Dias desde a última anotação: ?
Cada dia que passa, é como se uma vida inteira estivesse se desenrolando diante de meus olhos. Diante de meu nariz. Poir debaixo desta pele, destes osso, as coisa parecem mesmo estar fossilizadas, esquecidas.
Não escrevo nada desde sei lá quando, talvez dois dias, talvezum mês, um ano. Não entendo mais nada do que se passa neste local. Alguns dias estou relaxando à beirada de meu rio, e de repente eu pisco e já é noite fechada, faz frio. Como se tivessem dado um corte seco de seis, sete horas em meu dia.
Não consigo mais dormir sem ser inebriando-me com aquele escasso estoque de álcool que trouxe daquele lugar que....bem, ou não existe ou ficou perdido para sempre no meio do labirinto deste deserto urbano que um dia já foi uma cidade. Apesar de ser um modesto suprimento de garrafas que consegui angariar naquele extinto recinto, elas parecem não ter fim.
Lembro-me quase nitidamente que vou tentar dormir, rolo e rolo no meu estrado improvisado, me levanto exasperado e apanho no escuro mesmo alguma garrafa aleatória na prateleira defronte. Bebo e bebo, e depois tateio os apetrechos fumacentos, quase sempre acho um dos maços de cigarros, que também parecem nunca acabar. Bebo e fumo, até desmaiar.
E acordo como se nada houvesse acontecido. As garrafas voltam magicamente para a mochila, bem como os cigarros. E me levanto, checo as armadilhas, cozinho os bichos, como, bebo água, tomo um banho no rio, me sento para secar e...
De repente, noite.
Assim, do nada.
Ao menos aquele episódio das vozes parece ter se extinguido para sempre. Presumo que tenha realmente sido alguma espécie de intoxicação alimentar causada pelas rações de nutritivo isopor...Algo assim.
Mas a verdade é que nada faz sentido por aqui. Em minhas andanças, tenho visto que as árvores amarelas estão cada vez mais frondosas, repletas de botões. Suponho que teremos uma certa "primavera" por aqui em breve.
Ando e ando, bato pernas todos os dias por estas ruas, tudo parece igual. Nunca mais consegui retornar àquela praça em que encontrei o tal prédio do álcool. E tento quase todos os dias achar aquilo, pois está me encucando. Quase parei de explorar as ruínas, entretanto. Não tenho tido paciência, nem sei bem precisar por quê.
Entretanto, ontem descobri uma coisa inusitada. Enquanto fazia minha peregrinação diária pelas ruas, avistei ao longe uma coisa que me parecia ser uma espécie de declive mais adiante, como se fosse uma ladeira, algo assim na rua. Olhando de longe, para ser sincero, mais parecia ser o bordo de uma imensa cratera. me aproximei cautelosamente, pois algo de muito estranho pairava em torno daquele lugar que me era ainda desconhecido.
Fui chegando lentamente à beirada da tal cratera, e me embasbaquei.
De fato, eu só poderia classificar tal buraco como uma cratera: a forma e as bordas não me permitiam chegar à outra conclusão. Por um segundo apenas pensei ter encontrado a fonte de toda a destruição ao meu redor, mas tal sensação se dissipou assim que firmei os olhos em direção ao centro de tal buraco.
Lá embaixo, metros e metros abaixo do nível do solo, havia uma imensa árvore...branca. Não apenas nas flores que ostentava em seus galhos: toda ela era de um tom leitoso, as folhas, o tronco.
Desci cautelosamente até chegar ao pé de tal vegetal, que era de fato muito imponente, assim como aquele imenso buraco no qual ela fazia parte. De perto, ela se parecia muito com as demais árvores amarelas espalhadas pelos arredores de Ruin-town, a não ser pelo tamanho - deve ter uns vinte e cinco metros de altura para mais, no mínimo - e pelo tom esbranquiçado.
Fiquei ali contemplando aquela imensa árvore e pensando. Alguma coisa de muito estranha estava no ar naquele lugar, e mesmo assim...a sensação que aquele paquiderme vegetal me transmitia era estranhamente serena, quase incongruente com todo o absurdo ao redor, toda aquela destruição, aquela crater que parecia ter sido causada ou por uma imensa bomba ou gigantesco meteoro....e que tinha em seu centro apenas uma árvore, uma bizarra árvore.
Não resisti por muito tempo. Estendi meus braços, apanhei alguns dos galhos mais baixos e comecei a escalar a dita. Subi e subi, mas parecia nunca chegar no topo dela. Mesmo porque os galhos mais altos pareciam ser muito frágeis. Em certa altura, parei. Inspecionei o tronco do galho que meus pés estavam, me certifiquei que era uma parte realmente sólida da planta, e resolvi ali me recostar.
Sentei-me, já esperando aquele desconforto típico que tal macaquice costuma causar em humanos, especialmente se eles já estão suficientemente envelhecidos por décadas e décadas, ou mesmo milhares de anos (sabe-se lá quanto tempo estive desacordado). Mas o tal "assento" me foi surpreendentemente confortável.
Não sei precisar quanto tempo fiquei ali, tampouco sei explicar o que me causou fazer tal coisa, mas fechei os olhos e lá fiquei.
Me sentia estranhamente sereno ali. Como se fosse um local de descanso mesmo, algo que me recarregasse as energias, nem sei dizer. Abri os olhos depois de um tempo indefinido, já esperando encontrar alguma bizarrice diversa diante de mim ou já estar novamente englobado pelo negro envelope da noite fechada, mas...
Não havia nada de incomum naquele incomum mundo ao meu redor. Nada de diferente. E o tempo nem parecia ter passado. Resolvi descer e voltar para casa, poois eu sentia sede. Somente sede, não sentia nem fome nem cansaço.
Saí da cratera, e fui apanhando no chão alguns destroços suficientemente coloridos para me servir de guia. Eu queria voltar àquele lugar novamente. Fui espalhando tais marcadores pelo chão, até encontrar uma de minhas ruas já mentalmente mapeadas. E cheguei ao meu rio, ao meu lugar.
Me sentia muito bem. A noite caiu e não tive problemas para dormir ontem. Acho que sonhei com alguma coisa, mas não me lembro o que era.
Hoje acordei e decidi retomar meus escritos, para registrar aqui os acontecimentos estranhos deste tempo de bizarros acontecimentos, no meio deste deserto. Tentarei achar a cratera novamente hoje. Sinto que ali se encontra alguma parte importante deste mundo como ele é agora, depois de tanta destruição, de tanto abandono.
Veremos.
Cada dia que passa, é como se uma vida inteira estivesse se desenrolando diante de meus olhos. Diante de meu nariz. Poir debaixo desta pele, destes osso, as coisa parecem mesmo estar fossilizadas, esquecidas.
Não escrevo nada desde sei lá quando, talvez dois dias, talvezum mês, um ano. Não entendo mais nada do que se passa neste local. Alguns dias estou relaxando à beirada de meu rio, e de repente eu pisco e já é noite fechada, faz frio. Como se tivessem dado um corte seco de seis, sete horas em meu dia.
Não consigo mais dormir sem ser inebriando-me com aquele escasso estoque de álcool que trouxe daquele lugar que....bem, ou não existe ou ficou perdido para sempre no meio do labirinto deste deserto urbano que um dia já foi uma cidade. Apesar de ser um modesto suprimento de garrafas que consegui angariar naquele extinto recinto, elas parecem não ter fim.
Lembro-me quase nitidamente que vou tentar dormir, rolo e rolo no meu estrado improvisado, me levanto exasperado e apanho no escuro mesmo alguma garrafa aleatória na prateleira defronte. Bebo e bebo, e depois tateio os apetrechos fumacentos, quase sempre acho um dos maços de cigarros, que também parecem nunca acabar. Bebo e fumo, até desmaiar.
E acordo como se nada houvesse acontecido. As garrafas voltam magicamente para a mochila, bem como os cigarros. E me levanto, checo as armadilhas, cozinho os bichos, como, bebo água, tomo um banho no rio, me sento para secar e...
De repente, noite.
Assim, do nada.
Ao menos aquele episódio das vozes parece ter se extinguido para sempre. Presumo que tenha realmente sido alguma espécie de intoxicação alimentar causada pelas rações de nutritivo isopor...Algo assim.
Mas a verdade é que nada faz sentido por aqui. Em minhas andanças, tenho visto que as árvores amarelas estão cada vez mais frondosas, repletas de botões. Suponho que teremos uma certa "primavera" por aqui em breve.
Ando e ando, bato pernas todos os dias por estas ruas, tudo parece igual. Nunca mais consegui retornar àquela praça em que encontrei o tal prédio do álcool. E tento quase todos os dias achar aquilo, pois está me encucando. Quase parei de explorar as ruínas, entretanto. Não tenho tido paciência, nem sei bem precisar por quê.
Entretanto, ontem descobri uma coisa inusitada. Enquanto fazia minha peregrinação diária pelas ruas, avistei ao longe uma coisa que me parecia ser uma espécie de declive mais adiante, como se fosse uma ladeira, algo assim na rua. Olhando de longe, para ser sincero, mais parecia ser o bordo de uma imensa cratera. me aproximei cautelosamente, pois algo de muito estranho pairava em torno daquele lugar que me era ainda desconhecido.
Fui chegando lentamente à beirada da tal cratera, e me embasbaquei.
De fato, eu só poderia classificar tal buraco como uma cratera: a forma e as bordas não me permitiam chegar à outra conclusão. Por um segundo apenas pensei ter encontrado a fonte de toda a destruição ao meu redor, mas tal sensação se dissipou assim que firmei os olhos em direção ao centro de tal buraco.
Lá embaixo, metros e metros abaixo do nível do solo, havia uma imensa árvore...branca. Não apenas nas flores que ostentava em seus galhos: toda ela era de um tom leitoso, as folhas, o tronco.
Desci cautelosamente até chegar ao pé de tal vegetal, que era de fato muito imponente, assim como aquele imenso buraco no qual ela fazia parte. De perto, ela se parecia muito com as demais árvores amarelas espalhadas pelos arredores de Ruin-town, a não ser pelo tamanho - deve ter uns vinte e cinco metros de altura para mais, no mínimo - e pelo tom esbranquiçado.
Fiquei ali contemplando aquela imensa árvore e pensando. Alguma coisa de muito estranha estava no ar naquele lugar, e mesmo assim...a sensação que aquele paquiderme vegetal me transmitia era estranhamente serena, quase incongruente com todo o absurdo ao redor, toda aquela destruição, aquela crater que parecia ter sido causada ou por uma imensa bomba ou gigantesco meteoro....e que tinha em seu centro apenas uma árvore, uma bizarra árvore.
Não resisti por muito tempo. Estendi meus braços, apanhei alguns dos galhos mais baixos e comecei a escalar a dita. Subi e subi, mas parecia nunca chegar no topo dela. Mesmo porque os galhos mais altos pareciam ser muito frágeis. Em certa altura, parei. Inspecionei o tronco do galho que meus pés estavam, me certifiquei que era uma parte realmente sólida da planta, e resolvi ali me recostar.
Sentei-me, já esperando aquele desconforto típico que tal macaquice costuma causar em humanos, especialmente se eles já estão suficientemente envelhecidos por décadas e décadas, ou mesmo milhares de anos (sabe-se lá quanto tempo estive desacordado). Mas o tal "assento" me foi surpreendentemente confortável.
Não sei precisar quanto tempo fiquei ali, tampouco sei explicar o que me causou fazer tal coisa, mas fechei os olhos e lá fiquei.
Me sentia estranhamente sereno ali. Como se fosse um local de descanso mesmo, algo que me recarregasse as energias, nem sei dizer. Abri os olhos depois de um tempo indefinido, já esperando encontrar alguma bizarrice diversa diante de mim ou já estar novamente englobado pelo negro envelope da noite fechada, mas...
Não havia nada de incomum naquele incomum mundo ao meu redor. Nada de diferente. E o tempo nem parecia ter passado. Resolvi descer e voltar para casa, poois eu sentia sede. Somente sede, não sentia nem fome nem cansaço.
Saí da cratera, e fui apanhando no chão alguns destroços suficientemente coloridos para me servir de guia. Eu queria voltar àquele lugar novamente. Fui espalhando tais marcadores pelo chão, até encontrar uma de minhas ruas já mentalmente mapeadas. E cheguei ao meu rio, ao meu lugar.
Me sentia muito bem. A noite caiu e não tive problemas para dormir ontem. Acho que sonhei com alguma coisa, mas não me lembro o que era.
Hoje acordei e decidi retomar meus escritos, para registrar aqui os acontecimentos estranhos deste tempo de bizarros acontecimentos, no meio deste deserto. Tentarei achar a cratera novamente hoje. Sinto que ali se encontra alguma parte importante deste mundo como ele é agora, depois de tanta destruição, de tanto abandono.
Veremos.