Por todos os lados, a cidade cinza se estendia, diante de seus olhos. E ele ainda estava ali, sem conseguir ao menos ter forças para tomar a única decisão que tomava todos os dias. Andar ou não andar? Continuar a seguir o caminho interminável das folhas amarelas, ou apenas permanecer ali, ficar.
Ele olhava para uma folha amarela que era embalada pelo vento, indo de lá para cá, uma dança aérea, etérea como seus pensamentos, como sua existência naquele lugar. Nada mais fazia muito sentido. Em sua cabeça, ululavam as contradições. Não se lembrava de muitos detalhes sobre sua vida.
Não tinha nome. Já não sabia quem era. O que estava fazendo ali.
Como poderia fazer alguma coisa, se ele mesmo não era nada? Que esperança poderia ter, sabendo disso? Era o mesmo de estar preso, permanentemente trancafiado em uma diferente espécie de inferno, bem diferente daquele apregoado por todos os entusiastas da danação eterna por cozimento em fogo lento, por capetas armados de tridentes que torturavam todas aquelas pessoas que ali estariam pelo simples fato de serem humanas.
O inferno dele era bem diferente. Em tons de cinza. Ao invés de demônios, havia somente prédios arruinados. Já havia perdido a conta de quantos dias passara sem sequer pensar em se alimentar de qualquer coisa, e isto em nada importava. Não sentia fome nem sede. Era um imortal caminhando pelo deserto infindável de uma cidade fantasma.
De fato, um inferno bem diferente do normal. Com um único habitante.
Ultimamente, parecia que tal lugar estava passando por sutis mudanças, começadas desde que as árvores amarelas perderam todas as folhas. As noites eram mais opressivas, silenciosas. O vento não mais assobiava por entre os escombros. E, vez ou outra, alguma coisa parecia mudar de lugar de repente, como se fosse uma ilusão.
Ele não se importava com mais nada. Havia perdido quase toda a esperança e motivação. Alguns dias, ele nem sequer abria os olhos. Ficava esticado no chão onde tinha se deitado na noite anterior e ali ficava, esperando não sabia nem bem o quê.
Se é que havia algo a esperar ali.
Suspirava enquanto relembrava tudo que havia acontecido ali, tentando em vão buscar alguma conexão com suas escassas e ambíguas memórias. Se lembrava de tanta coisa, de treinamentos, de sonolentas tardes assistindo palestras...mas não se lembrava dos rostos de ninguém. Não se lembrava de nada que lhe fora dito. Era como se tudo aquilo fossem anônimos cartazes circulando por sua cabeça, imagens estáticas, escondendo algo por detrás.
Que idéia mais maluca.
Mas naquele dia, havia algo estranho no ar, e ele nem ao menos sabia dizer o que era. Podia sentir, mas não sabia definir o que era. Ainda assim, o desânimo reinante em sua mente, não lhe dava forças o suficiente para se levantar e tentar vislumbrar alguma diferença naquele inferno cinza. Olhava a folha que ia de lá para cá, e apenas respirava.
Mas, de repente, a coisa aconteceu. A folha parou no ar.
Não saberia precisar quanto tempo ficou olhando. E levou um certo tempo até que percebesse de fato que aquela folha pairava no ar. Franziu a testa e se pôs de pé, aproximando-se lentamente. De fato, ela havia parado no ar. Esticou o braço, procurando tocá-la.
Sua mão atravessou a folha.
Ele ficou ali olhando, sem saber o que pensar. Repetiu a operação na direção contrária, obtendo os mesmos resultados. A folha era um fantasma. Um holograma.
Sentiu o coração dispara pela primeira vez em muitos dias. Aguçou os sentidos, e olhou ao redor. O restante do cinza inferno permanecia intocado, aparentemente. Mas foi aí que se deu conta. Outras folhas amarelas estavam paradas no ar.
E assim como a primeira, elas eram meras imagens paradas no ar, como se fossem de fato imagens vindas de alguma espécie de projetor holográfico. Sem massa. Imagens tridimensionais pausadas no ar.
Sentiu sua cabeça girando. O que era aquela nova forma de sortilégio?
Sentiu que precisava de apoio, como se sua pressão houvesse repentinamente baixado até níveis perigosos. As pernas bambearam e ele buscou suporte em uma coluna cinzenta ao seu lado.
Tomou um susto quando sentiu que a coisa não estava ali, e se desesperou ao sentir-se em queda. A coluna não existia.
Felizmente, o chão ainda estava ali, e recebeu seu corpo com a dureza esperada. Fechou os olhos enquanto deixava que a dor amainasse um bocado, mas quando os abriu, tomou outro susto. A imagem da coluna atravessava seu corpo, como se lhe houvesse empalado. Levantou-se de supetão, e se afastou daquilo.
Que diabos estava acontecendo agora?
Olhou ao redor. Tudo parecia normal, mas ele sabia que não era o caso. Tudo que o vento havia levantado, folhas amarelas e pó, estava parado no espaço. Se aproximou lentamente de outra coluna, e tentou tocá-la, obtendo o mesmo resultado. Era uma imagem projetada. As tábuas no chão. As folhas espalhadas no chão. As paredes dos prédios.
Nada existia.
Sentiu um súbito pânico se apoderando dele. O que já parecia por vezes ser apenas um sonho, agora era um pesadelo. Seu coração estava disparado e ele ofegava sofregamente diante de todo aquele absurdo. Fechou os olhos com força e se estapeou para ver se conseguia se livrar da visão.
Quando abriu os olhos de novo, tudo estava do mesmo jeito que estava segundos atrás. Mas...
Havia algo parecido com uma folha de papel metros adiante, sendo levada pelo vento. Se é que havia de fato algum vento ali.
Correu naquela direção.
Ele olhava para uma folha amarela que era embalada pelo vento, indo de lá para cá, uma dança aérea, etérea como seus pensamentos, como sua existência naquele lugar. Nada mais fazia muito sentido. Em sua cabeça, ululavam as contradições. Não se lembrava de muitos detalhes sobre sua vida.
Não tinha nome. Já não sabia quem era. O que estava fazendo ali.
Como poderia fazer alguma coisa, se ele mesmo não era nada? Que esperança poderia ter, sabendo disso? Era o mesmo de estar preso, permanentemente trancafiado em uma diferente espécie de inferno, bem diferente daquele apregoado por todos os entusiastas da danação eterna por cozimento em fogo lento, por capetas armados de tridentes que torturavam todas aquelas pessoas que ali estariam pelo simples fato de serem humanas.
O inferno dele era bem diferente. Em tons de cinza. Ao invés de demônios, havia somente prédios arruinados. Já havia perdido a conta de quantos dias passara sem sequer pensar em se alimentar de qualquer coisa, e isto em nada importava. Não sentia fome nem sede. Era um imortal caminhando pelo deserto infindável de uma cidade fantasma.
De fato, um inferno bem diferente do normal. Com um único habitante.
Ultimamente, parecia que tal lugar estava passando por sutis mudanças, começadas desde que as árvores amarelas perderam todas as folhas. As noites eram mais opressivas, silenciosas. O vento não mais assobiava por entre os escombros. E, vez ou outra, alguma coisa parecia mudar de lugar de repente, como se fosse uma ilusão.
Ele não se importava com mais nada. Havia perdido quase toda a esperança e motivação. Alguns dias, ele nem sequer abria os olhos. Ficava esticado no chão onde tinha se deitado na noite anterior e ali ficava, esperando não sabia nem bem o quê.
Se é que havia algo a esperar ali.
Suspirava enquanto relembrava tudo que havia acontecido ali, tentando em vão buscar alguma conexão com suas escassas e ambíguas memórias. Se lembrava de tanta coisa, de treinamentos, de sonolentas tardes assistindo palestras...mas não se lembrava dos rostos de ninguém. Não se lembrava de nada que lhe fora dito. Era como se tudo aquilo fossem anônimos cartazes circulando por sua cabeça, imagens estáticas, escondendo algo por detrás.
Que idéia mais maluca.
Mas naquele dia, havia algo estranho no ar, e ele nem ao menos sabia dizer o que era. Podia sentir, mas não sabia definir o que era. Ainda assim, o desânimo reinante em sua mente, não lhe dava forças o suficiente para se levantar e tentar vislumbrar alguma diferença naquele inferno cinza. Olhava a folha que ia de lá para cá, e apenas respirava.
Mas, de repente, a coisa aconteceu. A folha parou no ar.
Não saberia precisar quanto tempo ficou olhando. E levou um certo tempo até que percebesse de fato que aquela folha pairava no ar. Franziu a testa e se pôs de pé, aproximando-se lentamente. De fato, ela havia parado no ar. Esticou o braço, procurando tocá-la.
Sua mão atravessou a folha.
Ele ficou ali olhando, sem saber o que pensar. Repetiu a operação na direção contrária, obtendo os mesmos resultados. A folha era um fantasma. Um holograma.
Sentiu o coração dispara pela primeira vez em muitos dias. Aguçou os sentidos, e olhou ao redor. O restante do cinza inferno permanecia intocado, aparentemente. Mas foi aí que se deu conta. Outras folhas amarelas estavam paradas no ar.
E assim como a primeira, elas eram meras imagens paradas no ar, como se fossem de fato imagens vindas de alguma espécie de projetor holográfico. Sem massa. Imagens tridimensionais pausadas no ar.
Sentiu sua cabeça girando. O que era aquela nova forma de sortilégio?
Sentiu que precisava de apoio, como se sua pressão houvesse repentinamente baixado até níveis perigosos. As pernas bambearam e ele buscou suporte em uma coluna cinzenta ao seu lado.
Tomou um susto quando sentiu que a coisa não estava ali, e se desesperou ao sentir-se em queda. A coluna não existia.
Felizmente, o chão ainda estava ali, e recebeu seu corpo com a dureza esperada. Fechou os olhos enquanto deixava que a dor amainasse um bocado, mas quando os abriu, tomou outro susto. A imagem da coluna atravessava seu corpo, como se lhe houvesse empalado. Levantou-se de supetão, e se afastou daquilo.
Que diabos estava acontecendo agora?
Olhou ao redor. Tudo parecia normal, mas ele sabia que não era o caso. Tudo que o vento havia levantado, folhas amarelas e pó, estava parado no espaço. Se aproximou lentamente de outra coluna, e tentou tocá-la, obtendo o mesmo resultado. Era uma imagem projetada. As tábuas no chão. As folhas espalhadas no chão. As paredes dos prédios.
Nada existia.
Sentiu um súbito pânico se apoderando dele. O que já parecia por vezes ser apenas um sonho, agora era um pesadelo. Seu coração estava disparado e ele ofegava sofregamente diante de todo aquele absurdo. Fechou os olhos com força e se estapeou para ver se conseguia se livrar da visão.
Quando abriu os olhos de novo, tudo estava do mesmo jeito que estava segundos atrás. Mas...
Havia algo parecido com uma folha de papel metros adiante, sendo levada pelo vento. Se é que havia de fato algum vento ali.
Correu naquela direção.