quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Vidum. Canis familiaris est.

Estaria eu
suspenso por entre notas
supenso pelas cordas
suspenso

Suspendei minhas notas
para além das cordas
para além da conta
para além da vida,
alheia vida
alheia música
alheias notas.

De mim partiram tais notas,
de mim saltaram as cordas
de mim sairam coisas
que nunca haviam sido,
nunca haviam dito,
nunca haveriam de ser

De mim, não
de mim
Saia, saiam
notas e mais notas
linhas e linhas
sons e imagens
de mim.

À manhã soam
as notas
pela manhã afora,
dia adentro,
saiam notas,
saiam linhas
saiam sons
e imagens
sons e imagens
luz e sombra
manhã afora,
mundo adentro.

Noves fora,
noves dentro,
nuvens lá fora
sol aqui dentro

sem contar ao certo,
sem sair de perto
sem saber ao certo,
sem estar lá perto.

Saiam, saiam de mim
notas
linhas
vozes
façam sentido
façam valer
o que não sei
não soube
não sabem
de mim,
de vós
de nós.

Sons, sons ecoam
linhas se cruzam
vozes se falam
dentro
fora
aqui
ali

e
ainda assim
não sempre as ouvem,
não sempre as lêem
não sei se têm
algo além

além da voz,
além das linhas,
além da sombra
da luz
da vida.

Vida, triste vida
vida alegre vida
vida vivida
vida morrida
relida
refeita
desfeita
malfeita
maldita
bendita

De mim saem notas e linhas
de lá saem chumbo e galinhas
frangos a correr
frangos a matar
frangos a viver.

Vivo eu, também
queria eu viver
de minhas notas e linhas
porém as galinhas
parecem não saber
reconhecer
o que é arte
o que é sorte
o que é aquilo
que nem digo o nome.

Vivo, hei de viver
-até morrer
sem saber
fazer
valer
-até morrer
as notas e
linhas
as luzes e
sombras
-até morrer

faço o que faço
não sei por quê
vivo aqui
mas aqui não estou
aqui não estive
aqui nunca estive
não para mim,
não em mim,
não além
do que pareço ser.

sons e linhas
luz e sombra
vida e morte
se confundem
em mim
em minhas linhas
em minhas notas
em este mundo
além de mim
além daqui
além.