sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Memorial.

Ia aqui escrever algo que não me lembro no momento. É curioso estas coisas, a memória da gente, a memória dos outros. Já repararam que a memória é uma coisa muito pessoal? Explico melhor. Você assiste a um filme. Se for um filme que você achou muito bom, provavelmente certos detalhes do mesmo ficarão gravados em sua mente. Agora, em uma discussão com uma pessoa que assistiu o mesmo filme e dele também gostou, provavbelmente os detalhes apreendidos pelas duas mentes não irão coincidir.

Suponho que realmente é questão de afinidade com certos detalhes - às vezes uma besteirinha de um filme qualquer representa algo importante para mim, mas não para outrem. Certo, a capacidade de fixar memórias também varia muito de pessoa para pessoa. Mas creio que no meu caso, é uma questão de seletividade desta coisa que fica alojada no meu crânio e que a tudo comanda. Lembro-me de detalhes por vezes muito obscuros em alguns filmes e seriados de TV. Gosto sobretudo de guardar certas frases de filmes que podem servir como luva em alguns diálogos do dia-a-dia. Mas muitas vezes, é nestas horas mesmo que confirmo que certas coisas que ficam guardadas em minha memória muitas vezes não significam nada para outras pessoas, mesmo que gostem também da obra da qual retirei tais citações.

Fico por vezes perplexo com estas coisas, e como sempre, ponho-me a pensar a respeito. Acho engraçado isso, a memória. O que leva-nos a guardar, fixar certas coisas que para o restante do mundo são completamente irrelevantes? O que nos leva a fixar coisas completamente irrelevantes, como detalhes de conversas que se passaram há mais de dez anos? Eu tenho disso. Por vezes, conversando com amigos, eu lembro de coisas ditas que ninguém mais se lembra; por vezes tenho mesmo que narrar todo o episódio circunvizinho de tal conversa para que o interlocutor se lembre de tal evento. E às vezes, mesmo assim não obtenho sucesso sempre. A coisa simplesmente sumiu da cabeça de meu confuso amigo.

Por vezes, isto é legal, lembrar-se das coisas que se passaram, lembrar-se dos bons momentos. Mas...a coisa que mais me deixa perplexo é que costumo me lembrar de todas as merdas também, com detalhes vívidos, claros. E isto torna-se um assombro, uma aporrinhação. Coisas que o tempo deveria apagar, palavras que o vento deveria ter levado....cá estão armazenadas nesta cabeça. Por vezes, tenho que me forçar a desativar tais memórias, de tanto que elas retumbam em minha cabeça. Não é legal isso. E não concordo com aqueles que dizem que é tudo uma questão de relevância, basta parar de dar atenção que tais memórias se esvanecerão.

Talvez, quando minha memoria estiver sendo erodida naturalmente - coisa que a todos acontece - tais merdas sumam de minha cabeça, mas por ora, elas ainda ficam, marcadas a ferro e a fogo. Especialmente coisas ruins. E eu não sei dizer por quê, simplesmente não sei. Lembro-me de um espetáculo "stand-up comedy" de Chris Rock em que ele menciona isto em mulheres: "elas guardam merdas em suas cabeças para usar contra você depois!" - e lembro-me de mim mesmo, que costumo fazer isto, mas sem fazer uso deste artifício de usar tais memórias contra aqueles que me impingiram alguma sorte de mau-trato.

Mas ali elas estão, me assombrando. E enquanto isso, coisas realmente relevantes, como detalhes realmente importantes para a realização de tarefas do dia-a-dia, se perdem neste limbo.

Lembro-me bem, que entrei no curso de biologia com o intuito de talvez ali aprender sobre estas coisas, entender melhor estes processos. E me lembro que ali falhei miseravelmente; a única coisa que da biologia levei foram conhecimentos irrelevantes, como nomes científicos de animais e alguns complicados processos metabólicos, para acrescentar em conversas triviais e deixar meus interlocutores com cara de tacho. Notas irônicas, evidentemente.

Fora isso, carrego a joça de ter que olhar para mim mesmo no espelho e falar, mais uma empreitada falha em vossa vida, sr. Reflexo.

Certo, certo. Também levei amigos dali, raros mas dignos de mênção, e boas memórias da época boa que é o mundo de faz de conta da faculdade. Hoje mesmo, creio que irei fazer um revival desta época, ao encontrar em algum bar infecto por aí, tais amigos.

Enfim, é sexta, levemos a promessa de dois dias de folga adiante. Folga? No meu caso, acho que tal folga irá deixar de existir em breve, mas....é por uma boa causa, eu suponho. É pela memória mais persistente em minha cabeça, aquela que sempre me acompanhou, sempre me alentou e ao mesmo tempo me aterrorizou.

É mais uma tentativa de levar a cabo o sonho, o sonho, a razão de ser.

Algo que supressor nenhum de memória me fará esquecer.

Vejamos.