which i search and choose
to abuse
to just unlock my mind
yeah, and just unlock my mind
i am a scientist - i seek to understand me
i am an incurable and nothing else behaves like me
everything is right
everything works out right
everything fades from sight
because that's alright with me
---Guided By Voices, I am a scientist.
Enfim, assim o sou, assim tento me comunicar. Vivam os repentes de Robert Pollard e sua voz, sua encarnação, seu reflexo de si próprio que é também meu, esta banda chamada Guided By Voices. Esta, afirmo eu, é uma das mais completas interpretações de mim mesmo já escrita por outra pessoa.
E tenho que parar. Há que se ganhar o pão nosso de cada dia. Paro, mas hei de continuar, até onde der, até onde convir, até onde for. Até que não haja mais nada para se escrever. Dia este que estarei morto.