Er, digitar. A idéia virá. Digitar, digitar. Tlec tlec tlec.
Hoje tá dureza. A fumaça fumegante do café não me trouxe ânimo ainda, mas ele virá. É engraçado essa sensação que acontece por vezes, a de ficarsem idéias na cabeça. Entretanto, nestas horas é sempre interessante repuxar lá de trás alguns acontecimentos que podem vir a ser de grande valia para o entretenimento de outrem, e um exercício de memória de minha parte. Ainda mais sendo sexta - dia internacional da gandaia, da esbórnia, da pândega.
Enfim, foi em uma data semelhante a esta que a patuscada em questão se operou, em alguma sexta feira longínqua de 1997. Estava eu no segundo período da biologia, e era alguma espécie de calourada, creio eu. Sempre ficávamos ilhados na faculdade todos os dias, das manhãs até o final da tarde, devido aos horários estranhíssimos das aulas - "sei lá o que I" de 8 às 10 da manhã, e no mesmo dia, "alguma coisa II" de 16 às 18. Não compensava voltar para casa, ainda mais que sendo estudante universitário, o dinheiro não existe. Tenho mesmo uma história interessante sobre um modelo de economia doméstica, por assim dizer, que apliquei durante quase todo o período biológico da minha formação como inútil profissional. Entretanto, esta será contada em outra ocasião.
Toda sexta feira acontecia do DA da biologia, aquela repartição infecta de hippies e ideais comunistas, se transformar em algo mais legal, o Buteco da Biologia, universalmente famoso, ao menos no sentido de ser famoso na universidade, claro. E naquela sexta feira além do tradicional buteco, estava tendo a tal da calourada. Antes das calouradas serem proscritas na área da universidade, geralmente elas eram regadas a vinho baratíssimo, daqueles garrafões de 5 reais cada.
Anbtes de entrar na faculdade, eu era um santo(ani-tofu) que nunca havia bebido na vida. Me mantive firma no primeiro período, mas no segundo eu resolvi experimentar por em prática o famoso refrão cantado horrivelmente em algum cancioneiro popular por aí: "Eu vou beber pra esquecer meus pobrema!" e assim o fiz naquela noite. Evidentemente, a história já se inclina para o lado cômico, por que quem já bebeu alguma vez na vida, sabe que esta história que estou escrevendo vai dar em merda.
Estava eu num de meus momento inexplicáveis de chato da festa, deprimido em plena calourada. Edgar, que era na verdade Edimar, mas que apelidamos Edgar(um dos companheiros mais legais da faculdade), sabendo de minha abstinência alcóolica previamente declarada, se aproximou de mim jocosamente com uma cerveja e ofereceu-me um gole. Ao que peguei a lata e dei uma talagada. Ele sorriu imensamente, orgulhoso de me ver tentando resolver as coisas do modo mais errado possível, e me disse, "Se você quer beber, vamos ali nos vinhos grátis que aí nem precisamos nos preocupar com gastos."
Dito e feito.
Derramei copo após copo de vinho barato, que mais parecia um suco de uva daqueles Ki-Suco misturados com álcool 70. Evidentemente, eu me vi de repente extremamente alegre, extremamente falante, extremamente bêbado. E pulei, e dancei(músicas horrendas, eu dancei), corri pra lá e prá cá, troquei perna, capotei num canto cheio de lixo, fiz discurso de bebâdo científico, narrando os efeitos do álcool, seu volume de distribuição no corpo, seus efeitos sobre o cerebelo e a coordenação motora. Como podem ver, eu continuo o mesmo idiota de sempre quando estou tonto, apenas um tanto menos revoltado e um tanto mais avacalhado.
Eu era a diversão de todos, evidentemente, pois quem já passou mal devido ao consumo dessa droga legalizada sabe que toda primeira bebedeira geralmente acaba mal. E foi o que aconteceu. Eu já havia sido fotografado capotado no lixo, beijando uma imensa garota altamente imóvel - uma árvore(foda-se, se algum colega biológo vir isto aqui saberá que não omiti nenhum detalhe sórdido e hilário do caso) - e em certo momento, comecei a sentir os efeitos negativos, o preço a se pagar por não saber beber.
Em um dado momento da noite, comecei a passar mal, porque será? e me afastei um pouco da barulhada, indo deitar-me nalgum banco da praça central do campus. Fiquei ali uns instantes, tudo girava. Alguém me perguntou se eu estava bem, ao que respondi, "eu zô vêbazão véi", muito para o entretenimento alheio. Resolvi tornar ao DA, sentando-me no sofá do escritório dali. Após alguns instantes, veio o acontecimento.
Urp. Eu vou vomitar.
Uma coisa em mim parece se manter meio inquebrantável, mesmo estando intoxicado severamente, eu sempre penso na merda que vai dar. Eu estava no meio do escritório, não iria dar tempo de chegar ileso num Celite nunca. Olhei ao redor enquanto fazia um esforço tremendo para conter a expurgação do álcool, e vislumbrei uma possível solução para ao menos amenizar um pouco a coisa.
Havia uma panela numa prateleira perto de mim. Não é preciso nem dizer que ela não permaneceu vazia por muito tempo. Sim! Eu enchi a coisa de sangria estomacal. E apaguei logo em seguida, com a hedionda panela no colo. Momentos mais tarde, no meio da névoa alcóolica que ainda reinava em mim, escutei a voz de alguns amigos meus, incluindo Edgar, a rir em demasia. Ele mesmo me disse, "Pera ae mano, deixa eu esvaziar sua panelinha", jogou a coisa pela janela, e eu enchi o treco de novo. Mais aliviado, deitaram-me no sofá e me deixaram cozinhar minha bebedeira por um tempo. Lembro-me claramente de ouvir a banda convidada para a calourada tocando e eu pensando, "Merda, eu queria estar lá mas estou aqui morrendo."
Minha prima, que fazia o curso comigo, ria também a não mais poder, e convenceu um de nossos colegas que tinha carro de me levar para casa. Era evidente que eu não conseguiria chegar em casa sozinho. Me levaram, e lá chegando, descobri que não tinha as chaves de casa. Raios, onde elas estariam só Mitra saberia dizer. Consegui pular o muro de casa, e entrei cambaleante ali. Minha irmã mais velha na época namorava um cara com aspectos semelhantes a Edgar, que me viu todo vomitado, fedendo vinho e cambaleante e se sentiu todo orgulhoso. Interessante como um infortúnio faz crescer sua moral ante os "sujêras" da vida.
Na segunda feira, TODOS os veteranos que eu considerava mais legais, vieram me cumprimentar, agradecendo o favor que eu havia prestado. Qual favor, me perguntava. O fato de ter estragado a panela dos hippies fazerem chá. Eu me tornei uma celebridade instantânea naquela semana, TODOS sabiam quem eu era - o "calorvet" que havia feito a diversão da galera na calourada. Os hippies queriam me matar, e eu tive mesmo que me desculpar com a dona da panela, que era bem bonitinha, apesar de ser daquelas hippies mais nojentas de chatas do universo.
Desde aquele fim de semana, fui promovido a Buriol. Lembrem-se um pouco da química orgânica que entenderão a nerdice do apelido: OH é uma oxidrila, presente nos álcoois. Dá origem a compostos com terminação em "ol" - etanol, metanol, fenol, etc. Logo, anexe um OH ao meu sobrenome, Burian, exclua o "an" e ponha "ol".
Buriol.
Sim, meu passado me condena.